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segunda-feira, 5 de fevereiro de 2024

Algumas Curiosidades dos Sobrenomes do Vêneto


 

Os nomes de família no Vêneto são caracterizados principalmente por suas terminações (sufixos) ou pelos prefixos que os precedem.

Atualmente, entre os sobrenomes mais prevalentes na região, destacam-se aqueles que têm a terminação "an". Exemplos incluem Baldan, Bressan, Pavan, Trevisan. Há também sobrenomes que terminam em "in", como Bedin, Bottacin, Cagnin, Casarin, Martin, Perin, Trentin, Visentin, Zanin, e aqueles que se encerram em "on", como Bordignon, Lorenzon, Marangon, Schiavon, Tegon, Tonon, Zagon, Zanon, Zambon.

Outra terminação frequente nos sobrenomes do Vêneto é "ato", que é utilizada como diminutivo e para indicar descendência familiar. Exemplos incluem Bonato, Simionato, Volpato e Marcato.

Os patronímicos, sobrenomes derivados do nome do pai, também são comuns, como Perin (derivado de Piero/Pietro), Lorenzon, Berton, Martin, Baldan. Além disso, há sobrenomes como Frigo (derivado de Federico) e Vianello (derivado de Viviano). Sobrenomes começando com Zan ou Zam, como Zanata, Zampieri, Zanetti, Zamboni, são patronímicos derivados do nome Giovanni (João) no dialeto vêneto, escrito como Zan.

Um prefixo frequentemente encontrado é "Dal" (similar ao usado no Friuli, indicando "do"), presente em sobrenomes como Dal Farra, Dal Molin, Dal Lago, Dal Zotto e Dal Corso.

Embora um dos sobrenomes italianos mais comuns seja Ferrari (derivado de ferreiro), no Vêneto, encontramos variantes locais, como Favero e Favaretto. Outros sobrenomes frequentes incluem Boscolo (de boscaiolo = lenhador), Masiero (de mezzadro = inquilino), Sartor, Sartori, Zago (diácono, coroinha). Essa diversidade reflete a riqueza cultural e histórica da região.


Além disso, é notável que o prefixo "Dal" é bastante difundido, indicando "do", semelhante à prática no Friuli. Exemplos incluem Dal Farra, Dal Molin, Dal Lago, Dal Zotto e Dal Corso.

Enquanto o sobrenome italiano comum Ferrari (derivado de ferreiro) é encontrado em todo o país, no Vêneto, surgem variações locais, como Favero e Favaretto. Outros sobrenomes proeminentes incluem Boscolo (originado de boscaiolo = lenhador), Masiero (de mezzadro = inquilino), Sartor, Sartori, Zago (diácono, coroinha). Esses sobrenomes não apenas refletem as ocupações tradicionais das famílias, mas também adicionam camadas à narrativa cultural e histórica da região.

Dessa forma, a diversidade e a complexidade dos sobrenomes do Vêneto não apenas fornecem insights fascinantes sobre a genealogia da região, mas também enriquecem a compreensão da história e das tradições locais.

domingo, 4 de setembro de 2022

A Devastação Napoleônica do Veneto

 



A Sereníssima República Veneta, depois de onze séculos de independência e gloriosa soberania, foi dissolvida em 12 de Maio de 1797, após a invasão das tropas napoleônicas, quando foi arriada a bandeira com o leão alado de San Marco. 

A partir de então o Veneto inicia um dos períodos mais dramáticos da sua história. Napoleão saqueia Veneza e todas as possessões  venezianas localizadas em terra firme, que hoje se conhece como região do Veneto e outras mais no Mediterrâneo, devastando-as e exigindo delas altos tributos.

O sistemático saqueio de Veneza que ocorreu a seguir incluiu tesouros, obras de arte de valor inestimável, como os quatro cavalos de bronze que estavam na Basílica de São Marco, antigas relíquias e pinturas de dezenas de artistas venezianos famosos, que ainda hoje, não foram devolvidos pela França e estão no Museu do Louvre.  

Os franceses saquearam completamente Veneza. Eles ainda roubaram ou afundaram toda a marinha da República de Veneza e destruíram grande parte do famoso Arsenal, um final triste para aquela que já tinha sido uma das marinhas mais poderosas da Europa.

Os franceses e os austríacos fizeram um acordo de paz secreto em 17 de abril de 1797, o chamado Tratado de Leoben que, em troca de fornecer Veneza à Áustria, a França receberia as possessões austríacas na Holanda.

Em 18 de janeiro de 1798, os austríacos assumiram o controle de Veneza, o qual teve curta duração, pois Veneza estaria de volta ao controle francês em 1805. Em seguida, retornou às mãos austríacas em 1815 como o Reino Lombardo-Vêneto até sua incorporação ao Reino da Itália em 1866.

Os dois períodos de domínio napoleônico do Veneto se caracterizaram pela devastação, o sistemático roubo de obras de arte venetas, que eram levadas para Paris, pela fome e o desespero das populações. Segundo alguns estudiosos, nesses períodos os impostos tiveram aumentos significativos jamais vistos, chegando em muitos produtos até a 780%. 

Além de dividir o Veneto em sete departamentos, de criar pesados impostos que atingiam duramente a população, Napoleão impôs o serviço militar obrigatório por 4 anos, aos rapazes vênetos, com idade entre 20 e 25 anos, retirando com isso um grande número de braços necessários para o trabalho no campo.

Na malsucedida invasão da Rússia, concluída com a derrota de Napoleão, as margens do rio Beresina, em 24 de junho de 1812, dos cerca 27 mil jovens vênetos, então obrigados a se alistarem  no exército napoleônico, somente cerca de mil deles retornaram vivos.





segunda-feira, 23 de abril de 2018

Quando o País Itália Ainda Não Existia



Todo brasileiro descendente de italianos deveria saber que, quando os primeiros imigrantes “italianos” chegaram no Brasil, a Itália como país só existia a apenas 9 anos. Foi somente à partir de 1866 com a unificação que podemos falar de um país com o nome de Itália, que por sinal era um reino. Este Reino da Itália era governado pela Casa de Savoia, cujas origens estavam no Piemonte.
No século XVIII o que existia no território que pertence hoje a Itália, era diversos Estados independentes, separados entre si, cada um com o seu governo próprio. 
A “Itália” daquele tempo estava muito dividida em estados soberanos, entre outros podemos lembrar do Reino da Sardenha, o Reino de Napoli, Estado da Igreja, o Ducado de Milão e a Sereníssima República de Veneza. Estes vários estados, uns mais poderosos e ricos que outros, tinham origem, cultura e línguas muito diferentes entre si. 


No século seguinte tivemos um longo processo de unificação chamado de Risorgimento, comemorado na Itália no dia 17 de Março, que depois de algumas batalhas, lançou as bases para a formação do reino italiano. Este se completou em 1866, com a passagem do Vêneto para a Itália, após um polêmico plesbicito, ainda muito mal explicado, repleto de manobras nada isentas, totalmente manipulado pelo reino italiano. Para aqueles que sabem ler em italiano e quiserem se aprofundar no assunto recomendo o livro “1866 la grande trufa” do escritor E. Beggiato.



Foi nesse turbulento período, onde os problemas do desemprego e da fome começaram a atingir os camponeses do norte e do sul da península, que se deu início à emigração em massa para a América.
Os nossos antepassados ao aqui chegarem desconheciam a língua oficial italiana. Não se auto denominavam italianos e sim pelo nome das províncias em que nasceram. Quando finalmente a Itália foi criada, o governo foi atrás de uma língua para ser introduzida e usada pelo novo país. 
A língua toscana na época era a mais erudita de todas, com muitos escritores famosos mundialmente, já conhecidos vários séculos antes, foi aquele escolhido para ser a língua oficial de toda a Itália. Enfim, eram florentinos os escritores Petrarca, Dante Alighieri, Boccaccio, considerados os pais da literatura italiana. 


A anexação do Vêneto pela a Itália foi sem dúvida um dos acontecimentos mais marcantes e que veio agravar a situação já crítica da economia daquela região, precipitando a fuga em massa de milhões de pessoas. Esse verdadeiro êxodo serviu como uma válvula de escape de um caldeirão pronto para explodir em uma guerra civil. Foi nas costas dos pobres agricultores vênetos e daqueles do sul da península que sobrou o ônus da transformação da Itália em um país.
Os nossos primeiros imigrantes, aqui chegados à partir de 1875, falavam os diversos dialetos das suas província de origem e não conheciam e não sabiam falar essa nova língua, que estava sendo imposta para todo o país pelo governo do reino. 
A quase totalidade dos nossos antepassados quando aqui aportaram eram semianalfabetos, os seus diversos dialetos quase não eram mais escritos, especialmente, depois da caída da Sereníssima República em 1797, ou melhor, quase não mais se escreviam livros em vêneto. Era uma língua quase que somente falada. Eram pouco instruídos, porém, não eram incultos, na verdade eram herdeiros da fabulosa e milenária cultura da Sereníssima República de Veneza, uma riquíssima potência marítima, tanto militar como comercial, que teve uma vida de dez séculos.


A região do Vêneto tem uma forte ligação com o Brasil, na medida em que milhares deles se estabeleceram aqui, principalmente nos três estado do Sul. Também tem uma forte presença em São Paulo, Espírito Santo e Minas Gerais, quando para lá foram levados no último quarto do século XIX e início do XX, para trabalharem nas grandes fazendas de café, em substituição da mão de obra escrava que estava sendo libertada. 
No Vêneto se fala a língua vêneta, que não é um dialeto como se ouve muito dizer, com as suas várias nuances e particularidades próprias, conforme a província de origem. Existem portanto, muitas formas de se dizer referir à algumas coisas na língua vêneta. 


Quando os primeiros emigrantes vênetos, ainda no navio que os trazia para o Brasil, já sentiram as dificuldades que teriam para se comunicarem entre eles. Assim, no Rio Grande do Sul, mantidos isolados nas diversas colônias onde foram assentados, criaram uma nova língua, muito rica e melodiosa. Foi usando palavras dos diversos dialetos dos imigrantes, que aos poucos foi se sedimentando esta particular forma de falar, uma verdadeira nova língua, a qual foi denominada de Talian. Como mais de 50% dos imigrantes que chegaram ao Rio Grande do Sul era proveniente da Região do Vêneto, a língua vêneta naturalmente teve maior influência na formação do Talian.
A língua vêneta do Brasil evoluiu de uma maneira diferente da língua vêneta falada hoje na Itália, mas, são totalmente inteligíveis por ambos os grupos falantes. O Talian emprestou do português as muitas novas palavras e maneiras de dizer que surgiram nesses últimos 140 anos, desde a chegada dos primeiros emigrantes. Por seu lado a língua vêneta falada na Itália sofreu uma maior influência do italiano para o seu desenvolvimento. O Talian, com certeza, é a nossa verdadeira língua mãe.
Os estados do Rio Grande do Sul, de Santa Catarina e do Espírito Santo receberam uma grande quantidade de imigrantes de Vêneto ao longo dos anos. Assim, a presença do Talian nessas regiões é bastante presente até hoje. Estima-se que mais de um milhão de brasileiros sabem falar fluentemente o Talian e quase outro tanto ainda consegue entende-lo. 

 
  
 


No Rio Grande do Sul existem escolas, programações de rádio, escritores dedicados a esta língua. Já existem mais de cem livros escritos em Talian, inclusive dois ou três dicionários. O mais emblemático deles, também por ser o primeiro, é “Vita e Stòria de Nanetto Pippeta” cujo lançamento em 1924 alcançou uma grande repercussão nas colônias italianas do Rio Grande do Sul. Este livro tem tradução para o português,mas, se perde muito da versão original em Talian. Peças de teatro são também escritas nessa língua, com grande aceitação de público. Ela é considerada hoje, depois do português, a segunda língua do estado. 


Dr. Luiz Carlos B. Piazzetta
Erechim RS

sexta-feira, 6 de abril de 2018

A Roda e As Crianças Abandonadas no Vêneto





O século XIX é também conhecido como o século das crianças abandonadas. Com o número crescente de abandonos, onde em toda a Europa, somente nesse século, chegava a casa de milhões. Na Itália também foram criadas instituições adequadas para as abrigar, tais como os orfanatos, os chamados orfanatrofios. Eles já eram conhecidos de séculos anteriores, mas, tiveram um grande incremento durante este século.
Eram muitos os motivos que levavam os pais a abandonarem seus filhos, muito em particular as mães desesperadas, muitas vezes elas também abandonadas pelos companheiros depois de grávidas:

1.   Os pais não podiam reconhecer o filho porque era ilegítimo e poderia manchar a honra da família;
2.  Quando a pobreza não permitia aos pais de dar aos filhos uma existência digna;
3.  O filho não era do sexo desejado;
4.  A criança era doente ou portadora de defeitos físicos;
5.   A mãe tinha impossibilidade de amamentar;
6.  O pai tinha ficado viúvo, perdendo a mulher logo depois do parto.

As crianças eram abandonadas nesses orfanatos, quase sempre no começo da noite, ao escurecer ou nas primeiras horas da manhã, quando ainda não havia muita luz, para não serem vistas ou identificadas. 
Uma grande parte dessas crianças morria já nos primeiros meses de vida e quando conseguiam sobreviver, frequentemente, apresentavam vários tipos de problemas, sobretudo carenciais. 
O ingresso dessas crianças nos orfanatos, ou nas outras instituições criadas para as acolher, como em conventos, podia ser feito de algumas formas: 

1.   Através da chamada Roda dos Abandonados;
2.  Por meio de intermediários, como enfermeiras, parteiras, párocos;
3.  Entrega direta aos encarregados do orfanato.




Roda dos Abandonados era uma estrutura cilíndrica grande, encaixada firmemente no muro da instituição, geralmente construída em madeira. Ela podia ser facilmente girada entorno de um eixo vertical. Era dividida em duas partes e fechadas por uma pequena janela, em ambos os seus lados. Ao se fazer girar, uma parte ficava para dentro do orfanato e a outra metade para fora dele. Permitia assim colocar o recém nascido sem serem vistos por quem estava no interior da construção, mantendo o anonimato. 
Fazendo a roda girar, a parte onde o bebê era colocado passava para o interior da instituição, de onde abrindo uma pequena janela, os responsáveis podiam pegá-la para os primeiros cuidados e também procederem o devido registro. 
Era muito parecido com o sistema de segurança hoje usado em muitos prédios de condomínio, principalmente nas grandes cidades, para receber as encomendas feitas pelos moradores, como por exemplo a entrega de uma pizza, sem ter que abrir as portas do prédio para o entregador. Basta esse colocar a encomenda na roda, girá-la e pronto, a encomenda poderá ser alcançada pelo porteiro no interior do edifício.
Com frequência, ao lado da roda, havia um pequeno sino, que servia para alertar os responsáveis no interior da instituição da presença de um neonato na roda. Assim, geralmente só se passavam alguns minutos entre o efetivo abandono e o recolhimento do bebê. Isso é bem compreensível tendo em vista o frio que faz na região, especialmente nos longos meses de inverno. 
Com o bebê colocado na roda, quem o havia abandonado, costumava colocar junto algum objeto, como sinal para um possível reconhecimento futuro, tais como: medalhas e imagens impressas de  santos (que geralmente eram divididos em duas partes), documentos variados, bilhetes manuscritos  (nele informavam se o bebê já tinha sido batizado e com qual nome), uma pequena frase em um pedaço de papel ou algum outro sinal especial, que pudesse ser futuramente reconhecido e dar veracidade a solicitação. As roupas também vinham descritas detalhadamente e guardadas junto na mesma caixa, com um número de ordem. Esses sinais colocados junto com o bebê eram conhecidos no Vêneto como Filo Fede
A secretaria desses orfanatos mantinha meticulosas anotações e utilizava um sistema de registro muito eficiente para a época. 
Quando um bebê era admitido na instituição recebia um número de ordem (o chamado ato de ingresso), também no mesmo momento era imediatamente anotada a hora em que ocorrera o abandono, o sexo do bebê, mais tarde, era batizado com um nome de adoção, e pelo qual passaria a ser reconhecido à partir de então. Esse nome era seguido por um sobrenome também fictício, mas, geralmente de cantores, compositores ou outras personalidades ilustres. Também organizavam a descrição de algum particular especial nas roupas que o bebê estava usando e os possíveis bilhetes, sinais ou objetos deixados pela mãe ou por quem o tenha abandonado. 
Tudo era escrupulosamente anotado em um livro de registros e os objetos encontrados acompanhando o bebê etiquetados com o número ou o nome de adoção da criança e depois guardados em caixas destinadas para esse fim. 
Esses livros e as caixas com os objetos de identificação ficavam à disposição dos pais para possíveis futuros arrependimentos por parte deles, mesmo já tendo se passado diversos anos. Quando vinham procurar um bebê que tinha sido entregue no orfanato através da roda, a mãe ou os pais, traziam junto a outra metade da medalha ou do santo que acompanhou o a criança no ato do abandono.
Essas crianças podiam ser destinadas para outros casais, em forma de adoção, e muitas vezes, estes novos pais, devidos vários problemas, morte da esposa, perdas financeiras, tornavam a entregar o pobre bebê para os cuidados do estado. 


Dr. Luiz Carlos B. Piazzetta

Erechim RS

terça-feira, 3 de abril de 2018

Final do Século XIX - Período de Extrema Pobreza na Itália



Na Itália do final do século XIX a miséria e fome estavam presentes em milhares de famílias de norte a sul da península. Segundo a chamada Investigação Agrária Jacini sobre o mundo agrícola italiano e publicada à partir de 1880 já nos relatava:

Nos vales alpinos e naqueles dos apeninos, nas planícies da Itália meridional e também em algumas províncias melhor cultivadas do norte, existem casebres onde em um único aposento enfumaçado, sem circulação de ar e sem iluminação, vivem juntos homens, cabras, porcos e galinhas.
E  esses casebres se contam talvez em centenas de milhares por todo o país”.

Ainda na mesma investigação agrária Jacini podemos encontrar:

A estrebaria é a parte principal da casa do pequeno agricultor, é ao mesmo tempo o local para o gado, o salão e o santuário da família. É na estrebaria que passam os longos invernos; é lá que a dona de casa recebe os parentes e amigos; é lá que a família trabalha, se diverte, come e dorme. Enquanto as mulheres costuram, remendam e giram o fuso, os homens jogam cartas ou passam o tempo contando casos”.

Continuando nos relatos da mesma pesquisa:

O consumo excessivo e quase exclusivo de polenta, onde na média cada pessoa consumia 33 K ao ano, as vezes mais nas províncias do norte, a pelagra era uma doença muito prevalente. Era conhecida por doença dos 3 D: dermatite, diarreia e demência. O principal pelagrosário italiano estava em Mogliano Veneto, na província de Treviso”.




Ainda de acordo com a mesma investigação sobre o mundo agrícola entorno do ano de 1880 podemos ler:

Era muito dura a vida na planície padana e na região da “pedemontana” vêneta e lombarda que nos lugares onde existiam parreiras os pequenos agricultores acrescentavam o vinho a dieta muito pobre, sempre à base de polenta sem gosto, que para melhorar o sabor a passavam cada membro da família a sua vez, sobre um pedaço de arenque defumado. O vinho faz sangue diziam! Segundo a Revista Vêneta de Ciências  Médicas citada por Eduardo Pittalis, no seu livro Dalle Tre Venezie al Nordest, entre os séculos XIX e XX, em uma pesquisa entre doze mil estudantes primários da província somente três mil não bebem, cinco mil bebem bebidas com alta graduação alcoólica  e nove mil bebem regularmente vinho, sendo que a metade abusa”.


A pobreza nos últimos decênios do século XIX era tal, explica Marco Porcella no livro La fatica e la Merica, que uma fonte de ganho das famílias que trabalhavam na agricultura, era devido totalmente ao sacrifício das mulheres (amas de leite) em criar os órfãos no lugar do estado. Explica:

eram os órfãos, filhos quase sempre ilegítimos, que nas grandes cidades nunca faltavam, abandonados nas Rodas (dos orfanatos). Nas pequenas cidades onde não havia a Roda dos orfanatos, as crianças eram abandonadas nos degraus das igrejas, nas portas dos párocos ou ainda mesmo nas mãos das parteiras. Uma boa parte deles estavam desnutridos, enregelados, alguns prematuros, morriam nos primeiros dias. Em períodos de ausência de epidemias ou outras circunstâncias excepcionais se calculava uma mortalidade infantil na ordem de 33%. Nas cidades a maioria deles eram abandonados devido a crenças das amas de leite que eles poderiam transmitir doenças para os seus filhos verdadeiros. Se acreditava que o “filho da culpa” transmitisse à ama de leite e portanto ao irmão de leite, filho legítimo, doenças como a sífilis, que na verdade vinha diagnosticada como causa da morte. Transcorrido um ano a criança “de leite” se transformava em “criança de pão” e podia ser criado até os doze anos de idade, depois do que o hospital cessava qualquer responsabilidade.

Nos relatos do médico Luigi Alpago Novello, que trabalhava entre os pequenos agricultores na província de Treviso na segunda metade do século XIX, fruto da necessidade mais absoluta, podemos aquilatar a importância que, nas famílias carentes, se dava então aos membros doentes em relação aos animais que forneciam o sustento para todos. Diz o médico em seu relato:

Os membros de uma família são avaliados em razão do que podem produzir para o grupo, daquilo de útil que podem trazer para todos. A morte daqueles que são incapazes ou pouco adaptados para o trabalho, ou aqueles que portadores de doenças incapacitantes ficam limitados ao leito por muito tempo, são de menor importância e a dor da sua morte é muito menor, não direi de grande animal, uma vaca ou um boi, mas de uma simples ovelha ou cabra. Se adoece um bovino a família fica em desesperação e correm para o veterinário – se gratuito – ou a um curador e executam todas as ordens por ele dadas. Frequentemente percorrem muitos quilômetros para chamar o veterinário para que venha consultar o vitelo “que tem pouca vontade de comer”. Por outro lado deixam adoecer e morrer as crianças sem qualquer chamado do médico e muitas vezes sem ao menos executar as suas prescrições’.


Os avanços da medicina e as campanhas de higiene em toda Itália, e particularmente no Vêneto durante a dominação austríaca, fizeram com que em 1911 a idade média dos óbitos subisse, de apenas seis anos e meio para trinta anos. Entretanto a mortalidade infantil continuava altíssima. No mesmo ano de 1911 as crianças abaixo de cinco anos representavam 38% do total de mortos.


Dr. Luiz Carlos B. Piazzetta

Erechim RS

quarta-feira, 21 de março de 2018

A Grande Emigração Italiana. Porquê O Brasil?



Com um vasto território, grande como toda a Europa, muito rico em recursos minerais e naturais, tinha no final do século XIX uma escassa população, quase toda concentrada em duas grandes cidades, nas faixas litorâneas. Para os trabalhos pesados como o da extração de madeira, como o pau-brasil e depois as culturas de cana de açúcar, os portugueses trouxeram os escravos africanos, que durante muitos anos foram a força motriz da economia brasileira.
No ano 1830 as culturas de café foram introduzidas, principalmente no estado de São Paulo e a mão de obra escrava é que dava conta da demanda de mão de obra. Em pouco tempo o Brasil se tornou o seu maior fornecedor em todo o mundo.
Em 1888 chegou a abolição da escravidão no Brasil e com ela um grande caos nas plantações de café. Os escravos libertos não queriam trabalhar para os ex-senhores e a falta de mão de obra, ou muito escassa, no campo se tornou um drama para as autoridades brasileiras. A solução encontrada foi buscar essa mão de obra nos países da Europa onde ela estava sobrando.
A Itália nessa época sofria com um secular atraso industrial em relação com outros países europeus. Também uma série de acontecimentos e desastres naturais geraram um declínio econômico muito intenso nunca até então visto, que atingiu também nos campos, especialmente aquelas populações que viviam nas montanhas e sua agricultura sempre era de subsistência.
O desemprego e a fome estavam rondando os lares dos menos favorecidos. No Vêneto, poucos anos de acontecer a emigração em massa, aconteceu a anexação da Região do Vêneto ao Reino da Itália, governado pela Casa de Savoia fato que veio somar e aumentar esse caos social que já estava a ponto de explodir em uma revolução. No Vêneto devido a ação da Igreja essa explosão pode ainda ser contida e a solução encontrada foi emigrar.
A emigração, é um fato muito doloroso e dramático, mas foi a válvula de escape para essa pressão social que rapidamente ia se acumulando. Foi a resposta dada por aquele povo sofrido ao sistema vigente no Reino da Itália.
Nessa época o governo brasileiro tinha organizado um serviço de recrutamento que agia agressivamente, nem sempre com honestidade desejada, com angariadores percorrendo os diversos municípios italianos mais atingidos pela fome,  apregoando a exuberância e a fartura do Brasil, oferecendo a viagem de graça e outras vantagens para os pobres agricultores, entre elas a possibilidade de em pouco tempo se tornarem donos da terra. Essas três palavras “donos da terra” soaram com uma força irresistível de atração por toda a Itália, especialmente no sul e mais particularmente no Vêneto.
Infelizmente aqueles emigrantes que assinaram os documentos de recrutamento em branco, onde não estava especificado o local para onde seriam enviados, logo, ao chegarem no Brasil, perceberam o erro cometido. Foram quase todos levados para as plantações de café no estado de São Paulo para trabalharem como boias frias, em substituição aos escravos que tinha sido recentemente libertos. Em muitos outros locais de assentamento desses imigrantes as condições não eram das melhores e os casebres a eles destinados eram aqueles mesmos que os escravos tinham a pouco desocupado. Entretanto, os imigrantes que foram destinados para os três estados do sul do Brasil e do Espírito Santo, nas diversas fases da emigração italiana, tiveram um pouco mais de sorte, se bem que mesmo nesses locais tenham havido muitos problemas em diversas colônias que os obrigaram a mudar de local.
No Sul a emigração italiana foi prevalentemente de vênetos, que constituíam a sua grande maioria, mas também de lombardos, trentinos e friulanos.

Dr. Luiz Carlos B. Piazzetta

Erechim RS