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quarta-feira, 1 de maio de 2019

As Agruras no Cotidiano de Imigrantes Vênetos



As agruras no cotidiano de imigrantes vênetos em dois núcleos coloniais nas províncias de São Paulo e Paraná: um estudo comparativo

The acrities in the daily of immigrants vênetos in two colonial nuclei in the provinces of São Paulo and Paraná: a comparative study

Eliane Mimesse Prado (a); Elaine Cátia Falcade Maschio (b)
(a) Doutora e Mestre em Educação, Licenciada em História e em Pedagogia pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. eprado@facinter.br.
(b) Mestre em Educação e Licenciada em Pedagogia pela Universidade Federal do Paraná. elainefalcade@uol.com.br.

Resumo
Este estudo pretende analisar e comparar o desenvolvimento de dois núcleos coloniais formados por imigrantes italianos de origem vêneta. Os núcleos foram criados na segunda metade do século XIX e receberam imigrantes italianos por trâmites diferentes, desde o porto de entrada no Brasil até o seu estabelecimento efetivo nas terras desse país. Os núcleos pesquisados foram o de São Caetano e o de Alfredo Chaves, que, atualmente, são municípios localizados nas áreas metropolitanas das cidades de São Paulo e de Curitiba, respectivamente, e denominam-se São Caetano do Sul e Colombo. Embora a inserção e estabelecimento desses imigrantes tenham se dado de modo diferenciado, identificaram-se ações similares no desenvolvimento das localidades. Foram organizadas as moradias, as plantações de subsistência, as criações de animais, para, a partir de então, ter início o comércio com as capitais das províncias e as conseqüentes reivindicações ao governo. Os aspectos relevantes para esses dois grupos analisados centravam-se: na religiosidade, com a construção/reconstrução das igrejas e cemitérios; na educação, com a criação de escolas; e na forte relação com o trabalho, que primeiramente ocorreu em seus lotes, e posteriormente abrangia o comércio e a indústria.
Palavras-chave: Imigração italiana. Colonização. Identidade vêneta.
Abstract
This study intends to analyze and to compare the development of two colonial nuclei formed by italians immigrants of origin vêneta. The nuclei
Revista Intersaberes | vol.1 n. 2, p. 220 - 242 | jul-dez 2006 | ISSN 1809-7286
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were created in the second half of the XIX century and they received Italian immigrants for different procedures, from the entrance port in Brazil to their effective establishment in the lands. The researched nuclei were of São Caetano and the one of Alfredo Chaves. Now they are located on the municipal districts in the metropolitan areas of the cities of São Paulo and Curitiba, respectively, and they are called São Caetano do Sul and Colombo. Although the insertion the establishment of and these immigrants have happened in a differentiated way, it was identified similar actions through the development of the places. They were organized in homes, subsistence plantations, creations of animals, for starting then the beginning trade with the capitals of the provinces and the consequent revindications to the government. The important aspects for those two analyzed groups were centered: in the religiosity, through the construction/reconstruction of the churches and cemeteries; in the education, through the creation of schools; and in the strong relationship with the work, that firstly happened in their pieces of land and later it embraced the trade and the industry.
Key-words: Italian immigration. Colonization. Identity vêneta.Introdução
O objetivo deste estudo comparativo partiu da observação do desenvolvimento desigual dos dois núcleos coloniais, cuja criação ocorreu a partir de uma meta única do governo, também porque a população era proveniente da mesma região da Itália e suas reivindicações recaíam sobre os mesmos quesitos. O desenrolar da colonização foi similar entre as 28 famílias do primeiro grupo que desembarcam em São Caetano, em 1877. Já na colônia Alfredo Chaves, as 40 famílias vindas do litoral chegaram em 1878.
Mas a política diferenciada dos governos provinciais possibilitou um crescimento diferenciado nas duas localidades. A existência da estrada de ferro e a posterior criação de uma estação de trem no núcleo de São Caetano contribuiu para o progresso e o contato com outras localidades. Na colônia Alfredo Chaves, o progresso e o desenvolvimento só foram possíveis após a chegada dos imigrantes italianos, visto que, até então, tratava-se de uma região isolada e habitada por poucas famílias de brasileiros.
A religiosidade foi outro fator comum entre os dois núcleos, tendo em vista a preocupação contínua com as missas, com a permanência de um padre
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na localidade, com a criação das irmandades e com a construção de uma igreja matriz que abrigasse todos os moradores em seu interior.
Com o fim da tutela do governo aos núcleos coloniais, suas consequentes emancipações possibilitaram que viessem a se tornar bairro ou vila. Assim ocorreu nesses núcleos, de maneira que os italianos fundaram sociedades de socorros mútuos em São Caetano, no ano de 1892, e em Alfredo Chaves, em 1905, devido ao aparecimento das fábricas e da ampliação nas relações comerciais.
Embora o desenvolvimento desses dois núcleos partilhem de experiências semelhantes, veremos que algumas diferenças marcam a trajetória histórica de cada um deles. E é nesse contexto que pretendemos mostrar como os diferentes encaminhamentos da política imigratória pôde caracterizar e constituir as diferentes histórias de cada cidade.
Política imigrantista e núcleos coloniais
A chegada em massa de imigrantes no país teve início com a necessidade de aumentar a mão-de-obra na lavoura das fazendas de plantio de café (como foi o caso da província de São Paulo) e na produção agrícola das pequenas propriedades, (como ocorreu na província do Paraná). A mão- de-obra mantida até esse momento era composta por escravos, vindos com o tráfico negreiro. As pressões inglesas fizeram o tráfico transoceânico diminuir, até extinguir-se.
Além da mão-de-obra, estava intrínseca nessa política imigrantista, em uma de suas vertentes, a necessidade de branquear a população do país. Era uma maneira considerada adequada de aumentar a oferta de mão-de-obra e, ao mesmo tempo, trazer um maior número de pessoas brancas para o país, além de possibilitar uma vida nova para os europeus agricultores que viviam em más condições em seu país de origem (Colbari, 1997).
Desde 1847, existia no Brasil duas políticas de imigração: a dos núcleos coloniais e a dos fazendeiros que precisavam de braços para a lavoura. Em São Paulo, especificamente, o foco centrava-se no plantio de café
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e, por isso, os proprietários dessas fazendas não aceitavam a criação dos núcleos. Até a aprovação da lei de terras em 1850, extensões de terras eram doadas aos estrangeiros, que, dessa forma, tornavam-se pequenos proprietários, reduzindo o número de trabalhadores livres, tão almejados pelos fazendeiros. A lei direcionava-se aos interesses dos grandes proprietários, permitindo a cessão de terras somente por título de compra (Carneiro, 1950).
Nesse contexto, os núcleos foram criados em locais não propícios para a grande lavoura, próximos a estradas de ferro e rios. As terras eram férteis para o cultivo de milho, feijão e batatas, de modo a possibilitar o desenvolvimento do local pelo comércio ou pela indústria, evitar a concorrência com os grandes produtores e o contato com os escravos. Essa é a configuração dos núcleos coloniais estudados.
A possibilidade de aquisição de terras em forma de pequenas propriedades atraiu para o Brasil um grande número de pessoas, ainda mais pelas subvenções em dinheiro oferecidas pelo governo. A legislação brasileira estabeleceu o tipo de imigrante que lhe interessava para ingressar no país: exigia um certificado de boa conduta, proibia o embarque de menores de 12 anos sem acompanhantes, de pessoas idosas, de indivíduos com algum tipo de deficiência e estava atento para a proporção de homens e mulheres solteiros (Carneiro, 1950).
A Itália foi um país fornecedor de mão-de-obra barata em fins do século XIX, por suas condições sociopolíticas e econômicas. Os italianos que vieram para o Brasil podem ser classificados como meridionais, setentrionais e os pequenos proprietários vênetos (Alvim, 1986). Os meridionais preferiam as ocupações da urbe e eram temidos pela sua agressividade; os setentrionais ou trabalhadores braçais, que provinham da região Norte da Itália, eram os diaristas, conhecidos como os sem-propriedades e foram utilizados para o trabalho conjunto com os escravos, e os pequenos proprietários nortistas, vindos da região do Vêneto, instalaram-se nos núcleos coloniais no interior das províncias, exatamente como ocorreu com os moradores dos núcleos analisados.
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Quando saíram do seu país não tinham a pretensão de voltar, e por isso se desfaziam de todos os seus bens e de sua pequena propriedade quelhes dava uma ilusão de independência” (Alvim, 1986:31), que não ocorria mais nesses anos. Todos aceitavam os contratos de trabalho impostos e os locais para onde deveriam ir quando chegassem ao Brasil. Desse modo, a imigração surgiu, para eles, como solução para a sobrevivência.
Com a publicação da Lei Provincial no 29, de 21 de março de 1855, o governo passou a promover a imigração na província do Paraná. Como vimos anteriormente, a necessidade de mão-de-obra estrangeira foi o interesse central para que a política imigratória fosse viabilizada através de contratos com empresários que se responsabilizavam pelo transporte dos imigrantes e pela formação de colônias. A entrada de imigrantes europeus no Paraná teve a finalidade de garantir a produtividade da agricultura de subsistência. Assim, a colonização de terras nos arredores da cidade de Curitiba, calcada na pequena propriedade, propiciou o desenvolvimento da produção agrícola de gêneros alimentícios e a construção e conservação de estradas para facilitar seu escoamento, advindo daí a melhor comunicação entre povoados e vilas da província.
A partir dessas iniciativas, inúmeras colônias foram criadas em anos posteriores à instalação da província do Paraná, localizadas no interior e nos arredores da cidade de Curitiba. Essas contribuíram para o desenvolvimento econômico da região, principalmente com o comércio e com a produção agrícola. As colônias foram formadas por imigrantes de nacionalidades alemã, polonesa, suíça, inglesa, francesa e belga, além de um pequeno contingente de imigrantes italianos. Somente a partir do ano de 1875 o Paraná recebeu um número significativo de imigrantes de nacionalidade italiana.
A chegada dos italianos no Brasil
No Paraná, a introdução de imigrantes italianos deu-se, primeiramente, por um contrato firmado entre o presidente da província, Venâncio José Lisboa e o empresário Sabino Tripoti, no ano de 1871
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(Balhana,1958:28). Muitos dos imigrantes foram instalados, inicialmente, na Colônia Alexandra no litoral, criada no ano de 1875.
Embora a proposta política de distribuição de terras - dinamizada pela província para os imigrantes que desejassem a posse da terra e buscassem o desenvolvimento agrícola e econômico - fosse aparentemente vantajosa, os imigrantes que pensavam encontrar condições propícias no Paraná, acabaram sofrendo as conseqüências da falta de interesse e de responsabilidade dos agentes da imigração quando de seu ingresso e instalação no país.
O empresário Tripoti, exemplo de falta de responsabilidade, fundou a Colônia Alexandra na região litorânea movido por interesses pessoais. Localizada próxima ao Porto de Paranaguá, despenderia poucos recursos para o transporte dos colonos. Dessa forma, poderia o empresário trazer um número muito maior de imigrantes com a metade dos recursos que o governo lhe pagaria. Segundo Balhana (1958:29), Tripoti não estava interessado nem nos colonos nem na colonização da Província. Seu objetivo era atrair um número maior de imigrantes, uma vez que recebia 500 liras e não despendia mais de 100 por imigrante que trouxesse. Para convencer o maior número deles na Itália, o empresário confeccionou folhetos denominados Carta ao Amico Colono, que traziam informações contrárias e enganosas sobre a realidade daquela colônia.
Não demorou muito para que aparecessem as conseqüências dessa prática e dessa política. O mau planejamento colocava em evidência a situação lastimável da colônia, tornando quase impossível a sobrevivência dos imigrantes. A localidade tornou-se pequena para o grande número de imigrantes que ali aportava. Os poucos colonos que conseguiram terras não tiveram êxito com a produção devido ao clima, que não era propício para o tipo de cultivo trazido do norte da Itália. A maior parte deles era composta por camponeses contadini, que procediam do Vêneto, região de clima muito frio.
Inúmeras reclamações chegavam a Curitiba da Colônia Alexandra. Muitos imigrantes desejavam até mesmo retornar à Itália, pois julgavam terem sido enganados pelas falsas promessas das propagandas. A melhor
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solução aos imigrantes seria a assistência e sua remoção para outro lugar. Assim, o governo rescindiu o contrato com o empresário e promoveu diretamente a imigração e a reimigração de colonos. Então, no ano 1877, criou a Colônia Nova Itália, em Morretes, para remover os imigrantes que não desejavam permanecer na Colônia Alexandra e também para instalar os imigrantes que continuavam a chegar (Balhana, 1958:30).
De acordo com Azzi (1987:213), em 1877, desembarcaram no Porto de Paranaguá cerca de 2000 colonos vênetos, estimulados por um sacerdote do Canal de Brenta. A Colônia Nova Itália, também na região litorânea, não prosperou devido aos mesmos problemas que afetaram a Colônia Alexandra. Vechia (1998) aponta como um dos principais problemas a localização dessas colônias, que dificultava a comercialização dos produtos. Além disso, muitas outras razões levaram ao fracasso daquelas colônias. Ferrarini (1973:42) afirma que outros fatores foram mais relevantes do que a distância. Segundo ele, o presidente da província, em visita à Colônia Nova Itália, em 1878, relatou a precariedade das condições de sobrevivência e a insatisfação dos colonos ali estabelecidos: estavam sem alimentação nem vestuário e acometidos de muitas doenças decorrentes do clima do litoral. Havia mais de 800 famílias ocupando 610 lotes, dentre os quais, alguns eram impróprios para o plantio. Tudo isso dificultava a permanência desses colonos nessas localidades.
O padre Pietro Colbacchini, em relatório datado de 13 de outubro de 1892, endereçado a Volpi Landi, presidente da Società Italiana de San Rafael e responsável pela assistência aos imigrantes, informou as condições dos colonos que viviam no litoral paranaense, nos anos de 1875 e 1877. Entre tantos problemas, Colbacchini destacou as doenças mais graves, principalmente aquelas causadas por insetos.
Azzi (1987:213) e Balhana (1958) também se referem às doenças causadas por insetos e pelo clima tropical. Mas o que gostaríamos de destacar no apontamento desses autores é a transferência gradativa dos colonos do litoral em direção a Curitiba. Como nos informa Balhana (1958), a maior parte do contingente de imigrantes estabelecidos no litoral dirigiu-se a Curitiba e
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sua acomodação no planalto curitibano deu-se de modo diversificado. Muitos imigrantes que deixaram o litoral por conta própria e acabaram se instalando em colônias já existentes. A maior parte se fixou em novas colônias formadas nos arredores de Curitiba devido à compra de terras feita pelo governo.
Embora criadas no mesmo momento, as colônias dinamizaram formas de organização social condizentes com cada grupo de imigrantes que nelas se estabeleceu e com a interação que esses diferentes grupos fizeram com a população brasileira. Assim, enquanto umas mantiveram por mais tempo uma cultura ligada a seu país de origem, outras sofreram mais rapidamente um processo de integração com a população paranaense, como foi o caso da Colônia Alfredo Chaves.
Na colônia de São Caetano, os imigrantes eram provenientes da região de Vitório-Vêneto, no Nordeste da Itália, embarcaram em 1877 no vapor Europa na cidade portuária de G nova e desembarcaram em Santos. Vieram de trem para a Hospedaria dos Imigrantes na cidade de São Paulo, local para onde todos os imigrantes se dirigiam quando chegavam ao país, permanecendo lá por oito dias. Traziam um prospetto contendo as condições mínimas para o imigrante que tivesse pretensões de fixar-se em um núcleo, na província de São Paulo, na localidade em que o governo disponibilizasse lotes. Seria possível escolher entre três tipos de lotes, com preços diferentes, de acordo com a extensão, além das formas de pagamento. Os colonos que conseguissem quitar o lote antes do prazo teriam um desconto. Mas isso não ocorreria na colônia de São Caetano.
Depois da parada obrigatória na Hospedaria, os italianos rumaram para São Caetano, de trem. A ferrovia construída pelos ingleses havia sido inaugurada em fevereiro de 1867, com algumas paradas nos locais considerados mais importantes.
Existia uma estação na Hospedaria para facilitar o embarque e o desembarque dos imigrantes. A estrada de ferro, que ligava as cidades de Santos e Jundiaí, foi a primeira a ser construída na província de São Paulo e sua inauguração havia sido entusiasticamente anunciada. Em São Caetano
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ainda não existia uma estação para o desembarque das pessoas, obrigando os imigrantes a saltarem do trem com suas bagagens.
Os primeiros anos nos Núcleos Coloniais
A extensão de terras da antiga fazenda dos beneditinos foi o local ideal para abrigar os recém-chegados italianos no núcleo colonial de São Caetano, por estar próxima da Capital, ser local de passagem dos trens, além de contar com rios e terras férteis para o plantio e ainda pastagens para a criação de animais. Havia também as construções que permaneceram nas terras, que serviriam de abrigo para as pessoas antes de construírem suas casas, já que, de acordo com a legislação, as colônias deveriam ter um edifício especial para abrigar os recém-chegados até a construção de suas casas.
Nesse caso, a construção de um prédio não foi necessária, pois a antiga casa-grande dos beneditinos foi suficiente para abrigar todas as pessoas.
Mas as condições de vida dos colonos foi extremamente precária quando de sua chegada, em 28 de julho de 1877. As 28 famílias encontraram em ruínas as construções da antiga fazenda composta pela casa-grande, a capela e as 12 casas das antigas senzalas. Além disso, moravam no local quatro famílias de brasileiros, três formadas por ex-escravos dos beneditinos e uma família de alemães. Tudo estava por fazer: as casas, as plantações, as divisões dos lotes, as picadas para identificar o local.
As construções remanescentes abrigaram as pessoas até que conseguissem viver adequadamente. Os representantes do governo provincial mantiveram um escritório da Inspetoria de Terras e Colonização nesse mesmo espaço. A legislação das colônias determinava a criação de uma junta para viabilizar a tutela, composta por oito membros: o diretor do núcleo, um médico e seis colonos. Os colonos que quitassem suas dívidas poderiam compor o grupo. Na impossibilidade de participação de todos os componentes, a junta funcionaria somente com o diretor, como ocorreu em São Caetano.
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Nesse período muitos faleceram, principalmente crianças, devido à febre tifóide, o que gerou outros problemas, como a falta de um cemitério na colônia e de um padre para encomendar os mortos. A solução foi o comparecimento quinzenalmente de um padre na localidade para celebrar missas, batizar crianças e rezar pelos falecidos. Mas os mortos ainda não tinham um cemitério. Eram enterrados no de São Bernardo, até que o pároco local não os aceitou mais. Eram então encaminhados ao cemitério da Consolação, na cidade de São Paulo entre 1878 e 1893. A partir desse ano passaram a ser sepultados no recém-inaugurado Cemitério Municipal do Brás, também na cidade de São Paulo, até a construção do cemitério local, no ano de 1911.
O regime de tutela dos imigrantes previa algumas funções a serem cumpridas pelo governo imperial, representado na colônia pelo escritório da inspetoria: ceder gêneros alimentícios, antecipar os instrumentos agrícolas, contribuir para a demarcação dos lotes, ajudar nos enterros e nas missas, providenciar padres e médicos. A legislação também previa o sustento dos colonos até o seu estabelecimento no lote adquirido, e eles deveriam receber um auxílio em dinheiro e as sementes necessárias para as primeiras plantações, assim que tomassem posse. Mesmo com a legislação em vigor, os entraves entre o governo e os colonos persistiram e nem sempre as leis eram cumpridas.
Os colonos ficaram morando nas casas precárias sem terem seus lotes distribuídos até janeiro de 1878. Nesse mês os primeiros colonos começaram a receber as suas terras. A distribuição teve início no primeiro dia do mês de janeiro, tudo com muita morosidade. Os alimentos e as sementes para o plantio não eram fornecidos com freqüência e as diárias pelo trabalho realizado nos lotes não eram pagas.
Tal situação gerou duas manifestações de descontentamento, uma no dia 10 de janeiro e outra no dia 4 de abril do ano de 1878. Na primeira manifestação, o diretor do núcleo colonial chegou a ser aprisionado, para forçar o comparecimento das autoridades e resolver o conflito. Compareceram o presidente da Câmara Municipal de São Paulo e o chefe de
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polícia, mas nada foi facilmente solucionado e os italianos continuaram trabalhando sem receber.
Mesmo com o número elevado de imigrantes italianos no país, os conflitos por essas e outras razões não recebiam a atenção devida do consulado da Itália. Apesar das difíceis condições de vida no Brasil, havia ainda a esperança da mudança, o que parecia impossível para essas pessoas no seu país de origem (Del Roio,1990).
A tutela do governo durava em média dois anos, até que fosse efetuada a primeira colheita e isso consistia em um dos pontos do contrato entre imigrantes e governo. Outros diziam respeito ao transporte do país de origem até a colônia, além das despesas iniciais como o fornecimento de instrumentos e sementes para o plantio. Na colônia de São Caetano, a tutela terminou em 3 de junho de 1879, quando as famílias que permaneceram nas terras conseguiram estabelecer-se em seus lotes. Os funcionários do escritório ainda ficaram na colônia por alguns meses depois do término do prazo.
Nesse momento os colonos já haviam aberto as valas que delimitavam os lotes, plantavam cereais, comercializavam carvão e cultivavam uva. Com essas atividades conseguiam o suficiente para a sobrevivência e até a venda de algumas mercadorias. O carvão era o mais lucrativo: a lenha era retirada da mata gratuitamente, para, em seguida, ser queimada e vendida na capital. Nem todas as famílias que chegaram em julho de 1877 permaneceram em São Caetano. Muitos mudaram para as colônias do Sul do país, na atual região do estado do Rio Grande do Sul, conhecida como Serra Gaúcha, outros foram para a Argentina e outros voltaram para a Itália. No recenseamento de abril de 1878, constam em São Caetano 172 pessoas, de um total de 251 pessoas que chegaram em julho de 1877. No ano da desvinculação da colônia do governo imperial, 1879, o bispo de São Paulo, Dom Lino Deodato Rodrigues Carvalho, aprovou um pedido dos imigrantes para a criação de uma irmandade religiosa na localidade. O bispo firmou um compromisso com os imigrantes e a Irmandade de São Caetano foi criada.
Desse modo, algumas ações do então extinto escritório da Inspetoria de Terras e Colonização foram assumidas pelos colonos, como a realização das
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missas mensais e a organização dos enterros, que não ocorriam com tal freqüência. A Irmandade também cuidava da cooperação mútua e da troca de informações sobre as formas de plantio e de como trabalhar a terra com gêneros diferentes de alimentos. As deliberações da Irmandade eram semelhantes às da junta administrativa estabelecida pela legislação para as colônias do governo. Em 1882, a Irmandade conseguiu licença para celebrar uma missa anual no dia sete de agosto, acompanhada de uma festa em homenagem ao santo protetor da localidade. Essa licença foi necessária para o comparecimento, imprescindível, do pároco no dia indicado, com o que se deu o início da Festa de São Caetano, a partir do ano de 1883.
A festa foi noticiada no jornal da capital várias vezes. A sua importância foi reiterada como homenagem ao santo e como motivo de encontro das pessoas. Muitos moradores da capital mantinham relações comerciais com as pessoas da colônia e a estrada de ferro facilitava o transporte dos passageiros à festividade. A Irmandade organizou a festa por muitos anos e conseguiu suprir as necessidades da comunidade naquele momento. Atualmente essa festividade ainda consta do calendário da cidade.
Segundo os depoimentos dos antigos moradores, essa foi uma época difícil. Os colonos plantavam alimentos para a sobrevivência como mandioca, batata e também salsa, alho e uva. Com o dinheiro da venda de seus produtos, compravam, em São Paulo, a farinha para fazer o pão e as massas. A venda do carvão e dos ovos ou das pequenas criações de galinhas e pombos ajudava a aumentar a renda. Com o tempo, a caça foi ficando rara, pois o desmatamento para o fabrico do carvão contribuía para o deslocamento dos animais, de maneira que a pesca continuava a ser fonte de alimento.
À medida que ocorreram aquisições de animais maiores, como vacas leiteiras e mulas para o transporte, a vida foi tornando-se mais fácil e as entregas do carvão ficaram mais rápidas.
Até o ano de 1879 mais 15 famílias chegaram à localidade enquanto que outras já haviam desistido de seus lotes. Foi uma nova tentativa de revitalizar a colonização, redistribuindo os lotes vagos. Aumentaram as dificuldades diárias, mais pessoas cortavam lenha para fazer o carvão e
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vendê-lo, acirrando a concorrência. A escassez inevitável do carvão fez com que os colonos fossem comprá-lo em outras terras mais distantes, para depois revendê-lo.
No início dos anos 1880, os três fornos dos antigos proprietários beneditinos ainda permaneciam em condições de uso e passaram a ser aproveitados pelos colonos para fazer tijolos. Eles fundaram a primeira olaria e, assim, reconstruíram e ampliaram suas casas que, até esse momento, eram de madeira. Nesse mesmo ano, parte do local desses fornos foi adquirido por um dentista da capital, Dr. Samuel Eduardo da Costa Mesquita, que aumentou a produção e vendeu tijolos para os arredores. Algumas das olarias dos colonos, estabelecidas às margens do rio dos Meninos, também contribuíram com as construções na capital, como a do Museu do Ipiranga. A olaria de Mesquita deu origem à Fábrica de Tijolos Paulista, localizada ao lado da igreja.
Do ano da criação do núcleo, 1877, até o dia 1o de maio de 1883, data da inauguração da estação de trem, a comunicação e o deslocamento das pessoas eram feitos principalmente pelas trilhas na mata, a pé, a cavalo, de carroça, ou de barco pelo rio Tamanduateí. Nos anos em que não existia a estação para a parada do trem, os moradores recorriam a certos sinais para pegar o trem, como evidencia o depoimento de Dona Esperança Martorelli Cairo, cujas recordações trazem à lembrança as bandeirinhas balançando no ponto mais alto da igreja, que ainda era uma pequena capela barroca.
Assim, as bandeiras eram colocadas na igreja e, quando avistadas pelo maquinista, ele reduzia a velocidade e efetuava o embarque das pessoas, muitas vezes com a composição em movimento. A estação de trem foi construída, em um local mais distante da igreja e mais alto, porque quando chovia muito, a enchente não permitia a parada da composição ou até mesmo sua passagem. Dois trens paravam diariamente na estação, um pela manhã, em direção a Santos, e outro à tarde, em direção a São Paulo.
Durante a festa de São Caetano, em agosto, mais dois trens faziam a parada na colônia (Projeto História de Vida, 1995).
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Significativas diferenças marcam a organização do núcleo colonial Alfredo Chaves, que foi criado no ano de 1878, e recebeu o nome do Inspetor Geral de Terras e Colonização, Alfredo Rodrigues Fernandes Chaves. As terras que formaram o núcleo foram divididas em 80 lotes rurais e urbanos e receberam 40 famílias de imigrantes que procediam das colônias do litoral. Cada família recebeu do governo o lote, que deveria ser pago à medida que, com o rendimento do trabalho nas terras do próprio lote, pudesse ser quitado. A facilidade de possuir a terra e de nela produzir fez com que aqueles imigrantes ficassem satisfeitos com a localidade e as ações do governo.
Inicialmente, ao se estabelecerem naquele núcleo, os imigrantes instalaram-se em dois barracões de madeira até que suas casas, construídas pelo governo, ficassem prontas. As habitações seguiam o modelo estabelecido no contrato de 16 de outubro de 1878. Eram casas simples, de madeira, com uma porta e duas janelas na frente e outra porta no fundo. O telhado, com inclinação de 45o, era feito de pequenas tábuas de madeira. A construção durou até dezembro daquele ano.
No dia 4 de janeiro de 1879, o núcleo foi emancipado, passando a denominar-se Colônia Alfredo Chaves. Nessa data, também foram entregues as casas e os títulos provisórios dos lotes aos colonos e também foi solicitada pelos colonos a construção de uma igreja, um cemitério e uma escola.
Em virtude da demora de atendimento pelo governo até meados daquele ano, os próprios colonos providenciaram essas construções. Primeiramente, a igreja e o cemitério foram construídos. Para a construção da capela, os colonos propuseram ao governo o reaproveitamento das madeiras dos barracões, em que inicialmente foram instalados. Como acabaram construindo-a por conta própria, utilizaram-se desse material. A escola foi viabilizada posteriormente. O documento que solicitava a construção da capela na colônia reaproveitando as madeiras dos barracões, datado em 21 de janeiro de 1879, permitiu a recuperação de indícios dos possíveis nomes das quarenta famílias que constituíram a colônia. Outro documento que traz informações sobre a colônia é um ofício, de 30 de maio
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do mesmo ano, enviado pelo engenheiro chefe do 2o distrito da província ao presidente da província.
Fundada em setembro do ano passado por italianos do Padre Ângelo Cavalli, que recusaram-se estabelecer-se no Piraquara, está situada em terrenos de boa qualidade e a pouca distância da Colônia Santa Cândida, arredores de Curytiba. Os colonos se achão satisfeitíssimos a ponto de preferirem trabalhar em seus lotes a aprontarem as terras. (...) A superfície da colônia é de 923573 divididos em 40 lotes, havendo urbanos e rurais, apresentando aquelles uma vila com 5 ruas, denominados: Limoeiro, Torres, Theresio, Chalreo e Antunes e uma travessa sem nome. Instaram no dia da emancipação pela necessidade de uma capela, cemitério e escola, de cujos melhoramentos deve esta colônia ser dotada. Da dacta de sua emancipação que teve lugar no dia 4 de janeiro do corrente anno até esta dacta, se tem gasto na conclusão de estradas, casas e outros serviços a quantia de 5420$235. Sua população é de 38 famílias com 144 pessoas, sendo: Maiores de 10 annos.........107, Menores de 10 annos..........37=144.1
Um aspecto deve ser destacado no ofício: é a expressão citada “os colonos se achão satisfeitíssimos a ponto de preferirem trabalhar em seus lotes a aprontarem as terra”. Ora, a posse da terra, como vimos anteriormente, era o maior desejo dos imigrantes; era o que os atraía a ponto de avançarem além-mar. Por essa razão, o autor é levado a supor a grande satisfação dos imigrantes. O documento nos permite ainda visualizar e entender como a organização daquela colônia foi se configurando naqueles primeiros anos: primeiramente, a divisão dos lotes e o trabalho; depois, a construção da capela, do cemitério e da escola.
Cumpre ressaltar que a relação com o trabalho era marcadamente forte entre aqueles imigrantes. No ano de 1880, alguns requerimentos foram enviados ao presidente da província solicitando melhorias para a produção agrícola nos lotes. Os principais cultivos eram o milho e a uva; esta última para a produção de vinho. Em 4 de fevereiro de 1880, os colonos enviaram ao Presidente da Província, um requerimento solicitando o maquinário para equipar um moinho de fubá. Segundo o documento, os colonos já haviam preparado o local, construindo um grande açude e um edifício de madeira para abrigar o referente maquinário.
ARQUIVO PÚBLICO DO PARANÁ, Curitiba. Documentos, 1879.
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Inúmeros eram os pedidos feitos pelos colonos das diversas colônias do Paraná, tornando-se inviável o atendimento de todos. Desse modo, a resposta do presidente da província ao requerimento de 1880 foi negativa. Assim, um dos imigrantes Francisco Busato, reaproveitando as instalações, assumiu o funcionamento do moinho, construindo o maquinário e ainda, no mesmo local, uma ferraria e uma serraria.
Os produtos agrícolas cultivados pelos imigrantes nos lotes da colônia eram comercializados na capital, Curitiba. Entretanto, as estradas que ligavam a colônia à capital não se apresentavam boas condições, e por essa razão, em 8 de outubro do mesmo ano, os imigrantes enviaram um outro requerimento ao presidente da província, solicitando que fossem realizados alguns reparos na estrada a fim de facilitar o escoamento da produção. O pedido foi aceito, pois a comercialização de gêneros alimentícios na capital era vantajosa para o governo. Essa prática concretizava os interesses do governo em relação à mão-de-obra estrangeira e atingia os objetivos dos colonos, que conseguiam comercializar com facilidade a produção na capital, trazendo recursos e estabilidade financeira à colônia.
No início do ano de 1885, iniciou-se a construção de uma nova capela, ainda de madeira. Até esse ano, existia uma pequena capela de madeira construída no ano de 1879, com as tábuas dos dois barracões que abrigaram os imigrantes no ano de sua chegada. As celebrações religiosas (missas, batizados, casamentos) eram realizadas quinzenalmente ou mensalmente, dependendo da possibilidade da presença de um sacerdote, uma vez que este deveria deslocar-se da capital. Nesse mesmo ano, a Congregação Scalabriniana, com sede na Itália, enviou um missionário para atender às colônias de imigrantes italianos, padre Pietro Colbacchini, que se estabeleceu na Colônia de Santa Felicidade e foi diretor da Missão Italiana, exercendo a função de padre e oferecendo a assistência religiosa aos colonos italianos, criadas a partir de 1875, nos arredores de Curitiba.
Em relatório, datado do ano de 1895, o padre Colbacchini analisa a forma como o governo organizou as colônias de imigrantes, citando como exemplo as Colônias de Novo Tyrol e Alfredo Chaves. Considera que essas
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foram experiências pouco satisfatórias no que se referia à sua organização e, principalmente, à distribuição geográfica dos lotes. O padre Colbacchini reclamava da forma da divisão dos lotes nas colônias, realizada pelo governo, o que dificultava a organização das vilas. Conforme o mapa da divisão dos lotes é possível verificar que cada colono recebia um lote urbano e um rural. O lote urbano, onde se localizava a casa do colono, estava disposto de modo a propiciar uma vila. No entanto, os lotes rurais localizavam-se distantes dos lotes dessa vila. O padre, embora reconhecesse que essa organização tivesse suas vantagens, discordava que os lotes rurais estivessem separados dos urbanos, pois durante o período da produção agrícola, do plantio e da colheita, os colonos teriam que se deslocar da vila para morar nos lotes rurais a fim de trabalhar na terra (Colbacchini,1968).
Esse movimento, segundo o padre, fazia com que os imigrantes ficassem, durante aquele período de trabalho, distantes e alheios aos benefícios existentes na vila, como a igreja, a escola, o médico entre outros. Na opinião dele, os lotes deveriam estar conjugados de modo que, na própria vila, pudessem construir suas casas, desfrutando dos benefícios, e, ainda, trabalhar com a terra no mesmo local. Com a insatisfação quanto à adoção daquele sistema de organização da colônia, o padre exprimia sua preocupação quanto à participação dos colonos nos ofícios religiosos, pois ele sabia que os colonos tinham como forte objetivo a estabilidade financeira.
O crescimento das localidades
No ano de 1890, em São Caetano, foi fundada a Fábrica de Formicida Paulista e comprada a pequena Fábrica de Bebidas Alcoólicas e de Refinação de Açúcar pelo Banco União de São Paulo, que passou a adquirir lotes ao longo da ferrovia, prevendo o escoamento das mercadorias das fábricas que ali poderiam instalar-se, como já ocorria em outras localidades.
Com o crescimento econômico e a expansão da área inicial estabelecida para o núcleo a necessidade de aprender a língua portuguesa foi aumentando. A participação do vice-cônsul da Itália em São Paulo tornava-se
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imprescindível em quase todos os negócios que envolvessem italianos e brasileiros. Apenas o colono Emílio Rossi tinha a fluência na língua nacional e era o representante dos moradores. As vendas do vinho, do carvão e de outras mercadorias ocorriam e não expandiram pelas dificuldades com a língua portuguesa. Os colonos conseguiram aulas particulares de português nessa época.
Em 1890 foram criadas quatro olarias de propriedade de italianos e nesse ano, houve muitos protestos dos moradores porque os impostos foram cobrados duas vezes. A confusão foi originada pela instalação da Intendência Municipal de São Bernardo. A nova intendência enviou cobradores aos seus bairros, entre eles São Caetano, que por sua vez já havia feito o pagamento para a cidade de São Paulo. A falta de definição dos limites causou a dupla cobrança. A localidade apresentava um bom rendimento para ser disputada entre os dois municípios, o que é também indício de seu desenvolvimento.
São Caetano passou a ser distrito fiscal de São Bernardo no ano de 1901. Até essa data os impostos eram cobrados pela cidade de São Paulo. São Caetano, assim, tornou-se bairro de São Bernardo e conseguiu sua autonomia administrativa apenas em 1948, quando passou a chamar-se São Caetano do Sul.
Apesar da cobrança de impostos, as condições de higiene eram precárias e as doenças persistiam, por motivos como a inexistência de médicos na região. Com a fundação da Società di Mutuo Soccorso Principe di Napoli, em novembro de 1892, tentou-se sanar esses e outros problemas. O terreno e o prédio da associação foram doados e construídos pelos moradores. A Irmandade de São Caetano, naquele momento, já não supria as necessidades da comunidade e era preciso algo maior e mais organizado. ASocietà Principe di Napoli aceitava como sócios todos os homens italianos moradores da localidade e, de acordo com suas atas de reuniões, manteve durante 40 anos o italiano como língua oficial. Essa associação, apesar do crescimento da localidade, permaneceu fechada para não-italianos e suplantou as ações da Irmandade de São Caetano, que se tornou uma entidade voltada somente para as obras religiosas, rezas e quermesses.
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A Società foi mais uma das associações fundadas por italianos, a partir da década de 1890 no Brasil, seguindo os moldes das associações italianas. Essas entidades acabaram por tornar-se o elo de ligação com a terra natal e normalmente eram formados por pessoas vindas da mesma região. A denominação que as instituições recebiam eram em homenagem a reis, príncipes, poetas, cantores ou qualquer cidadão italiano considerado importante para o grupo. Nos anos de 1898 e 1899 foi formada pelos moradores uma comissão para a reconstrução da capela, que foi acompanhada por dois padres que moraram durante aqueles anos na localidade, um em barroca foi demolida e teve início a construção da matriz, atualmente conhecida como matriz velha.
Nesse ínterim, o título de vila foi concedido à Colônia Alfredo Chaves, no ano de 1890 e esta passou a ser denominada Villa Colombo. Em janeiro daquele ano foi criada uma comissão responsável pela administração da Intendência Municipal.
A instalação da Vila foi feita em 5 de fevereiro de 1890, conforme a ata, a primeira sede da Intendência era a casa que abrigava a escola pública. No decorrer desse ano os primeiros representantes administrativos da Intendência eram brasileiros. A partir de março de 1891, três italianos ocuparam cargos junto à Intendência: o professor João Antonio Tosin tornou- se suplente de Juiz de Paz; Francisco Busato, fiscal da Intendência e Julião Juliani, responsável pelo cemitério. Pôde-se observar, então, que as estratégias daqueles imigrantes, quando da constituição do município para a ocupação de cargos públicos, configuraram-se por todos os níveis.
A década de 1890 foi marcada também por um grande desenvolvimento econômico na região. A instalação da Intendência foi fundamental para a abertura tanto de estabelecimentos comercias como também de algumas fábricas, que colaboraram para a organização social e econômica da região. Além do moinho de fubá, da ferraria e da serraria, abertos em 1880 por Francisco Busato, a partir de 1890, foram abertos novos estabelecimentos industriais. Em abril daquele ano começaram a funcionar o
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primeiro forno de calcário, cujo proprietário era o imigrante Giovanni Ceccon, e a primeira olaria, pertencente a João Manoel Bonfim.
Em 1897, Francisco Busato iniciou a compra de máquinas e materiais para a abertura de uma fábrica de louças, que foi construída próxima ao moinho, à ferraria e à serraria, aproveitando as instalações iniciadas na década de 1880. Embora as iniciativas para instalação da fábrica tenham sido do imigrante Francisco Busato, a propriedade foi vendida para Zacarias de Paula Xavier, que terminou de equipá-la e fundou a fábrica no ano de 1902. A montagem dessa fábrica exigiu muitos investimentos, pois se desejava instalar os equipamentos mais modernos, já que seria a primeira fábrica de louças artísticas do Paraná.
É necessário lembrar que, embora o processo de instalação de indústrias e comércios tenha sido revelador naquele período, era uma atividade econômica limitada a uma pequena parcela daquela população. A grande maioria, principalmente os imigrantes italianos, dedicava-se às atividades agrícolas em seus lotes de terras. O âmbito religioso, assim como o econômico, também foi profícuo. No ano de 1894, foi nomeada a Paróquia de Colombo, que recebeu o título de Nossa Senhora do Rosário, tendo como pároco Francisco Bonato. Assim, a população passaria a ter um sacerdote permanente. O mesmo padre instituiu a devoção ao Sagrado Coração de Jesus através da Liga do Apostolado da Oração. Foram associados naquele ano 178 devotos, homens e mulheres da comunidade, sendo todos de nacionalidade italiana. Em 1899, iniciou-se a construção da atual Igreja Matrize, para tanto, foi nomeada uma comissão responsável pela construção da nova igreja. Essa comissão era composta por seis italianos e sete brasileiros.
As duas primeiras décadas do século XX foram marcadas por muitas transformações nos âmbitos econômico, social e cultural da região. Certamente com a fundação da fábrica de louças, o município de Colombo passou a ter representatividade na economia paranaense. As peças produzidas na fábrica eram vendidas em todo o Brasil. No ano de 1906, mais dois estabelecimentos entraram em funcionamento: a primeira fábrica de massas e o estabelecimento comercial da família Puppi, um dos principais comércios da
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região sediado num imponente prédio. Ambos estavam localizados no centro da cidade, em frente à atual Igreja Matriz. Os demais estabelecimentos industriais, abertos desde a década de 1880, continuavam a funcionar prosperamente.
A população dividia-se entre o trabalho e a religiosidade. As atividades religiosas estavam fortemente ligadas ao cotidiano dos moradores, sendo que as missas aconteciam aos domingos pela manhã, e, na parte da tarde, a comunidade reunia-se para a meditação do Rosário. Em 1908, foi concluída a construção da atual Igreja Matriz. A construção se deu através de doações de materiais e da própria força de trabalho dos moradores da região e dos povoados vizinhos, sob a coordenação da comissão, formada em 1899. Muitos moradores, após o término da missa dominical, ajudavam nos trabalhos da construção da igreja.
Em meio a esse cenário de desenvolvimento e surgimento de novos estabelecimentos comerciais, o lazer centrava-se nas festas religiosas, principalmente para as mulheres. Não havia associações recreativas em que fosse viável a participação de toda a comunidade. Mesmo a Società Italiana di Mutuo Soccorso Cristoforo Colombo, criada em 1 de outubro de 1905, limitava-se à participação masculina. Sabe-se que sua função era também recreativa, no entanto, não se obteve informações sobre que atividades eram desenvolvidas.
A exemplo da Societá Príncipe di Nápoli, a Società Italiana Cristoforo Colombo adequava-se aos moldes das associações espalhadas por praticamente todas as colônias de origem italiana no Brasil. Segundo os seus estatutos, o objetivo da instituição era a promoção do bem estar, da moralidade e da instrução. No entanto, uma das principais finalidades era a assistência médica. Conforme os demais artigos do estatuto, os sócios tinham o direito de receber subsídios para o tratamento de saúde em caso de acidente e impossibilidade de trabalho ou tratamento de saúde fora do município. Para isso, cada sócio deveria contribuir mensalmente com uma quantia de 1$000 réis e tinha o direito de desfrutar dos benefícios garantidos
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pela associação. A participação restringia-se apenas a pessoas de origem italiana e, exclusivamente, do sexo masculino.
Considerações finais
Como vimos, embora vindos da mesma região da Itália, a trajetória desses dois grupos de imigrantes foi marcada por significativas diferenças. Uma série de fatores contribuíram para que isso ocorresse, mas o principal deles foi a política imigrantista adotada por cada província. Não devemos nos esquecer de que, em São Paulo, também houve um intenso fluxo imigratório italiano que se deu um pouco mais tarde, pelos idos de 1880. As condições de trabalho para os imigrantes que lá aportavam eram bem diferentes daquelas dos imigrantes que vieram para o Sul.
Conforme Rambo (2003:63), em São Paulo, a imigração serviria para ser incorporada aos trabalhos nas fazendas de café, enquanto que no Sul, a imigração européia deveria seguir as bases de uma economia agrícola alicerçada na distribuição de pequenos lotes para o desenvolvimento de uma agricultura familiar. Verificamos que, genericamente, esse era o intuito da imigração em massa, mas o núcleo de São Caetano formou-se como centro agrícola, para que, anos depois tivessem início outras atividades.
Assim, os italianos apropriaram-se das técnicas de fabrico de tijolos, passaram a produzi-los em suas olarias e distribuí-los para o mercado local e regional. Esse foi o ponto de partida para a ampliação das relações comercias e a instalação de outras fábricas na localidade.
Mesmo apresentando caracteríticas de uma colônia agrícola, como a colônia Alfredo Chaves, São Caetano sofreu as conseqüências da política imigratória paulista. O governo provincial do Paraná concedeu mais benefícios aos seus imigrantes do que o governo paulista. Os vênetos habitantes na província do Paraná desfrutaram da vantagem de uma política imigrantista calcada na preocupação de ocupação do território. Essa ocupação dava-se pela aquisição da pequena propriedade e conseqüentemente da produção da agricultura de subsistência. Os italianos moradores dos dois núcleos coloniais
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sofreram reveses nos anos iniciais de sua chegada às terras, mas lutaram bravamente pela sua sobrevivência e conseguiram concretizar seus sonhos, contribuindo com o progresso e o desenvolvimento das localidades que os acolheram nesta nova pátria.

Referências

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