segunda-feira, 28 de maio de 2018

O Gueto Judeu de Veneza




Por volta do século XIII, e nos três séculos seguintes, em toda a Europa, os judeus estavam sendo caçados e expulsos. Na Inglaterra este movimento teve início em 1290, na França em 1394, da Alemanha em 1470, da Espanha em 1492 e Portugal em 1497. Nesse mesmo período o governo da Sereníssima República de Veneza foi mais acolhedor, certamente cobrando algum imposto por isso e em 1516 criou o bairro judeu de Veneza, o denominado Ghetto degli Ebrei, onde podiam viver sem serem perseguidos. Nele os judeus tiveram autorização de residir em todo período de existência da república vêneta, sem nunca terem sido perseguidos pelo governo ou pela Igreja Católica. Entretanto por medida de segurança e medo dos cidadãos venezianos, a única porta de acesso ao local em que residia a comunidade hebraica, era fechado no início da noite e reaberto todas as manhãs, sempre custodiado por guardas da Sereníssima. 
O Guetto se localiza no sestiere di Cannaregio, uma das seis zonas em que a cidade de Veneza está dividida e ainda hoje o ponto de maior concentração de judeus e sede de sinagogas.
Antes da existência do Guetto já se  podia encontrar em Veneza, instalações muito semelhantes, como o Fondaco dei Tedeschi e o Fondaco dei Turchi, que serviam de depósitos de mercadorias, que eles traziam e onde os mercadores dessas etnias deviam passar reclusos todas as noites. 
Em consequência da guerra da Liga de Cambrai numerosos judeus deixaram o continente, as chamadas terras firmes e foram se fixar na cidade lagunar. Esse movimento criou suspeitas e preocupações nos residentes de Veneza que professavam a fé cristã. Foi nessa ocasião que o governo da Sereníssima estabeleceu a lei que obrigava o confinamento dos recém chegados de origem hebraica em um só lugar da cidade, na localidade denominada de Ghetto Nuovo
Essa solução veneziana foi então logo copiada por muitos países europeus, onde ainda era grande a presença de judeus. O local é uma ilha e para terem acesso precisavam atravessar duas pontes, sempre vigiadas e fechadas durante à noite. Os judeus só tinham a permissão para sair deste local durante o dia e usando um distintivo para os identificar. 
A comunidade hebraica foi se desenvolvendo e conheceu em poucos anos um rápido crescimento, também favorecido por novas ondas imigratórias, provenientes de toda a Europa. 
Esse aumento da população do gueto fez com que as autoridades autorizassem a construção vertical dos edifícios, que chegaram a ter a impressionante altura de oito andares. Mesmo com essa providência as autoridades foram pressionadas para aumentar o Ghetto Novo,acrescentado ao mesmo o Ghetto Vecchiono ano de 1541, espaço já usado desde muito tempo para abrigar as indústrias de fabricação de armas, que agora já estava desativado. Nesse novo local, apesar do nome, foram assentados os Judeus Levantinos, ou seja os que eram oriundos da península ibérica e do império otomano. O crescimento continuou e em 1663 foram abertas novas áreas entorno, e conhecidas como Ghetto Nuovissimo, composto por apenas duas ruas, chamadas de calles. Nesses espaços foram construídas inúmeras sinagogas e escolas judaicas, que hoje constituem um complexo arquitetônico de interesse cultural e turístico de Veneza.
Entre os judeus havia aqueles de origem ashkenazi, aos quais o governo veneziano, além das atividades ligadas à medicina, concedeu também a licença para exercerem a atividade de emprestadores de dinheiro, proibida aos cristãos por motivos religiosos, pois era considerado imoral lucrar juros sobre o dinheiro dado em empréstimo. 
Durante o período de duração da Sereníssima República de Veneza, nos diversos séculos, os relacionamentos com os  judeus sempre foram estáveis. Com a queda de Veneza para as tropas de Napoleão foram eliminadas as discriminações para com os judeus, ocasião em que também foi extinta a obrigação exclusiva de residência no gueto. 

Dr. Luiz Carlos B. Piazzetta
Erechim RS