Em 1880, no final do século XIX, em um mundo onde as esperanças e os sonhos de muitos italianos estavam ancorados na promessa de uma vida melhor no Brasil, Concetta, uma jovem mãe, seu marido Gennaro Pizzioni e a pequena Letizia, filha do casal com apenas cinco meses de idade, embarcaram no navio Príncipe de Astúrias, partindo do Porto de Nápoles com mais de 1.200 outros emigrantes italianos.
Concetta Bucce nasceu em 1861, oriunda da pequena vila rural de Cozzo di Naro, localizada no coração do município de Caltanissetta, situado no centro da Sicília. Proveniente de uma família de agricultores desafortunados, que, sem terra própria, laboravam como arrendatários para um proprietário de terras. A árdua tarefa de dividir as escassas colheitas com o senhorio deixava a família em constante privação, enfrentando períodos de grande carência nos últimos anos.
Os Bucce eram uma família numerosa, algo comum na região, e o casamento de Concetta com Gennaro trouxe algum alívio para seus exaustos pais, representando uma boca a menos para alimentar. Concetta ocupava a segunda posição entre seus oito irmãos.
Gennaro Pizzioni, nascido em 1859 em Santa Barbara, um vilarejo próximo ao de Concetta, originava-se de uma família de pequenos agricultores. Ao longo de várias gerações, cultivavam uma modesta, porém produtiva, área de terra, predominantemente coberta por oliveiras e limoeiros. Além disso, plantavam tomates e pimentões, ingredientes essenciais na culinária rica e aromática da ilha, que posteriormente comercializavam no município.
Embora Gennaro trabalhasse incansavelmente com seus pais e irmãos, a vida na pequena propriedade familiar não proporcionava o suficiente para todos. O casamento com Concetta, longe de aliviar a situação, exacerbou as dificuldades ao trazer mais uma pessoa para a casa dos Pizzioni. O nascimento de Letizia foi o ponto culminante que impulsionou a decisão de emigrar em busca de um futuro mais promissor.
Era uma viagem incerta e desafiadora, com o Atlântico como pano de fundo e um futuro desconhecido à frente. O oceano era tanto a promessa de uma nova vida quanto o receptáculo de tristezas indescritíveis. Durante a travessia, uma epidemia de difteria varreu o navio, espalhando medo e desespero. A doença ceifou vidas inocentes e mergulhou todos a bordo em luto e incerteza.
No entanto, a história daquela mãe é uma das mais comoventes. Segurando sua filha de um ano e meio nos braços, ela foi forçada a enfrentar a tragédia mais dolorosa de sua vida. Sua pequena criança, o raio de luz em meio às incertezas, sucumbiu à difteria. O desespero se transformou em agonia quando ela viu sua filha ser envolvida em um lençol, com uma pedra amarrada ao pescoço, e lançada no mar escuro, à meia-noite.
Seus gritos ecoaram pela escuridão da noite, sua voz se misturando com o rugido das ondas. Ela implorava para se juntar à sua filha no abraço gelado do oceano, recusando-se a deixá-la sozinha. Mas os braços cruéis da emigração a seguraram, impedindo-a de acompanhar sua amada filha na jornada final.
Essa história é um lembrete angustiante das duras realidades enfrentadas pelos emigrantes italianos que deixaram suas casas em busca de uma vida melhor no Brasil. Ela recorda à todos o alto preço que tiveram que pagar para encontrar a felicidade. É um testemunho da força, do sofrimento e da resiliência daqueles que ousaram desbravar o oceano em busca de um novo começo, carregando o peso da "angústia territorial" que os atormentou, não apenas geograficamente, mas emocionalmente e culturalmente. É uma história que nos faz lembrar das vidas marcadas por essa jornada inesquecível, uma jornada que incluiu a tragédia de uma epidemia que tirou a vida de tantos, incluindo a pequena e inocente filha dessa mãe corajosa.