Para ir ao trabalho Gino, um forte rapaz com seus 18 anos recém-completados, percorria diariamente vários quilômetros pelas colinas e vales da província de Treviso, na Itália. O sol dourado da tarde refletia nos campos verdejantes de videiras e oliveiras, pintando um cenário que contrastava com a quietude do pequeno vilarejo onde nasceu. A paisagem idílica não conseguia dissolver a inquietude que o corroía. A situação econômica do país estava cada vez pior, com falta de serviço e insegurança no trabalho, o qual, quando conseguia, remunerava muito mal os trabalhadores, que pouco ou nada sobrava no fim do mês. A pobreza era generalizada no campo e a fome já rondava alguns lares. Muitos milhares de italianos já haviam emigrado para outros países, tanto da Europa como principalmente para a América. Gino, era o filho mais velho, de uma família de doze irmãos, todos menores de idade, sentia que precisava fazer alguma coisa, algo grande além das fronteiras de sua aldeia. A notícia que mudaria o rumo de sua vida chegou em forma de conversa com um amigo. Este lhe contou que, pelas cartas de um parente emigrado alguns anos antes, ele relatava entusiasmado sobre as terras férteis do Brasil, onde o café crescia em abundância, como ouro em grãos. O grande país sul-americano estava contratando aos milhares trabalhadores para as grandes fazendas de café de São Paulo e Espírito Santo e até pagavam a passagem até o local de trabalho. Essa mão de obra estrangeira era muito necessária para preencher a lacuna deixada pela abolição da escravidão no país, onde todos os escravos africanos foram libertos alguns anos antes. Os olhos de Gino brilharam com a possibilidade de uma vida melhor para ele e para a família. Aquilo soava como o destino chamando por ele. Com coragem, ele tomou uma decisão ousada, deixando para trás sua família e sua terra natal, e embarcando em uma jornada incerta em busca de prosperidade. A longa e tumultuosa travessia do oceano foi um grande desafio que testou sua coragem, mas Gino perseverou. Ao chegar ao interior de São Paulo, o jovem italiano encontrou-se em um mundo completamente diferente. As vastas plantações de café se estendiam até onde a vista alcançava, como um mar verde e perfumado. Ele havia sido contratado, quando ainda na Itália, por uma grande fazenda, onde seu trabalho como agricultor apesar de árduo, trazia a promessa de um futuro melhor e isso o mantinha firme. Foi durante esse período de alguns anos na fazenda que Gino ali conheceu Maria Augusta, uma jovem italiana, também proveniente da província de Treviso, emigrada com a família pouco tempo antes, que também buscavam oportunidades em terras estrangeiras. O destino entrelaçou seus caminhos de forma inesperada, e eles decidiram se casar. Juntos, enfrentaram os desafios da vida na enorme fazenda de café, construindo um amor que crescia a cada safra, como os frutos que colhiam. No entanto, a saudade da família na Itália, da qual tinha poucas notícias, nunca o abandonou, mas, o que mais influiu na decisão do casal foi a recessão no cultivo do café, cujos preços estavam em queda no mercado mundial. Depois de alguns anos de trabalho na fazenda, e ainda sem filhos, o casal tomou a difícil decisão de voltar para sua terra natal. Eles retornaram à pequena aldeia onde Gino nascera, no interior da província de Treviso, com a esperança de reconstruir suas vidas. Ali, plantaram novas raízes e estabeleceram-se entre amigos e familiares, mas o desejo de prosperidade continuou a arder em seus corações. A situação econômica da Itália, e da Europa em geral, ainda não estava boa e o trabalho continuava escasso e mal remunerado. Mesmo assim não tinham outra opção e continuaram tocando a vida. Em solo italiano, Maria Augusta e Gino foram abençoados com três filhos: dois meninos e uma linda menina. A vida apesar de muito dura era mais tranquila do que aquela agitação da fazenda de café, mas a situação econômica na Itália novamente começou a piorar rapidamente e as perspectivas de um futuro próspero desvaneceram como um sonho que se desfaz ao acordar. Foi então que eles tomaram outra decisão difícil, mas muito corajosa: emigrar novamente. Em 1909, Gino, Maria Augusta e seus três filhos voltaram ao Brasil, desta vez para ficar. Assinaram um contrato de trabalho em outra grande fazenda de café, onde enfrentaram desafios ainda maiores. A família cresceu, e mais dois filhos nasceram nas terras paulistas, solidificando ainda mais seus laços com o Brasil. Juntando as suas economias, mudaram-se para uma cidade próxima da fazenda que experimentava um período de grande progresso e lá adquiriram um grande lote de terra na periferia e passaram a trabalhar com empregados de pequenas fábricas que surgiam. Cada novo dia era uma batalha contra o desconhecido, mas a esperança e o amor que compartilhavam os mantinham firmes. O tempo passou, e a família de Gino e Maria Augusta prosperou, chegando a abrir com os filhos um pequeno comércio que aos poucos foi se transformando em uma grande rede de lojas com várias filiais, inclusive em cidades vizinhas, hoje um conglomerado de supermercados. Eles viram seus filhos crescerem e construírem suas próprias vidas no Brasil, mantendo viva a rica herança italiana que os ligava à sua terra natal. As histórias de coragem e perseverança de Gino e Maria Augusta continuaram a ser contadas de geração em geração, lembrando a todos que, com determinação e amor, é possível construir um novo lar e um futuro melhor, mesmo em terras distantes. O aroma do café e o sabor do sucesso se entrelaçaram em suas vidas, criando uma história que celebra o amor, a coragem, a emigração e a força da família, traçando um elo indelével entre a Itália e o Brasil.
Espaço destinado aos temas referentes principalmente ao Vêneto e a sua grande emigração. Iniciada no final do século XIX até a metade do século XX, este movimento durou quase cem anos e envolveu milhões de homens, mulheres e crianças que, naquele período difícil para toda a Itália, precisaram abandonar suas casas, seus familiares, seus amigos e a sua terra natal em busca de uma vida melhor em lugares desconhecidos do outro lado oceano. Contato com o autor luizcpiazzetta@gmail.com