domingo, 22 de julho de 2018

As Casinhas de Santo na Beira da Estrada



As “casinhas de santo” a beira da estrada: os capitéis como espaços de representação em uma colônia italiana no Rio Grande do Sul 

Aline Nandi 
Mestranda no Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional – FACCAT 

O objetivo da pesquisa é discutir o processo de construção e significação que envolve os capitéis (pequenos oratórios) construídos entre 1945 e 1960, nas margens das estradas da Colônia Boa Esperança – localizada no Município de Rolante, RS. Buscaremos através deste estudo fazer um levantamento dos capitéis e compreender as relações que se estabelecem entre os moradores dessa comunidade – constituída inicialmente de imigrantes italianos e de seus descentes – e os capitéis. Para tanto, propusemo-nos em investigar o processo histórico que envolveu essas construções, sua função social na comunidade e os elementos de caráter religioso e identitário, presentes nesses oratórios dispostos à margem das estradas, que cortam a localidade. 
Como forma de atingir os objetivos deste estudo, buscou-se, a partir do mapa turístico do município, visitar, fotografar e descrever as características de quatro capitéis construídos pela primeira geração dos imigrantes italianos que colonizaram Boa Esperança, além de compreender, através de relatos orais dos moradores da localidade, as motivações que proporcionaram a construção destes monumentos. 
A pesquisa justifica-se pela importância dos grupos colonizadores, na preservação de elementos culturais, pelas diferentes gerações, como forma de evidenciar suas práticas e tradições, além da função social que estes espaços representam; apontamos a necessidade de difundir a história dos capitéis e de seus “construtores”, para a promoção do turismo, o cuidado com a manutenção destas construções, além da “sensação” de pertencimento de toda a comunidade rolantense a esse bem cultural. 
Esta pesquisa fundamenta-se em registros fotográficos, análise bibliográfica, observação e entrevistas. Foi necessário percorrer o Caminho das Pipas, roteiro turístico na comunidade de Boa Esperança e identificar pessoas da comunidade que pudessem, a partir da história oral, apresentar relatos sobre a construção dos capitéis, suas representações, formas de manutenção e as práticas estabelecidas nestes espaços. Os lugares que percorremos nos fazem lembrar fatos ocorridos no passado e, assim, contribuem para a construção da memória coletiva. (HALBWACHS, 2004)
Com o intuito de promover alternativas de agregação de renda à produção agrícola da localidade de Boa Esperança, e minimizar o êxodo rural, no ano de 1995 os agricultores da comunidade, em parceria com a Prefeitura Municipal de Rolante, o Sindicato dos Trabalhadores Rurais e a Emater, iniciaram a formulação do Caminho das 
140 anos da imigração italiana no Rio Grande do Sul – Roberto Radünz e Vania Herédia (Org.) 11 
Pipas, como um roteiro turístico. Localizado no 4o Distrito de Rolante, o trajeto é composto por nove cantinas de produção de vinho e suco colonial artesanal, além de uma casa de massas, um restaurante e uma pousada. O roteiro agrega ainda Cascata Três Quedas, espaços de comercialização de produtos coloniais em cada uma das cantinas e demais empreendimentos no Caminho das Pipas. 
No município de Rolante, foram construídos quatro capitéis na localidade de Boa Esperança. A construção dos capitéis teve início em 1945, com a primeira geração dos descendentes de imigrantes italianos indo aproximadamente até 1960. Esta primeira geração caracteriza-se por serem filhos dos primeiros imigrantes que fixaram residência, primeiramente nas velhas colônias de imigração. 
No período de construção dos capitéis, a comunidade já contava com uma igreja em honra a Nossa Senhora do Caravaggio, construída em madeira logo no início da colonização. A igreja em alvenaria veio a ser construída após a melhor estruturação financeira e organização social das famílias da localidade. A igreja foi transformada em paróquia, que completou 70 anos no mês de maio de 2014. 
Para celebrar as festividades de aniversário da paróquia, foi organizada uma intensa programação religiosa e festiva, com reza de terços, celebrações do tríduo e uma grande missa que contou com a presença e celebração do Bispo da Diocese de Novo Hamburgo, Dom Zeno Hastenteufel. 
Em um ambiente de preparação para a festa local, no salão da comunidade com mais de 40 mulheres, numa tarde de domingo, dividindo funções na produção dos agnoline – um dos principais pratos da culinária local – a sopa – e alguns homens que faziam uso do salão comunitário para o encontro tradicional do domingo com amigos e parentes da cidade, além dos jogos de carta e da companhia a suas esposas, realizamos, a partir de um questionário semiestruturado, a busca de informações sobre a origem da construção dos capitéis, fatores que motivaram estas construções, usos destes espaços e suas representações. 
A fabricação coletiva do agnolineé uma tradição na comunidade e tal responsabilidade é das mulheres. A tradição dos encontros e a forma de fabricação artesanal é passada de geração em geração; netas, mães e avós compartilham saberes, relembram fatos do passado e mantêm viva a tradição da construção coletiva da festividade. Este fazer conjunto é realizado anualmente no mês de junho, em preparação à festa da padroeira. filhas e netas que não moram na localidade costumam estar no final de semana que antecede a festa, na casa de seus familiares em Boa Esperança, a fim de participar deste momento. 
Antes de continuarmos com a caracterização dos capitéis de Boa Esperança, precisamos conhecer melhor o cenário em que esse Patrimônio Cultural da comunidade 
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se insere. A dinâmica que envolve a colonização das terras e o processo de organização política e social dessa comunidade nos permite melhor compreender como os oratórios, construídos na margem das estradas da colônia, representam aspectos da identidade étnica de seus moradores, ao mesmo tempo em que procuram manter viva uma memória dos antepassados.



A vinda dos imigrantes e a formação histórica de Rolante 
Na segunda metade do século XIX, deu-se início o processo de ocupação de Rolante pelos imigrantes europeus. Parte da economia regional concentrava-se na leva de gados do Rio Grande do Sul até São Paulo, e foi dessa forma que moradores da região passaram a utilizar o caminho que tinha início em Viamão, passando por Rolante e seguindo até o território paulista. Os conhecidos tropeiros tinham Rolante em seu roteiro. 
Mas foi, em 1882, que chegaram à Rolante os primeiro colonizadores; vindos das colônias velhas, fixaram moradia em Alto Rolante hoje distrito de Rolante. As terras foram cedidas por uma empresa colonizadora a imigrantes alemães. Os ítalo-brasileiros chegaram na primeira década do séc. XX, procedentes de Caxias do Sul, Salvador do Sul, Farroupilha, Gramado, entre outras levas das primeiras colônias. 
Em 19 de abril de 1909, por designação do governo da Província, Rolante passou a ser distrito. Logo passaram a chegar à localidade famílias húngaras, seguidas de suecas, polonesas, italianas e alemãs. Em algumas localidades estas novas famílias passam a dividir a rotina com os chamados “caboclos”, que já estavam estabelecidos em algumas localidades. Era a lembrança da ocupação indígena, lusa e africana na região. Rolante, pertencente originalmente a Santo Antônio da Patrulha, teve sua emancipação político-administrativa concedida em 28 de fevereiro de 1955. A cidade é conhecida como a “Capital Nacional da Cuca”, e também como a terra natal do cantor tradicionalista gaúcho Teixeirinha. 
Atualmente Rolante faz parte do vale do Paranhana, na Encosta Inferior da Serra gaúcha, e desde 2010 integra a Região Metropolitana de Porto Alegre, estando ainda inserido na Reserva da Biosfera de Mata Atlântica. De acordo com o IBGE (2014), sua população total é de 19.493 habitantes. Tendo como principais atividades econômicas a indústria, os serviços e a agricultura, Rolante apresenta grande concentração de propriedades com atividades produtivas ligadas à agricultura familiar. 
Boa Esperança, sendo o 4o Distrito de Rolante, tem aproximadamente 80 famílias que residem ou possuem casas de “final de semana”, agregando assim uma economia promissora. Além das atividades agrícolas desenvolvidas na comunidade, como forma 
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de geração de renda para as famílias através da comercialização de milho, farinha, uva, vinho e demais insumos, a comunidade conta com diversas agroindústrias ligadas, principalmente, à produção de vinho e sucos. 

Monografia completa:


Dr. Luiz Carlos B. Piazzetta
Erechim RS