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terça-feira, 12 de setembro de 2023

Destino na Mata: A Jornada de Nonna Corona




Nona Corona chegou à Colônia Dona Isabel com uma bagagem repleta de esperança e coragem. Aos 62 anos, viúva a muitos anos, e com todos os seus filhos já emigrados para terras distantes, ela decidiu também deixar a Itália para não ficar sozinha. A travessia do oceano em um antigo navio de transporte de carvão foi árdua e cansativa. As condições a bordo eram precárias, com falta de higiene e comida escassa. No entanto, Nona Corona enfrentou todas as adversidades com determinação, pois tinha certeza que sua presença era necessária para a sua filha caçula.
Assim que chegou à Colônia Dona Isabel, logo no primeiro ano de sua inauguração, nona Corona mergulhou de cabeça nos trabalhos da roça, ajudando sua filha mais nova e cuidando dos seis netos, todos ainda menores de idade. Seu vigor surpreendia a todos, e sua presença era reconfortante para a família em um lugar tão distante de sua terra natal.
Os anos passaram, e Nona Corona estava feliz em sua nova vida. Ela contava histórias sobre a Itália e transmitia valores familiares aos netos. A comunidade se fortalecia, mas a falta de recursos médicos e assistência religiosa era um desafio constante. Não havia médicos na Colônia, e os padres ainda não tinham chegado à região.
Um dia, de forma repentina e misteriosa, Nona Corona não conseguiu mais andar. Seu corpo estava paralisado de um lado, e ela não conseguia falar. O desespero tomou conta da família, que não sabia como ajudá-la. A dor da impotência era avassaladora. Os netos a cercavam, com olhos cheios de lágrimas, sem entender o que estava acontecendo com sua amada nona.
Os dias passaram, e a saúde de Nona Corona foi piorando gradualmente. A família fazia o possível para aliviar seu sofrimento, mas não havia recursos médicos disponíveis. As noites eram longas e angustiantes, com a senhora em estado de coma, lutando pela vida a cada respiração.
Outros vizinhos da Colônia Dona Isabel se uniram em torno da família, oferecendo apoio e conforto. As pessoas rezavam por Nona Corona, implorando por um milagre, pois a falta de assistência religiosa tornava tudo ainda mais difícil. A esperança era a única coisa que restava.
Finalmente, após semanas de agonia, Nona Corona partiu. Sua morte deixou um vazio na comunidade. A família se reuniu para realizar um enterro simples, cavando uma cova na mata exuberante que cercava a casa. Não havia caixão nem cerimônia religiosa adequada. O desânimo e a tristeza eram profundos, e a falta de amparo religioso tornava a perda ainda mais dolorosa.
O falecimento de Nona Corona foi um lembrete brutal das dificuldades enfrentadas pelos pioneiros italianos na Colônia Dona Isabel. A falta de assistência médica e religiosa era um desafio constante, mas sua determinação e coragem continuaram a inspirar as gerações seguintes. Com o tempo, a comunidade cresceu e se fortaleceu, trazendo médicos, padres e melhorias para a região.
Nona Corona se tornou uma lenda na Colônia Dona Isabel, lembrada não apenas por sua morte trágica, mas também por sua força e amor pela família. Sua história serviu como um lembrete de como a vida era dura naqueles dias pioneiros, mas também como um testemunho da resiliência humana diante das adversidades. Ela foi, e sempre será, um símbolo de esperança e perseverança na história da colônia italiana.

domingo, 10 de setembro de 2023

Raízes na Terra: A Jornada dos Belliner em Colônia Dona Isabel







No final do século XIX, quase no alvorecer de 1900, quando o vapor que trouxe os Belliner se aproximou do porto de Rio Grande, o coração de Antonio Belliner estava repleto de esperança e expectativa. Ao seu lado, sua esposa Maria e seus quatro filhos – Giuseppe, Carlo, Isabella e Rosa – pensavam no litoral distante do Porto de Gênova desaparecendo no horizonte, deixando para trás uma vida de dificuldades em uma Itália empobrecida, em busca de um futuro melhor nas terras férteis do sul do Brasil. Tinham deixado pequena vila onde nasceram, no interior da província de Treviso, abandonando uma vida de contínuo trabalho de gerações da família, sempre na terra de outros. Tinham em mente satisfazer o tão desejado sonho de um dia serem proprietários da terra em que trabalhavam. 

Após muitos dias de viagem pelo grande mar e pelos rios do grande estado brasileiro, onde dias viraram semanas que pareciam infindáveis, agora já no pequeno porto fluvial, com os poucos pertences e as crianças em um grande carroção puxado por mulas, a família Belliner chegou à Colônia Dona Isabel, um lugar onde as colinas verdejantes e os vales exuberantes os acolheram. Aqui, eles enfrentaram inúmeras adversidades enquanto construíam suas vidas. A avó, nonna Augusta, tornou-se o pilar da família com suas histórias e sua sabedoria ancestral, mantendo a tradição italiana viva. 

Os dois meninos, Giuseppe e Carlo, logo se tornaram inseparáveis dos campos e vinhedos. Eles aprenderam com o pai a arte da vinicultura e passaram longas horas sob o sol escaldante, cuidando das videiras que se estendiam até onde os olhos podiam ver. As meninas, Isabella e Rosa, ajudavam a mãe Maria na cozinha, preparando pratos italianos tradicionais com ingredientes locais.

A vida na colônia não foi fácil. Os Belliner enfrentaram invernos rigorosos, safras difíceis e a distância da família na Itália. No entanto, através da perseverança e do apoio mútuo, eles prosperaram. Giuseppe e Carlo eventualmente casaram com duas irmãs da vizinhança, construindo suas próprias famílias e vinícolas.

Com o tempo, a Colônia Dona Isabel prosperou, graças ao trabalho árduo e à devoção dos imigrantes italianos. A família Belliner e seus descendentes se tornaram uma parte fundamental dessa história, com suas tradições e vinícolas florescendo nas terras férteis do sul do Brasil.

Hoje, quando alguém visita à antiga Colônia Dona Isabel, ainda pode saborear o vinho premiado da Vinícola Belliner e ouvir as histórias de nonna Isabella, que atravessaram o tempo, mantendo viva a memória da jornada corajosa e do legado dos imigrantes italianos no sul do Brasil.


sexta-feira, 1 de setembro de 2023

Vozes Ausentes: A Dor da Mãe Imigrante na Colônia Dona Isabel


 

Vozes Ausentes: 
A Dor da Mãe Imigrante na Colônia Dona Isabel


Na vastidão da colônia Dona Isabel, 
No meio do nada, isolados do mundo, 
Uma mãe carrega a dor, a angústia cruel, 
A espera dolorosa, o coração moribundo.

Três filhos ao seu lado, seu maior tesouro, 
Mas a ausência das outras, um vazio a corroer, 
O silêncio que consome, um peso agridoce, 
Quase um ano sem notícias, sem saber o que acontecer.

No seio da floresta, a mãe clama em prece, 
Anseia pelas palavras, pelas cartas esperadas, 
O eco do silêncio, uma dor que não desvanece, 
Enquanto o tempo avança, trazendo noites estreladas.

Os dias se arrastam, lentos como o vento, 
As lágrimas marcam seu rosto envelhecido, 
A esperança vacila, é um tormento, 
Nas sombras da incerteza, seu peito ferido.

A saudade aperta, o coração em pedaços, 
Perguntas sem respostas ecoam em seu ser, 
Será que estão bem? Afastadas em espaços, 
Em terras distantes, sem nenhuma saber.

No Brasil, a mãe aguarda com fervor, 
Notícias que tragam alívio e acalanto, 
Das duas filhas casadas, longe do calor, 
Nos Estados Unidos e na França, em outro canto.

A cada amanhecer, uma esperança renasce, 
A certeza de que o amor atravessa oceanos, 
Na força de uma mãe que não se esquece, 
De suas filhas queridas, mesmo em tempos insanos.

No meio da floresta, no isolamento profundo, 
A mãe sustenta a fé, a chama da espera, 
Que um dia as notícias cheguem ao seu mundo, 
E tragam alegria, um renascer primavera.

Em cada verso desse poema entrelaçado, 
Celebro a coragem dessa mãe imigrante, 
A dor, a angústia e os sentimentos abraçados, 
Na esperança de que a distância não seja constante.


de Gigi Scarsea
erechim rs




quinta-feira, 31 de agosto de 2023

Lágrimas da Floresta: A Dor de uma Mãe Imigrante Italiana

 



Lágrimas da Floresta: 
A Dor de uma Mãe Imigrante Italiana



Em meio às florestas do Rio Grande do Sul, 
Uma jovem mãe imigrante, com coração aflito, 
Sofre a dor profunda de uma perda insuportável, 
Seu pequeno filho, um mês de vida, tão querido.

Nasceu em meio ao isolamento, sem assistência, 
Na colônia Dona Isabel, onde foram levados, 
A falta de recursos e cuidados adequados, 
Fez com que o destino lhe fosse arrancado.

O choro do bebê se misturou ao vento da mata, 
Enquanto a mãe, desamparada, buscava consolo, 
No meio das árvores, suas lágrimas caíam, 
Um lamento silencioso, marcado de desconsolo.

A imensa saudade da terra distante, 
O sentimento de estar longe, sem amparo, 
Tudo se intensifica com essa perda avassaladora, 
Um filho levado, deixando um vazio amargo.

Que tristeza profunda invade seu peito, 
Como uma dor que não encontra alívio, 
Essa mãe imigrante, em meio às florestas, 
Chora a perda do seu tesouro, seu motivo.

Que o tempo traga algum conforto a essa alma, 
Que a esperança possa ressurgir em seu olhar, 
Mesmo entre as árvores, no silêncio da mata, 
Essa mãe encontra forças para continuar a caminhar.


de Gigi Scarsea
Erechim RS


quarta-feira, 28 de junho de 2023

Da Província de Treviso ao Pampa Gaúcho: A Jornada Épica de Genaro em Busca de um Futuro Melhor - parte 4








Domenico, a mãe e os irmãos trabalharam duro para limpar parte do terreno e preparar um novo pedaço de terra para as semeaduras de inverno, principalmente, de trigo. Ainda tinham parte dos mantimentos recebidos do governo e muita coisa que por vezes faltava, os vizinhos, que já moravam a mais tempo no local, davam ou vendiam para eles. A primeira safra de milho foi ótima, além das suas expectativas. A semeadura do milho apesar de ter sido feita com um pouco de atraso, foi compensada com o atraso do inverno. Mostrou que a terra era muito fértil e a safra de fim de primavera seria abundante. Aprenderam que quando o milho já estivesse com grãos, precisavam ficar mais atentos, pelo grande número de pássaros e animais selvagens, que em bandos dizimavam as plantações. O tempo corria rápido e os irmãos já haviam começado a fazer as tábuas para a construção da casa. Estavam contentes com o lugar, com a terra que compraram. Agradeciam sempre ao pai Daniele pela indicação do lugar e incentivo para emigrarem. O correio chegava mensalmente na sede da colônia, não muito distante onde moravam. Maria tinha esperanças de receber notícias das duas outras filhas. Não sabia onde miravam e nem como estavam. Antes de deixar Segusino, durante a visita ao pároco Michele, havia deixado com ele o seu novo endereço no Brasil para caso as filhas quisessem ou pudessem entrar em contato com ela. Também tinha iniciado contato por cartas com o velho padre, amigo de muitos anos da família. Estava aguardando a sua resposta. Naquele tempo, conforme o local, uma carta demorava vários meses para ser entregue ao destinatário, especialmente naquelas colônias do Rio Grande do Sul, tão distantes de tudo. A casa de madeira estava quase pronta, os rapazes tinham se saído muito bem, revelando-se bons carpinteiros. Era grande com três grandes quartos e uma sala. A cozinha, com seu fogão de chão, ficava em outra pequena dependência, separada da parte principal da casa, pelo perigo de incêndio. A safra do trigo foi ótima e a do milho excelente, ocasião em que puderam encher os depósitos no grande paiol recém-construído. Parte das safras eram vendidas e seguiam de barcos para a capital do estado e a outra parte era reservada para consumo da família. Já estavam criando galinhas e alguns porcos soltos em um cercado. Um dos filhos andava semanalmente até o correio, na sede da colônia, para ver se tinha chegado alguma carta para eles. Durante muitos meses voltavam tristes, pois, não encontraram nada. Um dia o filho mais novo, voltou gritando e correndo. De longe balançava o braço mostrando dois envelopes brancos. Saíram todos correndo ao encontro do rapaz. De todos eles somente Domenico sabia ler um pouco, pois, tinha somente estudado até a terceira série. Uma das cartas era da filha mais velha que morava nos Estados Unidos e a outra era de Don Michele. Com dificuldade a família foi se inteirando nas notícias tão aguardadas. Ficou sabendo que a filha estava bem e já tinha três filhos, dois meninos e uma menina. O marido estava bem empregado na construção civil e que tinha muito trabalho. Todos estavam bem de saúde e muito contentes na nova pátria. Ela, infelizmente, ainda não tinha recebido notícias da irmã mais nova que havia emigrado para Chipilo, no México. Encontrou o endereço da família através do padre Michele. Pela carta do antigo pároco, ficaram sabendo dos acontecimentos em Segusino e, principalmente, notícias da segunda filha. Ela, como havia previsto Maria, a filha também tinha escrito para o pároco para saber notícias do resto da família. Algum tempo depois de se estabelecerem em Chipilo, entrou em contato com Don Michele e conseguiu o endereço atual da mãe e dos irmãos no Brasil. Já era mãe de dois meninos e estava grávida do terceiro. Estavam bem de saúde e ela e o marido trabalhavam em uma terra própria, comprada a prestações do governo mexicano, onde plantavam principalmente milho e criavam vacas, cujo leite era transformado em queijos, vendidos em Chipilo e nas cidades próximas. Estavam muito felizes no novo país e até já estavam começando a ganhar dinheiro. Maria e os filhos ficaram radiantes de alegria com as boas notícias recebidas das duas.

Este conto continua
Texto de 
Dr. Luiz Carlos B. Piazzetta
Erechim RS




segunda-feira, 26 de junho de 2023

Da Província de Treviso ao Pampa Gaúcho: A Jornada Épica de Genaro em Busca de um Futuro Melhor - parte 3

 




A Caminhada

Apesar de usarem o mesmo rio para chegar aos seus destinos, o caminho a ser tomado era um pouco diferente para aqueles que se dirigiam para a Colônia Caxias, daqueles outros que seguiam para as colônias Dona Isabel e Conde D'Eu. Domenico e sua família, subindo pelo rio Caí, passaram pelo porto da cidade de São Sebastião do Caí onde alguns imigrantes desembarcaram com destino a Colônia Caxias. Continuaram a viagem rio acima até o porto da cidade de Montenegro onde aqueles que seguiam para a Colônia Dona Isabel desembarcaram, com vários outros imigrantes, como vimos no capítulo anterior. Aproveitaram para descansar, comprar algum alimento, em uma espécie de armazém, para as crianças e organizar a pouca bagagem que levavam. A distância a ser percorrida era de aproximadamente oitenta quilômetros, mas no caminho teriam que atravessar um trecho bem difícil de serra. Não era uma verdadeira estrada e sim um precário caminho com muitas pedras, bastante tortuoso, pelo meio de grandes árvores. Nos dias de chuva era um lodaçal difícil de ser atravessado. Ficaram espantados com a altura que muitas delas alcançavam, porém, uma em especial, pela sua beleza e grandiosidade, chamou mais a atenção de todos. Eram colossais pinheiros, que naqueles tempos existiam em grande quantidade. Do meio da mata vinham gritos de aves e de outros animais desconhecidos para eles, como dos bandos de macacos bugios, que, assustados com o ruído da caravana, faziam uma grande algazarra. Os adultos e crianças maiores caminhavam ao lado dos carroções puxados por várias mulas, no qual as mulheres grávidas, os mais idosos e as crianças pequenas iam embarcadas. A marcha era lenta, especialmente no trecho montanhoso, onde precisavam parar ocasionalmente para descansar e dar água para os animais. Quatro funcionários do governo brasileiro, dois deles filhos de ex-escravos, acompanhavam o grupo desde Montenegro, eram os guias e cocheiros da expedição. Um dos funcionários, o mais velho do grupo, falava perfeitamente o dialeto vêneto o que facilitou para todos. Depois de várias horas de dura caminhada, ao sol, em pleno verão brasileiro, finalmente chegaram a Colônia Dona Isabel, que então já tinha cerca de quatorze anos desde a sua fundação onde se podia ver grande progresso com algumas ruas de barro e inúmeras casas de madeira, algumas de tijolos. Já era um núcleo urbano. Foram alojados em outro grande barracão, fora da sede, ficando à espera da localização do seu lote de terra que tinha sido escolhido pelo governo. Genaro e a família, mais uma vez, tiveram muita sorte. Em apenas dois dias com todos os papéis assinados, já estavam sobre o que agora seria a sua propriedade. É bem verdade que este grande lote de terra não era fornecido de graça pelo governo, ele deveria ser pago em prestações anuais durante dez anos e o título de propriedade recebiam quando já tivessem quitado 20% da dívida. O governo concedia dois anos de carência para iniciarem o pagamento. Os valores não assustavam muito, as condições eram boas e se tudo corresse bem com as futuras safras, poderia ser pago com facilidade. Ao chegarem no local do lote souberam que cerca de dois anos antes ele já tinha sido concedido para um jovem casal de colonos provenientes de Padova, que, infelizmente, com a morte prematura do marido, devido a um acidente enquanto derrubava uma grande árvore, para fazer tábuas para construção de uma pequena casa para abrigar a família. O pobre homem teve a cabeça e parte do tórax esmagados por um grande galho que se desprendeu do alto, matando-o instantaneamente. A infeliz mulher, desesperada e sozinha, sem amigos ou parentes no Brasil, resolveu desistir e abandonar tudo, retornando rapidamente para Itália, com os dois bebês gêmeos do casal, nascidos justamente naquele lugar, com a ajuda de uma vizinha. Ela tinha restituído a propriedade ao governo, poucas semanas antes de Genaro e a família chegarem. Eles não conheceram a infeliz viúva que partiu poucas semanas antes deles chegarem, logo após o pobre funeral do marido, realizado por alguns vizinhos, sem o conforto religioso de um sacerdote. No lote ainda não havia uma casa, apenas uma pequena choupana construída com galhos de árvores e coberta por grimpas de pinheiro a guisa de telhado, onde a família do falecido se abrigava. Ali tinham nascidos os pobres órfãos, dois brasileirinhos, como tantos outros, que emigraram para a Itália. Todos esses funestos acontecimentos deixaram Domenico e os irmãos muito abalados, supersticiosos como eram, em geral, os vênetos, ficaram com muito medo e até pensaram ser um sinal de mal agouro. Quem trouxe serenidade foi Maria Augusta, sempre hábil em acalmar os filhos. Pela manhã reuniu todos os filhos e disse-lhes que tinha sonhado com o marido, Daniele e ele no sonho "pediu para eles terem coragem e não deixarem se influenciar com a morte daquele jovem. A vida era assim mesmo, cheia de ciladas e este era o seu destino, a sua hora tinha chegado e ninguém poderia ter feito nada para o salvar. Eles deveriam rezar um rosário todas as noites durante uma semana pela intenção da sua alma e também levar algumas flores que encontrassem no local onde ele estava sepultado. A vida da família devia continuar. Não podiam se amedrontar após tudo o que já tinham passado para chegar até ali". Ouvindo o relato do sonho da mãe todos se sentiram mais confortados e se acalmaram bastante, começando a esquecer o ocorrido. Tudo no lote estava por fazer, não queriam morar naquela cabana feita pelo falecido e assim resolveram atear fogo, como forma de exorcizar os maus espíritos. A família, com dificuldade, passou a primeira noite na nova terra, abrigada no oco de uma grande árvore chamada de embú. Era verão e um pequeno fogo, logo à entrada, servia para aquecer um pouco, iluminar e espantar algum animal selvagem. Receberam do governo sacos de mantimentos para alguns meses, vários utensílios domésticos e ferramentas para o trabalho rural, além de vários tipos de sementes para iniciarem uma roça, que naquele mês já deveria estar plantada. Genaro com os três irmãos iniciaram o desmatamento de uma área, perto de onde tinham pensado construir a futura casa, não longe de um curso de excelente água. Com os troncos mais finos retirados do local, fizeram uma grande barraca, serviço que todos tiveram que participar, inclusive a mãe e duas das irmãs menores, pois, a outra ficou encarregada de cuidar da comida que estava sendo preparada em uma fogueira improvisada, cercada por grandes pedras. Após três dias de trabalho a cabana, com três aposentos, ficou pronta. Estavam muito felizes com a nova "casa" e agora, depois semanas poderiam sair do abrigo no oco da árvore. Derrubadas as árvores e queimado o mato, colocaram na terra parte das sementes que haviam recebido, principalmente hortaliças, pois a temporada para semear o milho já havia passado e o trigo só deveria ser semeado no início do inverno, conforme instruções recebidas dos funcionários do governo. Com o passar das semanas foram se ambientando e conhecendo melhor o terreno que haviam adquirido. Era muita terra, mais do que podiam imaginar quando estavam na Itália. A propriedade era coberta por uma vegetação abundante e árvores imensas estavam por todo lado. Um pequeno córrego, com águas cristalinas, cortava toda a propriedade antes de desaguar em um rio maior, situado poucos quilômetros abaixo. Os terrenos foram traçados pelo governo em forma retangular, com duas frentes onde passavam pequenas picadas chamadas de linhas, que por contrato os proprietários deviam manter sempre limpas, para permitir o tráfego. Alguns desses lotes chegavam a ter áreas de 50 hectares, como este da família de Domenico, isso porque tinha sido demarcada alguns anos antes para o outro proprietário. Media 250 metros de largura por 200 metros de comprimento, assim, os vizinhos mais próximos ficavam bastante longe.

Continua
Trecho do conto 
"Em Busca de um Futuro Melhor"
Dr. Luiz Carlos B. Piazzetta
Erechim RS



sábado, 24 de junho de 2023

Da Província de Treviso ao Pampa Gaúcho: A Jornada Épica de Genaro em Busca de um Futuro Melhor - parte 2

 




O Embarque


Deixaram Segusino com o coração partido, ansiosos com tudo que ainda estava para suceder. Nenhum deles ainda tinha viajado de trem e essa novidade os estava deixando muito apreensivos. Também a longa viagem de navio, para a travessia do oceano, deixava-os com muito medo. Muito tinham ouvido falar, e até algumas canções populares relatavam temporais e naufrágios em alto mar, o que aumentava o medo de todos. O clima reinante entre eles era uma mistura de tristeza, ansiedade, medo, mesclado com muita esperança em dias melhores. Genaro escondia de todos os seus medos e preocupações, tentava, na presença dos irmãos, se fazer de mais forte do que realmente era a fim de transmitir coragem a eles. Naqueles tempos uma viagem de trem como aquela, entre Segusino e Gênova, demorava muitas horas e no trajeto passavam por muitas dezenas de pequenas e até grandes cidades. Precisaram fazer baldeação, para a troca de trens, que paravam em praticamente todas as estações, onde, invariavelmente, dezenas de outros camponeses como eles embarcavam com destino ao mesmo porto. Nessa época a grande emigração italiana estava em pleno vapor e milhares de italianos do norte ao sul da península deixavam o país todos os meses, sendo o Brasil um dos destinos mais procurados, além dos Estados Unidos e da Argentina. Depois de uma noite sem praticamente poderem dormir, muito cansados, chegaram a Gênova. Estava muito frio, porém não chovia e de longe já puderam ver o porto com alguns grandes navios atracados. Ficaram pensando qual daqueles os levaria para o Brasil. Eles tinham as passagens gratuitas na terceira classe do vapor Giulio Mazzino, um grande navio que embarcaria mais de mil e duzentos passageiros até o Brasil. Eram meados de dezembro de 1883 e o porto estava repleto de pessoas, a maioria deles emigrantes esperando chegar a hora de embarcar. Maria Augusta, em pensamento, agradeceu ao agente de viagens pela honestidade em agendar a partida de Segusino justamente no dia anterior do embarque. Isso, ela sabia, não era comum, pois, muitos agentes desonestos agendavam passagens para o porto muitos dias antes do embarque, fazendo com que os pobres emigrantes, que já não tinham quase nada, ficassem a mercê de comerciantes exploradores, precisando gastar suas poucas economias com alojamentos e alimentação, ou fazer como a maioria, ficar ao relento em torno do cais e comendo alguma coisa que tinham levado de casa. Provavelmente, esses agentes desumanos deviam receber propinas dos donos de albergues e pensões localizadas nas ruas próximas ao porto. Genaro e um dos irmãos aproveitaram para dar umas voltas rápidas pelo cais, passando por de dezenas de grupos de emigrantes com suas grandes malas e sacos, chegando a conversar com alguns deles, se inteirando de alguns aspectos da viagem no grande barco. Genaro era um rapaz muito esperto e ativo, em pouco tempo conseguiu reunir informações que seriam muito úteis para eles. O porto era uma confusão de pessoas, dezenas de funcionários do porto e da companhia de navegação circulavam rapidamente em todos os sentidos, carregando grandes caixas para o interior do navio ancorado a beira do cais. Do seu interior se ouviam ordens gritadas em altos berros pelos marinheiros, que estavam se preparando para a chegada a bordo daquela multidão de passageiros. A tarde, um longo apito pode ser ouvido em todo o porto, era o aviso para o início do embarque. Em fila todos os passageiros, com suas passagens e passaportes à mão, carregando malas e sacos com suas bagagens de mão começaram a subir a longa escada inclinado apoiada na lateral do navio. Dezenas de mulheres com lenço amarrado na cabeça, carregando os filhos pequenos no colo e puxando outros pelos braços, algumas delas ainda aleitando o bebê, muitas crianças pequenas chorando em simultâneo, amedrontadas pela grande movimentação ou pela perda de vista momentânea de suas mães. Homens de aspecto sofrido, chapéu na cabeça, mal vestidos, carregando filhos maiores, cadeiras, sacos com pertences e outras bagagens. Genaro ajudava a mãe organizando a entrada de todos os irmãos, que andando sozinhos subiram a escada. Como os papéis de emigração estavam todos em ordem foram rapidamente admitidos na embarcação, onde imediatamente receberam as primeiras informações de como deveriam se comportar a bordo. Os alojamentos disponíveis eram enormes pavilhões adaptados com filas de beliches. Os homens e os meninos maiores de oito anos ficavam em um pavilhão e as mulheres e as crianças menores em outro. Assim as famílias eram separadas desde o embarque, criando muitas dificuldades. Genaro ficou em um pavilhão com os três irmãos e a mãe com as outras três filhas menores em outro. Com dois novos apitos o navio lentamente se afastou do cais e gradualmente Gênova foi ficando para trás. Estavam descendo pela costa italiana pelo Mar Tirreno, a caminho do porto de Nápoles onde seriam embarcados mais de 400 emigrantes provenientes de várias províncias meridionais da Itália. O destino desse grupo era a Província de São Paulo, contratados para trabalharem nas grandes fazendas de café. Depois do embarque desse novo grupo e acomodar os novos passageiros, o navio se afastou rapidamente da costa italiana e tomou o rumo para o Brasil, após atravessar o estreito de Gibraltar. A vida a bordo era bastante monótona e os passageiros gradualmente foram se acostumando com o balançar da embarcação, diminuindo os casos de tonturas e vômitos dos primeiros dias. Foi cerca de trinta dias confinados em porões malcheirosos, ainda cheirando carvão misturado com odores dos vômitos e outros dejetos humanos. Não havia instalações sanitárias suficientes para todos e a água potável também era racionada ao mínimo. Grandes baldes de madeira, com tampa, colocados no final de cada fileira de beliches eram usados, sem qualquer proteção ou privacidade, para satisfazer as necessidades fisiológicas dos passageiros. A falta de ventilação naqueles porões, o calor, a limpeza precária, a falta de banho dos passageiros, tornavam o ar irrespirável. Animais de corte confinados para fornecerem carne e o abate a bordo sem muita higiene, ajudavam a tornar o ar difícil de respirar. Para agravar, naquela época ainda não havia frigoríficos a bordo, tornando perigoso consumir alimentos que não fossem bem cozidos. Quando passaram da linha do Equador, o calor era grande em contraste com o frio que haviam deixado alguns dias antes. Nem todos os passageiros tinham roupas adequadas. Foi em um desses dias que uma forte tempestade de fim de tarde atingiu a embarcação. Ventos furiosos faziam com as grandes ondas batessem com força no casco da embarcação fazendo muito ruído. O convés era constantemente varrido pelas altas ondas e os passageiros foram proibidos de subir ao tombadilho. O medo tomou conta de todos os passageiros que em voz alta apelavam por clemência, rezando aos seus santos protetores. Depois de duas horas, já escuro, o vento cessou e o mar lentamente foi se acalmando. Essa foi uma experiência terrível e muito traumática que Genaro e os irmãos lembrariam para os seus netos. Por sorte não tinham ocorrido doenças graves a bordo durante todo o trajeto e assim o navio não teria proibições para desembarcar seus mil e duzentos passageiros. Chegaram ainda à noite no porto do Rio de Janeiro e na manhã seguinte já puderam contemplar a bela paisagem verde e montanhosa que os cercava. Para Domenico e família a impressão era de um sonho, parecia até que estavam vendo ao vivo alguns dos relatos sobre o Brasil descritos pelo pai Daniele. Era o mês de janeiro de 1884. Desembarcaram e depois do exame médico de praxe foram encaminhados para a Hospedaria dos Imigrantes, na Ilha das Flores, onde ficaram abrigados por dois dias esperando outro navio de menor calado que os levaria para o Rio Grande do Sul. Os passageiros que embarcaram em Nápoles, que tinham como destino as fazendas de café de São Paulo, embarcaram no dia seguinte da chegada, em outro navio até o porto de Santos. A jornada de Genaro e família ainda seria longa, embarcados agora no navio costeiro Maranhão, seguiam para o porto de Rio Grande, passando pelo porto de Paranaguá, no Paraná para deixar algumas famílias venetas. Em quatro dias estavam em Rio Grande, na província do Rio Grande do Sul, onde desembarcaram com centenas de outros emigrantes italianos entre vênetos e lombardos sendo recebidos em grandes barracões comunitários a espera dos pequenos navios fluviais a vapor e pelas condições de navegabilidade dos rios para seguirem até a Colônia Dona Isabel, o destino de muitos dos emigrantes que viajaram com a família de Genaro. Tiveram que ficar mais de uma semana, praticamente acampados naqueles desconfortáveis barracões, até que finalmente chegou a ordem de embarque. Em pequenos barcos fluviais a vapor Genaro e a família passaram por Pelotas e começaram a atravessar a extensa Lagoa dos Patos, passando também por Porto Alegre, até a foz do rio Caí, pelo qual começaram a subir lentamente por aproximadamente sete horas, até o porto na cidade de Montenegro, o mais próximo da colônia Dona Isabel. Nesse local faziam uma breve parada técnica para poder enfrentar as várias horas de caminhada até os barrações da colônia Dona Isabel. Genaro e sua família estavam realmente extenuados por tantos dias de viagens e ainda tinham que percorrer vários quilômetros e subir uma difícil serra até alcançarem a colônia Dona Isabel. Realmente não tinham sonhado que a viagem seria assim tão penosa e longa. A mãe de Genaro sempre de bom humor tentava de todas as maneiras incutir coragem nos seus filhos, encontrando em tudo que viam, motivos para muitas brincadeiras, comparações e assim passar o tempo, afastando pensamentos negativos.

Continua
Trecho do conto 
Em Busca de um Futuro Melhor
Dr. Luiz Carlos B. Piazzetta
Erechim RS



segunda-feira, 19 de junho de 2023

Da Província de Treviso ao Pampa Gaúcho: A Jornada Épica de Genaro em Busca de um Futuro Melhor - parte 1

 



A Vida na Vila

Genaro era um jovem de quatorze anos. Tinha recebido esse nome dos seus pais pelo fato de ter nascido no mês de janeiro, do ano de 1866. Era o quinto filho de uma família de nove irmãos vivos, quatro meninas e cinco meninos. Sua mãe havia perdido três outros filhos, mortos ainda bebês, antes do primeiro ano de vida, por falta de uma melhor alimentação durante as seguidas gravidezes. Viviam na pobreza, como a maioria daqueles que moravam naquela pequena vila quase perdida à margem esquerda do rio Piave, no interior da província de Treviso. A vila, uma pequena fração do município de Segusino, que outrora já tinha vivido mais progresso, não passava agora de um amontoado de algumas poucas casas rurais, mal conservadas, com terrenos pequenos pouco produtivos, resultado dos seguidos desmembramentos quando das transmissões de posse deixadas como herança dos antepassados. A população da vila não ultrapassava, quando muito, duzentas pessoas, distribuídas entre a minúscula zona urbana e a rural. Uma pequena capela, uma pracinha e algumas antigas casas de comércio, entre elas, uma que vendia tabaco, sal, vinho e licores, administrada a muitos anos por uma viúva já idosa, a avó de Genaro. Era tudo que havia na vila. O prédio da prefeitura e a igreja matriz, com sua alta torre dos sinos e a praça, ficavam na sede do município, cerca de quatro quilômetros distantes. Aqui se podia sentir um pouco mais de movimento, principalmente aos domingos e dias santos, por ocasião das missas, quando também as diversas casas de comércio que vendiam vinho e licores também recebiam mais fregueses. Completava o cenário um pequeno hotel, com poucos quartos, agora quase sempre vazios, que em tempos passados dava abrigo às dezenas de balseiros que tinham descido pelo Piave com grandes balsas formadas com toras de madeira, provenientes sobretudo de Cadore e Cansiglio. Os "zattieri" como eram chamados esses trabalhadores, desciam com as balsas pelo rio  Piave até Veneza e retornavam a pé para começar uma nova viagem, muitos deles passando também por Segusino, onde faziam alguma refeição e pernoitavam. 
A família de Genaro tentava sobreviver como podia, plantando algumas hortaliças no pequeno lote de terra e criando alguns poucos animais domésticos, para ovos e abate. O pai Daniele tinha nascido no interior do município de Alano di Piave, localizado não muito distante, mas, já pertencente a província de Belluno e migrado muitos anos antes devido ao seu trabalho. Daniele conheceu a sua esposa Maria Augusta, a mãe de Genaro, no município de Vaz, também não longe de Segusino, quando, acompanhava o seu pai Antonio, que era um hábil carpinteiro, muito procurado em toda aquela região, e faziam um trabalho de reparo do telhado na casa dos pais de Maria. Depois de um namoro e noivado curtos, algum tempo depois, se casaram na Igreja Paroquial San Leonardo, de Vaz e depois de um ano, quando Maria já estava grávida do primeiro filho, Daniele resolveu se estabelecer por conta própria, descendo e costeando o rio Piave, rumando para Segusino, levando também a mãe viúva com eles. A situação de todo o Vêneto, e também da Itália, naquele período era muito difícil. O trabalho de carpinteiro estava cada dia mais difícil. Por falta de dinheiro as  pessoas não mais construíam e nem reformavam suas casas. As oportunidades de trabalho para Daniele foram ficando cada vez mais raras, chegando ao ponto que ele não mais aguentou e também passou a trabalhar como empregado rural diarista para alguns donos de grandes propriedades que ainda estavam sobrevivendo àquela economia que se seguiu a criação do novo país, a chamada Itália, que eles pouco conheciam. Genaro e suas irmãs mais velhas também trabalhavam o dia todo como diaristas em outras propriedades rurais da região. As dificuldades foram crescendo em casa e até as refeições, uma vez mais fartas, começaram a rarear e a polenta se tornou o único alimento ainda disponível. O pão branco e o vinho eram duas coisas que não conseguiam mais comprar. Genaro viu seu pai e irmãs mais velhas definhando a cada dia, por deixarem de fazer uma das refeições do dia, para sobrar comida para os irmãos menores. À mesa a polenta ficava cada vez menor, servida pela mãe e cortada com um fio de linha umedecido em água colocada em um prato fundo. Algumas poucas verduras amargas, tais como o "pissacan", completavam a pobre guarnição. Por cima da mesa ficava dependurada por um barbante, uma sardinha, ou outro peixe frito, em algumas raras vezes, um pequeno salame defumado, onde, cada um por sua vez o tocava com o seu pedaço de polenta, para obter algum sabor. Essa dieta quase única e muito fraca em nutrientes, fez o pai de Genaro e uma das suas irmãs ficarem muito doentes, com a pelagra, precisando internação em um hospital distante, na cidade de Mogliano Veneto. Depois de alguns meses de tratamento a irmã conseguiu se recuperar bem, mas, infelizmente, o seu pai voltou para casa para morrer pouco tempo depois. A morte de Daniele desestruturou completamente a família, deixando-os na miséria completa e as poucas economias, incluindo a vaca e o pequeno burro usado para o trabalho, foram vendidos para tentar salvá-lo. 
Um ano após o falecimento de Daniele, as duas irmãs mais velhas de Genaro se casaram. A primogênita, com um bravo rapaz de Vidor e no mesmo ano emigraram para os Estados Unidos. A outra irmã também se casou logo, em 1882, com um rapaz de família conhecida, moradores à localidade de Col Lonc e emigraram para Chipilo no México, com grande número de outros camponeses trevisanos e beluneses. 
Genaro já estava com dezessete anos, era agora o homem da família, responsável pela mãe viúva e mais seis irmãos e irmãs menores. Era o arrimo da família. Deveria se apresentar para o serviço militar no próximo ano, quando completaria 18 anos e isso o deixava muito preocupado. Pensava como a sua família poderia sobreviver sem ele. Em algumas ocasiões, nos tempos de paz, os rapazes arrimo de família eram dispensados do serviço militar, porém, não dava para ter certeza que isso aconteceria com ele. Não podia esperar pelo ano seguinte, quando então teria dezoito anos e se não conseguisse dispensa do serviço militar seria impedido de sair legalmente do país. Pensou até em migrar sozinho para a França e de lá embarcar em algum navio a caminho do Brasil, o destino que o pai sempre vinha sonhando para todos eles. Nos portos franceses de Le Havre e Marselha o controle do serviço militar era relaxado para os estrangeiros e passaria facilmente. Porém, lembrou que para  isso precisava ter dinheiro para comprar o bilhete de viagem, que não era pouco, e a família de muito tempo já não possuía mais recursos. Lembrou também de como ficariam a sua mãe e irmãos, pois, o outro irmão menor tinha somente 16 anos e não tinha ainda condições de assumir o seu lugar. Assim, em uma reunião da família, a mãe se impôs e resolveu seguir os conselhos do marido, que sempre falava que o Brasil era um grande e rico país no qual, certamente, encontrariam um local para eles. Daniele sempre alimentou a ideia de levar toda a família para o Brasil para fugir da carestia, do desemprego e da fome na Itália. Alguns dos seus conhecidos, anos antes, já tinham emigrado para a província do Rio Grande do Sul e contavam, nas suas cartas para as famílias, que estavam indo muito bem e aconselhavam os amigos a também irem para lá e jamais para a província de São Paulo. Sem discussão todos os irmãos concordaram com a mãe e começaram os preparativos para emigrarem juntos para o Brasil ainda naquele ano de 1883, quando Genaro estava com 17 anos. Na prefeitura fizeram um passaporte coletivo para todos da família, com destino ao Brasil. Ficaram sabendo que o governo do Império do Brasil continuava recrutando mão de obra na Itália e fornecia gratuitamente as passagens de navio e os deslocamentos até o novo local de trabalho. Genaro e quatro dos seus irmãos eram bem altos e muito corpulentos, acostumados desde cedo aos trabalhos pesados do campo, o que talvez compensaria a falta do pai, uma das exigências para obter a gratuidade da viagem, pois, aceitavam somente casais com filhos. Procuraram por um agente de viagens, também representante do governo imperial brasileiro, e sem maiores discussões foram aceitos para emigrar para o Brasil. Precisavam se desfazer das poucas coisas que possuíam e de tudo que não pudessem levar. Venderam até com facilidade a casa em que moravam, para um dos vizinhos. Venderam também a casa de comércio que era da avó, a qual tinha sido alugada e deixada pelo pai Daniele como a última reserva de capital, caso conseguissem emigrar. Conseguiram um bom valor por ela, até mais do que pensavam, por estar bem localizada, às margens da estrada que levava à sede do município.
Um dia antes de partirem, Maria Augusta e os filhos, após organizarem todas as caixas e sacos com a mudança, foram até o cemitério dar a última despedida para Daniele e a avó que ali estavam sepultados. Foram também até a igreja matriz se despedir do velho padre Michele, um antigo amigo da família, e pedir a sua benção para que a viagem transcorresse bem e que tivessem sucesso no Novo Mundo. Aproveitaram também para encomendar missas anuais, nas datas dos falecimentos de Daniele e da avó Giacinta, em intenção às suas almas. Se despediram de todos os amigos e vizinhos e em uma manhã bastante fria do início de dezembro, se dirigiram à estação ferroviária para pegar o trem até Gênova, e assim deixaram definitivamente a querida vila, para nunca mais voltarem.

Continua
Trecho do conto 
Em Busca de um Futuro Melhor
Dr. Luiz Carlos B. Piazzetta
Erechim RS




domingo, 18 de junho de 2023

Legados de Honra: Os Sobrenomes que Marcaram os Imigrantes Italianos nas Colônias do Rio Grande do Sul




Sobrenomes de Imigrantes Italianos Pioneiros nas  Colônias Dona Isabel e Conde d’Eu 

 Esta lista pode não estar completa faltando algum sobrenome



Accorsi, Adami, Adamoli, Agazzi, Agliatti, Agnoletto, Agostini, Alberici, Alberti, Alberti, Allegretti, Ambrosi, Anadro, Andreola, Andriollo, Arbusti, Arioli, Ariotti, Arisi, Arigoni, Arsego, Asolini, Astolfi, Attuatti, Azzulari, Bacin, Bagattini,Baiocco, Balbinot, Baldasso, Baldi, Baldin, Ballarini, Ballestrelli, Ballin, Balzan, Bandino, Barater, Baratto, Barbieri, Barni, Baron, Barrichello, Bartolozzi, Baruffi,Baseggio, Basei, Basiggio, Bassani, Bassi, Basso, Battistuzzi, Bau, Bavaresco, Beal, Beduschi, Belatto, Bellaboni, Bellaver, Bellini, Bellotti, Belluzzo, Benedusi, Benvenutti, Bergamaschi, Bernard, Bernardi, Bernardon, Bersaghi, Berselli, Bertani, Berti, Berticelli, Bertoldi, Bertolini, Bertoncello, Bertuol, Bettinelli, Betto, Bez, Biacchi, Bianchetti, Bianchi, Biasibetti, Biasion, Biazus, Bissolotti, Bocca, Bocchi, Bonacina, Bonassi, Bonato, Bonatti, Bonazzi, Bonet, Bonetti, Bonfanti, Bonini, Boninsegna, Borcioni, Bordignon, Bordini, Bortolaz, Bortolini, Bortolozzi, Bos, Bottesini, Bovo, Bozzetto, Brancher, Branchi, Breda, Brignoni, Brochi, Brugalli, Bruschi, Bussinello, Cadore, Cagliari, Calcagnoto, Caldart, Callevi, Camello, Camera, Camillo, Campagnoni, Campio, Campiol, Cannini, Canova, Capelletto, Capellini, Cappellari, Cappi, Carli, Carlotto, Carnacini, Carniel, Carraro, Casagrande, Casellani, Cassol, Castaldo, Castelli, Cattani, Cattuzzo, Cauduro, Cavagnoli, Cavalet, Cavallari, Cè, Cecconello, Cecconi, Ceratti, Ceresa, Ceresoli, Cerini, Cesca, Checchi, Chiapperin, Chiarellotto, Chies, Chiesa, Chiossi, Chittò, Cignacchi, Cipriandi, Cobalchini, Colazioli, Colbacchini, Collonna, Colnaghi, Colombelli, Colussi, Comarella, Comin, Cominetti, Compagnoni, Comunello, Concatto, Conci, Concli, Conti, Conz, Conzatti, Corbellini, Cortesi, Coser, Costa, Crestani, Cristofori, Cunco, Cusin, Cutti, D’agostini, D’Ambrosi, D’Arrigo, Da Cas, Da Riva, Da Roit, Dadalt, Dal Dosso, Dal Pissol, Dal Piva, Dal Ponte, Dal Zocchio, Dalcorso, Dall’Acqua, Dalla Valle, Dallago, Dallavecchia, Dalle Laste, Dalle Laste, Dalmagro, Dalmolin, Dalri, Damin, Darè, Dartora, Datta, Davoglio, De Boni, De Conto, De Gaspari, De Grossi, De Lucca, De Marchi, De Mari, De Paris, De Rossi, De Venz, De Venzo, De Zan, Debastiani, Debona, Decarli, Decesero, Decesero, Degaspari, Degeroni,Deitos, Del Pizzol, Del Sassi, Delani, Della Libera, Dellai, Demarchi, Denardi, Denardi, Denicolò, Destri, Di Pomo, Dissegna, Ditòs, Do Campo, Dolfini, Dolmina, Domenegatto, Donada, Donadel, Donatti, Donatti, Dondoni, Dondoni, Dorigatti, Enos, Fabbian, Fabbrin, Fabbrizio, Faccio, Facciocchi, Faes, Faggion, Fantin, Fardo, Farina, Fascicolo, Fasolo, Favero, Fazzioni, Fedirizzi, Felice, Ferla, Ferrareto, Ferrari, Ferrarini, Ferretti, Ficcagni, Fin, Fiorentin, Fiornentin, Fiorot, Fistarol, Fittarelli, Floriani, Folgatti, Folle, Fonini, Fontana, Fontanella, Forestieri, Franceschet, Franceschini, Francio, Franciosi, Franzoloso, Frare, Frasnelli, Frittoli, Frizzo, Fronza, Frosi, Fucina, Fumegalli, Gabardo, Galli, Gallina, Gallon, Gambin, Garbuio, Gasparin, Gatti, Gazzola, Genacini, General, General, Gerelli, Germani, Gheller, Ghilardi, Ghisi, Giacomel, Giacometti, Giacometto, Gianello, Gianlupi, Gilberti, Giongo, Giordani, Girardi, Giroletti, Giron, Girotto, Gobbi, Goldoni, Goldoni, Grando, Grapiglia, Grasselli, Graziani, Graziola, Gregoletto, Grespan, Grolli, Guarani, Guarnieri, Ioppi, Iora, Ioriatti, Isatton, Jaconi, Lamonato, Lanfranchi, Lanfredi, Lanzini, Larentis, Lazaron, Lazzari, Lazzarini, Lazzarotto, Locatelli, Loncin, Longhi, Longo, Lorenzi, Lorenzon, Lot, Lotti, Lottici, Lucini, Lurni, Luzzana, Maccali, Maccari, Maddalozzo, Maestri, Magagnin, Maggioni, Mainardo, Malabarba, Malacarne, Malvezzi, Mandelli, Manfroi, Manica, Mantovani, Manzoni, Marca, Marchetto, Marchiori, Mariani, Marin, Marini, Mariuzza, Martinbianco, Martinelli, Martini, Martini, Masetto, Masiero, Massarola, Mattevi, Mattia, Mazzolen, Mazzoleni, Mazzolini, Mazzotti, Meggiolaro, Membri, Meneghetti, Menegotto, Menin, Merigo, Merina, Merlo, Mersani, Michelli, Michelon, Migotto, Milan, Milanesi, Mincio, Mion, Miorelli, Misturini, Mocelin, Molin, Mombelli, Monetta, Montanari, Montemaggiore, Montepò, Moragini, Morandi, Morè, Morelatto, Moresco, Moretto, Moro, Moroni, Morosini, Moroso, Moschetta, Mosena, Nicoletti, Nicolini, Noal, Notari, Oldoni,Oliva, Olivier, Ongarato, Oselame, Padoan, Padovan, Padovani, Paese, Paganelli, Pagani, Paggi, Pagliarini, Pagnoncelli, Pagot, Pallaoro, Paloschi, Palozzi, Pasa, Pasini, Pasqualotto, Pastorio, Patuzzi, Pavesi, Pazinato, Pedersetti, Pedersini, Pedot, Pedrini, Pedrollo, Pelicioli, Perico, Periolo, Perotto, Persici, Pertile, Petralli, Petrolli, Pezzenti, Piacentini, Piaia, Piana, Pianta, Piazetta, Piazza, Piccetti, Piccin, Piccoli, Pierdonà, Pietà, Pietrobon, Pigato, Pilati, Pina, Pintarelli, Pinzetta, Piovesan, Pizzamiglio, Pizzato, Pizzetti, Pizzi, Poggi, Polacchini, Polita, Poloni, Pomo, Ponzoni, Posoco, Possagnolo, Possebon, Prandini, Preamor, Presenti, Pretto, Provenzi, Putrich, Quagliotto, Rabaioli, Radavelli, Raffaeli, Raimondi, Rama, Rampanelli, Rampazzo, Ravaglio, Reduschi, Refatti, Regalle, Reginato, Regla, Remonti, Resemini, Riboldi, Rigon, Rinaldi, Riva, Rizzardi, Rizzo, Rocco, Roman, Rossato, Rosset, Rossetti, Rossi, Rossini, Rossoni, Rostirolla, Rotta, Roveda, Roversi, Rubbo, Sabbadini, Sabini, Sacchet, Salami, Salton, Salvador, Salvadoretti, Salvadori, Salvi, Sandri, Sanpine, Santin, Santini, Santolin, Saretto, Saroglia, Saroglio, Sartor, Sartori, Savi, Sbaraini, Sbruzzi, Scappini, Scarpini, Schiavini, Schizzi, Sciessere, Scolaro, Scomason, Scotta, Scudella, Sebben, Secchi, Segabinazzi, Sentenari, Serafini, Servat, Severgnini, Severgnini, Sfoggia, Signore, Silvestri, Simon, Simonetti, Soldi, Somacal, Somensi, Sonaglio, Soncini, Sonza, Soresina, Sorzi, Spada, Spader, Spagnoli, Spaldini, Sperotto, Spiazzi, Splendore, Stanga, Stefanon, Sterzi, Storti, Strapazzon, Stringhi, Stringo, Tabalti, Tagliaro, Tartaro, Tarter, Tarzo, Tasca, Tecchio, Tempesta, Tenasio, Teo, Tesoro, Tessaro, Tesser, Tochetin, Todero, Todeschini, Todesco, Toffoli, Toldo,Tomasi, Tomasini, Tombini, Tomè, Tommasel, Tommasini, Tondo, Tonetto, Toniazzi, Tonidandel, Toniolo, Tonni, Tortora, Tosi, Tosin, Trabucco, Tramarin, Tramontina, Traversin, Travi, Tremmea, Tresoldi, Trevisan, Trevisol, Trintinaglia, Troian, Trois, Trombetta, Trombini, Trucolo, Turcato, Turiani, Vailati, Valcarenghi, Valduga, Valerio, Valesani, Valiatti, Valmorbida, Vanni, Vanti, Varnier, Vazzoler, Ventura, Venturella, Venturi, Venturini, Versetti, Vettoretti, Vian, Vicini, Vigo, Vigolo, Villani, Zabot, Zaccagnini, Zago, Zagonel, Zambon, Zanatta, Zanchet, Zanchettin, Zandonà, Zandonai, Zanetti, Zangrande, Zanin, Zanolla, Zanon, Zanoni, Zanotelli, Zanotto, Zanuso, Zeni, Ziani, Zibetti, Zilli, Zoppas, Zorer, Zottis, Zuccatto, Zucchelli, Zucchetti, Zucchi, Zulian

segunda-feira, 12 de dezembro de 2022

O Caminho dos Imigrantes Italianos no Brasil

Travessia do Rio Caí

 



Os primeiros imigrantes italianos que chegavam ao Brasil desembarcavam exclusivamente pelo porto do Rio de Janeiro. Desciam nas instalações portuárias da Ilha das Flores, onde se situava a Hospedaria dos Imigrantes, que os acolhia pelo prazo máximo de oito dias  depois seguiam o seu destino. 

A partir de 1882, com o grande aumento do fluxo de imigrantes, o desembarque também passou a ser feito pelo porto de Santos, especialmente para aqueles imigrantes cujo destino final era o Estado de São Paulo. Os recém chegados faziam o trajeto desde o porto até a cidade de São Paulo, por trem ou em grandes carroças. Ficavam hospedados na Hospedaria dos Imigrantes esperando pelos representantes dos fazendeiros que vinham busca-los. 

Os imigrantes já vinham da Itália com contratos assinados com grandes fazendeiros de café, e também de algodão, e somente depois de registrados na hospedaria é que ficavam sabendo para onde seriam levados.

Aqueles imigrantes que seguiriam ainda para outros destinos na região Sul, como os portos de Paranaguá, Laguna ou Porto Alegre, eram transportados por navios costeiros brasileiros de menor calado. 

Os imigrantes que estavam destinados às colônias italianas do Sul do país, criadas a partir de 1875, paravam no porto de Rio Grande, no Rio Grande do Sul. 

Depois de uma parada de alguns dias, esperando pelas pequenas embarcações fluviais a vapor, ainda na Lagoa dos Patos, passavam por Pelotas até Porto Alegre, para então começar a subir pelos rios Caí ou Jacuí, até desembarcarem no local mais próximo de onde estavam situadas as colônias italianas recém criadas pelo governo brasileiro.

Subindo o rio Caí, os imigrantes que estavam destinados para as Colônia Dona Isabel e Conde d'Eu, hoje respectivamente as cidades de Bento Gonçalves e Garibaldi, desembarcavam em Montenegro. Já aqueles destinados para a Colônia Caxias, desembarcavam em São Sebastião do Caí. 

Do desembarque, nos portos do rio Caí, até as respectivas colônias, precisavam vencer uma longa distância, cujo percurso era feito em carroções puxados por bois ou a pé. A estrada era somente uma estreita picada no meio da mata, aberta a facão pelos próprios imigrantes e funcionários do governo brasileiro que os acompanhavam. 

No fim do trecho plano da chamada estrada Rio Branco, às margens do Rio Caí, tinha então início a parte mais difícil do trajeto que era a subida da Serra. Mas, antes de seguirem viagem, muitos paravam na improvisada hospedaria para se alimentar e descansar. Os italianos eram acompanhados por alguns funcionários do serviço de imigração que além do transporte, também serviam de guias para localizar o lote de terra correspondente a cada um dos imigrantes. 

Os imigrantes italianos que seguiram para a Colônia Silveira Martins, nome dado em homenagem ao presidente da província, porém, mais conhecida como quarta colônia de imigrantes italianos no Rio Grande do Sul, tiveram que subir pelo rio Jacuí até Rio Pardo e completar o restante do caminho em carros de bois ou a pé, até a localidade de Val de Buia.

A 4ª Colônia, criada em 1877, ficava próximo do município de Santa Maria, uma extensa região no planalto central do estado que engloba os atuais municípios de Silveira Martins, Ivorá, Faxinal do Soturno, Dona Francisca, Nova Palma, Pinhal Grande e São João do Polêsine, além de partes dos municípios de Agudo, Itaara e Restinga Seca.



Dr. Luiz Carlos B. Piazzetta
Erechim RS