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sábado, 24 de agosto de 2024

O Fim de uma Promessa


 


O Fim de uma Promessa

Em um pequeno vilarejo tendo ao fundo as majestosas montanhas dolomitas, em Belluno na região do Vêneto, Giovanni e Maddalena viviam modestamente, mas com dignidade. Pequenos trabalhadores rurais, trabalhavam como meeiros para um proprietário de terras. Passavam os dias cuidando da pequena propriedade e do rebanho do patrão, mas o que ganhavam mal dava para sustentar a família. A situação na Itália estava ficando cada vez mais difícil. As colheitas escassas, o aumento dos impostos e a falta de melhores oportunidades alimentavam o desespero. Foi então que começaram a chegar notícias sobre terras promissoras no Brasil, onde um homem trabalhador poderia prosperar.

Giovanni, com o coração dividido entre a esperança e o medo, tomou a decisão de emigrar. Venderam tudo o que tinham para pagar as passagens e, com poucos pertences, embarcaram em Gênova num navio abarrotado de outros italianos igualmente desesperados por uma nova vida. O destino? A colônia Nova Itália, em Morretes, no Paraná.

A viagem pelo Atlântico foi longa e penosa. No porão do navio, as condições eram insalubres, e muitos adoeceram. Maddalena, grávida, sofria com enjoos constantes, mas não deixava a esperança esmorecer. Giovanni, por sua vez, tentava manter o ânimo, mas as incertezas o corroíam. O que realmente os aguardava do outro lado do oceano?

Após semanas de travessia, avistaram o porto de Paranaguá, após antes já terem passado pelo porto do Rio de Janeiro, onde regularizaram a situação no país. Desembarcaram com alívio, mas a realidade logo os atingiu. A promessa de terras férteis e uma vida próspera em Nova Itália logo se mostrou uma ilusão. A curta jornada de Paranaguá a Morretes foi marcada pelo silêncio apreensivo. Ao chegarem à colônia, foram recebidos por um cenário desolador: a terra era ingrata, coberta por vegetação densa e pedras. O clima quente típico de litoral propiciava o aparecimento de insetos de todo o tipo que infernizavam a vida de todos. Entre eles os mosquitos e os bicho-de-pé eram os piores. As ferramentas que lhes forneceram eram escassas, faltavam sementes e o apoio da administração da colônia, inexistente.

Nos primeiros meses, Giovanni e Maddalena lutaram para sobreviver. Derrubaram árvores, drenaram pântanos, queimaram a mata e tentaram preparar o solo para a plantação. As promessas de apoio nunca se concretizavam. Os alimentos eram escassos, e a saúde de Maddalena, debilitada pela gravidez e pela exaustão, começou a piorar. Giovanni fazia o possível, mas sentia-se impotente diante do sofrimento da esposa.

Quando finalmente o primeiro filho do casal nasceu, a alegria foi ofuscada pela desnutrição e pelas doenças que assolavam a colônia. Muitos imigrantes, como eles, já haviam desistido e deixado o lugar em busca de melhores condições em outras partes do Brasil. Giovanni, no entanto, relutava em abandonar a terra pela qual tanto havia lutado.

A colônia começou a definhar, segundo conversas entre os colonos, devido à má administração. As famílias que ainda resistiam enfrentavam a falta de comida e a solidão. Os relatos de falência da colônia Nova Itália começaram a circular, e logo se tornou claro que o projeto estava condenado. Giovanni, com o coração pesado, percebeu que não restava outra opção senão partir.

Em vez de retornarem a Paranaguá, como alguns fizeram, Giovanni e Maddalena decidiram subir a Serra do Mar. Ouvindo histórias de tropeiros que por ali passavam e de outros colonos que haviam encontrado melhores oportunidades nas terras férteis ao redor de Curitiba, decidiram tentar a sorte mais uma vez. Com o filho nos braços e o pouco que restava de suas economias, enfrentaram a subida íngreme e desafiadora da serra.

Ao chegarem à periferia de Curitiba, encontraram terras à venda. Embora fossem simples e desmatadas, essas terras eram muito férteis e representavam uma nova chance. Giovanni e Maddalena compraram um pequeno lote e começaram novamente. A vida na capital paranaense também não era fácil, mas Giovanni e Maddalena, com muito trabalho e determinação, começaram a cultivar o solo que haviam adquirido. O clima era muito bom, parecido com aquele que deixaram para trás na Itália. Dedicaram-se ao cultivo de hortaliças e outros produtos agrícolas, transformando o terreno antes um campo em um pequeno jardim produtivo. Todos os dias, carregavam a carroça com suas colheitas frescas e, ao invés de vender nos mercados locais, percorrendo as ruas de Curitiba, Giovanni e Maddalena vendiam diretamente aos consumidores. Iam de porta em porta, visitando os fregueses que rapidamente passaram a confiar na qualidade dos produtos que ofereciam. A relação próxima com os clientes e a atenção aos detalhes permitiam que, mesmo em tempos difíceis, sempre houvesse demanda para os produtos do casal. O lucro, embora modesto, era suficiente para sustentar a família e proporcionar-lhes uma vida digna.

Com o tempo, o que começou como uma simples tentativa de sobrevivência se transformou em uma base sólida para o futuro. Giovanni e Maddalena finalmente encontraram a prosperidade que tanto haviam buscado, não nas grandes promessas de outrora, mas na humildade de um trabalho árduo e no amor à terra.

Com o passar dos anos, Giovanni e Maddalena se integraram à comunidade de outros imigrantes italianos na região, criando raízes e vendo sua família crescer. A falência da colônia Nova Itália ficou para trás, como uma lembrança amarga de um sonho que não se concretizou, mas também como um símbolo de sua resiliência.

Assim, em um novo pedaço do Brasil, Giovanni e Maddalena, como tantos outros imigrantes, encontraram finalmente um lugar para chamar de lar. Sabiam que a verdadeira riqueza não estava nas promessas de terras distantes, mas na capacidade de superar adversidades e construir um futuro, mesmo quando os sonhos originais se desfazem.