terça-feira, 19 de dezembro de 2023

Pelas Ondas do Providence: A Odisséia de uma Vida


 


Nas áridas terras da localidade de Sferro, município de Paternò, na Sicília, no movimentado ano de 1893, Chiara Bottari viu pela primeira vez a luz do sol. Contudo, seu vilarejo estava impregnado pela sombra da emigração, um fenômeno que marcava profundamente a vida daquela pequena comunidade. As belas colinas foram o cenário de uma infância simples, no seio de uma família humilde de agricultores, proprietários de um pequeno terreno, com pouco menos de um hectare, mas o destino de Chiara estava predestinado a ser tecido em terras além-mar.
Aos 19 anos, solteira e sem uma profissão definida, Chiara sentiu a chamada de seus parentes na América. Foi um convite de uma tia que desencadeou uma reviravolta em sua vida. Ao lado de sua irmã mais velha, Emma, ela decidiu trilhar a estrada da incerteza, embarcando em uma jornada que começou com uma viagem de trem até Nápoles, o movimentado porto de mar do sul da Itália.
O dia 30 de maio de 1913 marcou o início da epopeia das duas irmãs Chiara e Emma. A bordo do navio a vapor Providence, rumavam para Nova York, apresentando-se na entrevista do controle de imigração em Long Island, como duas donas de casa que tinham como destino final a ensolarada Califórnia, do outro lado do país. Emma, irmã de Chiara, conseguiu os bilhetes da viagem enviados pelo marido que já trabalhava nos Estados Unidos, enquanto as passagens de Chiara foram pagas com o dinheiro que sua mãe lhe deu, o qual era o pouco que a família possuía.
O navio não era apenas um meio de transporte para a América; era um elo que unia diversas almas oriundas da mesma província, todas com destino a San Francisco. Lá, vários parentes próximos e amigos esperavam inseri-las no complexo tecido da metrópole californiana.
A vivência americana de Chiara desdobrou-se em um trecho pequeno da Califórnia, entre San Francisco e as áreas rurais circundantes, notórias por suas vastas plantações de frutas. Durante todos esses anos, Chiara desempenhou o papel de supervisora em uma fazenda de pomares, gerenciando a colheita e coordenando a equipe de trabalhadores sazonais. Seu empenho incansável, seja sob o sol escaldante ou durante as épocas de colheita intensa, foi fundamental para angariar cada tostão necessário na construção da vida que ela almejava. Ela desempenhou diferentes funções, juntando cada tostão com suor e sacrifício. No entanto, o emprego estável e o matrimônio pareciam esquivos. O destino, por vezes, reserva caminhos inesperados.
No ano de 1922, com quase 30 anos de idade, Chiara tomou uma decisão audaciosa. Convencida de que seu futuro não encontrava morada na América, despediu-se dos parentes e amigos e embarcou de volta para a Itália. 
Voltando à terra natal, Chiara Bottari uniu-se em matrimônio a um morador local e, com as economias cuidadosamente juntadas, ergueu um lar, entrelaçando assim sua existência com a comunidade que a testemunhou crescer. Dessa união floresceu a dádiva do primeiro filho, Domenico, o primogênito entre os quatro que vieram a compor a família.
A vida de Chiara Bottari atravessou décadas, culminando em seu derradeiro capítulo em 1968. Ela repousa agora no pequeno cemitério de sua cidade natal, junto aos seus pais. Um capítulo escrito com as cores da perseverança e as sombras da incerteza, revelando que, mesmo quando as estradas da vida nos levam além-mar, o coração muitas vezes nos guia de volta ao lugar que chamamos de lar.