A pelagra era a doença mais difusa e mais típica das populações rurais do Vêneto. Estavam livres dela somente as zonas de montanha (Asiago ...) e o litoral Adriático. Naturalmente havia ainda outras infecções muito difundidas: o tifo, a difteria, a varíola, as doenças do aparelho respiratório, todas causadas pela falta de higiene, pelas moradias insalubres e pelo hábito de reunir-se para o filó nos estábulos, junto aos animais. Cada uma dessa infecções impunha a cada ano um alto tributo de vítimas.
No entanto a doença mais difundida era a pelagra. Era uma doença odiosa e terrível. Em substância, uma anemia generalizada. Agredia o organismo na sua raiz, devastando-o lentamente. Os primeiros sinais apareciam nas partes descobertas do corpo que assumiam uma cor azulada; depois era atingido o aparelho digestivo com vômitos e diarreias, a língua inchava. Ao mesmo tempo manifestavam-se distúrbios nervosos, estados depressivos, e de confusão mental. No final, os doentes mais grave enlouqueciam. Enforcavam-se ou se jogavam, aterrorizados, no rio.
Os estudiosos discutiram longamente sobre as causas dessa grave doença social. O célebre Lombroso atribuía a sua responsabilidade à polenta, muitas vezes feita com farinha velha e em estado de fermentação. Outros denunciavam uma alimentação carente de vitaminas essenciais, baseada quase que exclusivamente na farinha de milho, sem sal. A mais atingida era a província de Padova: nos anos 80 registrava cerca de treze mil pelagrosos. No hospital de Bassano del Grappa, em 1882, havia 94 pessoas doentes de pelagra. Mas a realidade era mais grave do que aquela indicada pelos números, porque nem sempre aqueles que morriam eram registrados como pelagrosos. Em Vedelago, por exemplo, em 1891, de cada sete mil habitantes havia 1.700 pessoas com pelagra: 25% da população. Tudo isso tornava a vida das populações venetas muito precária. Carraro (um médico que tinha feito verificações oficiais na área de Bassano, Asiago, Marostica e Thiene) tinha calculado que a vida média da população era – em 1872 – de somente vinte e sete anos e meio. A mortalidade infantil era responsável pela drástica diminuição dessa média: uma de cada quatro crianças morria no primeiro ano e até os 15 anos a mortalidade continuava alta.
As crônicas da época apresentavam um quadro de tintas pesadas sobre a vida das populações rurais a partir dos anos 70. Aumentavam os furtos, em geral furtos campestres, provocados pela fome e pela raiva. Aumentam os mendigos: o Vêneto tem o maior percentual de mendigos. É nesse período que nascem as guardas campestres, armadas de bastões e fuzil para defender os campos. Aumenta o contrabando: homens e mulheres, isoladamente ou em grupos, arriscando a prisão, transportam de noite, ao longo da Valsugana, tabaco, sal, açúcar e álcool.
Aumentam os débitos, especialmente o hipotecário, que era muito difundido. Nenhum banco emprestava dinheiro para pessoas que não pudessem devolver. Aos pobres meeiros, arrendatários e “obrigados” que se encontravam em dificuldade nada restava senão recorrer à usura. Era o último ato do drama: depois dele o agricultor dos campos perdia os bens e se tornava um simples servidor, dependente de outros, sem poder, nem dignidade.
Havia gente que se agitava alegremente neste panorama de fome e desespero: os agiotas. Eram eles que recorriam aos bancos, dos quais obtinham empréstimos, que repassavam aos cultivadores a juros dez, vinte vezes superiores. Em Castelfranco foram registrados juros de 40%. Em Sacile, Pordenone e Polesine chegaram até a 100-120%.
Sobrava apenas o Monte di Pietà. Era chamado justamente o “banco do pobre do campo”. Pequenos proprietários, meeiros e arrendatários ali depositavam seus modestos objetos em penhor. As crônicas contam simplesmente que eram muitíssimos. E poucos eram aqueles que conseguiam recupera-los.
Dr. Luiz Carlos B. Piazzetta
Erechim RS