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sábado, 4 de dezembro de 2021

Os camponeses italianos nas lavouras de café

Vapor Cavour


 

O império brasileiro, desde os últimos 30 anos do século XIX, já despontava como um grande país, com uma densidade demográfica muito baixa e ainda muito pouco desenvolvido, com uma economia baseada quase que exclusivamente na agricultura. A força de trabalho era até então quase que exclusivamente formada por escravos negros trazidos a força da África.

A explosão do preço internacional do café logo fez surgir extensas plantações nas províncias de São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo e Minas Gerais que exigiam cada vez mais a importação de escravos para o trabalho braçal.




Nessa época as vozes, dentro do império, contra a escravidão cresciam cada vez mais até que no ano de 1871 foi aprovada uma lei que gerou a necessidade dos cafeicultores mudarem de planos para tocarem os seus negócios. 

Era a chamada Lei do Ventre Livre, quando então os filhos das escravas seriam considerados livres. Essa lei foi o início do fim da escravidão no Brasil, o que só veio a acontecer em 13 de maio de 1888, quando foi definitivamente abolida com a promulgação da Lei Áurea.




Os italianos, pela grande disponibilidade naquele momento, desde o início foram uma das opções do governo imperial para substituir os negros escravos nas grandes plantações de café. Nas fazendas, por serem brancos e católicos, tinham um tratamento melhor que os escravos e a qualidade de vida desses primeiros imigrantes era um pouco melhor daquela dos escravos. Mesmo assim, para se ter uma ideia, a dureza do trabalho, as más condições das habitações disponíveis nas fazendas - geralmente eram as mesmas dos antigos escravos - e a mentalidade ainda escravagista, de muitos fazendeiros, levaram o governo italiano, com o decreto Prinetti de 1902 a suspender temporariamente a emigração para o Brasil, especialmente aquela destinada para as grandes fazendas paulistas de café. 

As primeiras levas de imigrantes italianos chegaram a província de São Paulo nos últimos anos do século XIX, provenientes das regiões do Vêneto e Lombardia, logo seguidos por milhares de outros camponeses da região sul da Itália.

Esses imigrantes eram recrutados por companhias especializadas, contratadas pelo governo imperial brasileiro. Vieram para o Brasil com a viagem paga pelos fazendeiros e tinham destino certo.

Através dos diferentes contratos assinados ainda na Itália deviam, com as suas famílias, ficar responsáveis pelo plantio, limpeza e colheita de um determinado número de pés de café. Durante o período para que foram contratados, geralmente, não inferior a dois anos, o imigrante não podia legalmente abandonar a fazenda.

O descontentamento desses primeiros imigrantes era grande com o que tinham encontrado no Brasil e crescia ainda mais na medida que percebiam que a suas vidas não tinham mudado muito para melhor com a emigração. O sonho da propriedade ainda não tinha sido alcançado e este devia ser perseguido a todo o custo. Para a grande maioria desses pioneiros retornar para Itália, sem terem alcançado o objetivo maior que os movera, era considerado uma grande desonra e estava fora de cogitação.


Imigrantes na colheita do café em uma fazenda paulista


Após vencido o período acordado no contrato, cumpridas as suas clausulas e depois de quitarem todas as dívidas contraídas com o fazendeiro, os imigrantes mais corajosos e empreendedores abandonavam as fazendas e se aventuravam por conta própria nas inúmeras cidades vizinhas que rapidamente estavam surgindo. 

Nelas se estabeleciam trabalhando como empregados nas várias fábricas já existentes na região ou, aqueles que já tinham aprendido algum ofício na Itália e especialmente os que tinham conseguido guardar alguma economia durante a permanência na fazenda, logo se tornavam empreendedores ou comerciantes autônomos.

Sem medo do trabalho, depois da longa jornada  na fábrica, em suas próprias casas trabalhavam por conta própria nos mais diversos ofícios, procurando assim aumentar a renda familiar. Este foi o maior segredo, reconhecido por todos,  do sucesso desses imigrantes italianos. 

Assim surgiram pelo interior de São Paulo e também na capital, pequenas e variadas fábricas e casas de comércio que, aos poucos, foram crescendo incorporando o trabalho de toda a família. Muitas delas se tornaram verdadeiras potências econômicas. O rápido progresso do interior paulista se deve, em grande parte, a esses pioneiros empreendedores italianos.

Uma grande diferença entre os italianos e os  imigrantes de outros países que chegaram aqui no Brasil naquele periodo, foi o fato que não tinham até então uma consciência nacional italiana, nem os mesmos costumes eram iguais entre eles e até mesmo não falavam a mesma língua.

Nessas cidades o idioma italiano foi rapidamente se difundindo, passando de uma língua conhecida e usada por poucos - pois os imigrantes só se comunicavam nos seus dialetos provinciais  - para uma língua usada por todos eles para facilitar os relacionamentos, principalmente após os casamentos entre noivos provenientes de diferentes províncias e regiões da Itália. 

Falar em italiano passou a ser considerado uma forma mais culta e educada de se viver e os diversos dialetos provinciais, assim como a maioria dos seus usos e costumes regionais trazidos com a emigração, foram aos poucos se perdendo, pois, essas eram consideradas características das classes mais baixas e que deveriam ser abandonados para se distinguirem. 

Tanto naquelas cidades do interior paulista que conheceram a imigração italiana, como também na capital do estado, se criaram bairros inteiros onde praticamente só viviam os italianos e seus descendentes. Exemplos são os grandes bairros italianos do Brás e do Bixiga que até poucos anos atrás moravam somente os descendentes de italianos.

  


Dr. Luiz Carlos B. Piazzetta
Erechim RS