domingo, 24 de janeiro de 2021

A Criação da Língua Italiana e o Surgimento do Talian

Dante Alighieri


Por ocasião da formação do Reino da Itália, o dialeto falado nas diversas partes do território que mais tarde veio se chamar Itália, era a língua usada por todos: o rei, os burgueses, os aristocráticos e principalmente pelo povo comum. No novo reino a língua que usava era somente os diversos dialetos regionais, com suas centenas de variantes. Quando foi proclamada a unidade italiana no ano de 1861, aqueles que conheciam a língua italiana, a língua usada por Dante em suas obras literárias, era a grande minoria da população do reino, aproximadamente 600.000 falantes, em um universo de 25 milhões de habitantes. Uma parte da população usava ainda o latim, os demais usavam uma língua a base do dialeto toscano, que era uma espécie de língua mercantil e de viajantes. Nos atos públicos usavam ainda o dialeto. A língua italiana era  mais usada pelos escritores e poetas. 

Após a unificação italiana também chegou a escola pública e com ela a língua italiana, a qual ainda custou muito tempo para ser usada pelo povo. Este povo a considerava uma língua estrangeira, pois, combatia os dialetos de antiga tradição, uma língua trazida e imposta a força pelos novos patrões. Esta língua usada nas academias, nos tribunais, no parlamento era incompreensível para o grande público, o que contribuiu para isolar os mais cultos do comum homem de rua. 

A Itália ainda não existia de fato, mas, já tinha uma língua oficial. Na verdade quem conseguiu unir os italianos não foram os governantes, a religião, a história ou a força e sim a literatura que já estava presente nas grandes obras de Dante, Boccacio, Machiavelli, Petrarca e mais alguns outros. 


Colônia Caxias no século XIX


Quando à partir de 1875 as primeiras levas de emigrantes italianos partiram para a América, e os Vênetos foram os primeiros a sair, a grande maioria deles compreendia o idioma italiano, mas, muito poucos foram aqueles que falavam. Os que vieram para o Rio Grande do Sul foram assentados nas colônias, localizadas no meio da mata, longe das cidades e sem estradas para  locomoção. Este longo isolamento forçado fez com que eles ficassem por muitos anos por fora do que acontecia no mundo. Sabiam muito pouco do que estava acontecendo no próprio Brasil. As únicas informações que recebiam da Itália era através das poucas cartas trazidas pelos imigrantes que ainda  vinham chegavam. 


Caxias em 1880


No Rio Grande do Sul chegaram mais de 80.000 imigrantes, sendo a maioria formada por vênetos e lombardos e o restante eram os chamados tiroleses, trentinos e friulani. Os provenientes da Emilia Romagna, Liguria, Piemonte e Toscana eram muitos poucos. A língua italiana era usada muito raramente e somente em poucas ocasiões, predominava o dialeto que cada família tinha aprendido e trazido com eles. Com os casamentos que foram acontecendo entre italianos das diversas regiões, um problema surgia para o entendimento na mesma família. Assim, com os vênetos que constituíam a grande maioria, foi surgindo uma nova linguagem dialetal misto, que tinha por base a antiga língua de Veneza, acrescida de palavras dos dialetos da outras regiões. Nascia assim uma linguagem nova que assimilava palavras de todos os grupos de emigrantes que viviam próximos, sempre com o predomínio dos dialetos vênetos falados pela maioria do imigrantes. A essa nova língua foi posteriormente dado o nome de talian, o vêneto sul rio grandense. Esta nova linguagem somente se consolidou por volta do ano de 1925, quando em um jornal da Colônia Caxias, o Stafetta Riograndense, passou a publicar semanalmente e suas páginas a história, escrita em talian, do personagem Nanetto Pipetta, nassùo in Italia e vignudo in Mèrica par catar la cucagna. A partir de então o talian se consolidou e se transformou em uma verdadeira língua, escrita e falada ainda hoje pela maior parte dos descendentes de italianos do sul do Brasil. Essa língua adquiriu status próprio e em vários municípios gaúchos, berços da imigração italiana no estado, foi declarada como a segunda língua oficial da cidade.