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segunda-feira, 18 de janeiro de 2021

A Fuga do Campo dos Pequenos Agricultores Vênetos

Imigrantes italianos na hospedaria de São Paulo


Ainda no século XIX, todas as sociedades européias eram prevalentemente rurais. A terra era a mãe de toda a vida e de cada cultura. Nos campos os homens e mulheres encontravam o trabalho e os alimentos, as festas e canções. A sociedade está em grande transformação, novas cidades que crescem e fábricas que surgem e o movimento operário que avança. Mas, o campo continua no esquecimento, onde ainda vive a maior parte da população. Os agricultores não tem voz e também não escrevem. São analfabetos e vivem longe das cidades onde costumam morar e operar os políticos. Os agricultores não influenciam a história mas, por outro lado são eles que produzem o pão, o vinho e os demais  alimentos para o povo. A história não se escreve sem eles. É o homem do campo que suporta o maior peso da sociedade. As crises, as guerras, as revoluções, as carestias, as pestes pesam em grande parte nos seus ombros. Também a emigração é sobretudo um caso de agricultores. É portanto sobre as populações rurais que devemos ter os olhos apontados se quisermos entender um país e conhecer a sua verdadeira história. Isto porque, quando as cidades progridem, são somente alguma dezenas de milhares que estão bem, mas, quando o campo sofre, os que sofrem podem ser contados na casa de milhões. Se fogem enchem o horizonte. 



Imigrantes italianos no desembarque em New York

É justamente isso que aconteceu com o Vêneto, na segunda metade do século XIX. A emigração é sobretudo isso: é a história das populações rurais que não conseguem mais sobreviver da terra. O campo não é mais em grau de sustentá-los e os expulsa. Também a Itália do século XIX era ainda um país quase exclusivamente  rural. Também o Vêneto. Os trabalhadores dos campos se viram frente a dois problemas fundamentais: o primeiro era a fome, o segundo é a terra que quase sempre pertencia a quem não trabalhava nela. As condições dos agricultores era muito precária. Bastava uma chuva de pedras para os colocar em grandes dificuldades, bastava a frustração de duas colheitas para os levar a contrair empréstimos com juros de usura. O agricultor vêneto suporta em silêncio as  suas múltiplas vicissitudes. Havia um secular hábito para a suportação. A religião os havia ensinado a respeitar as autoridades. No agricultor vêneto prevalece a obediência: são os outros que decidem por eles. Bastava-lhes ter fé , coragem e disciplina. Nessa época o Vêneto ainda era uma colônia: uma sociedade formada por patrões e servos. 


Emigrantes vênetos no Porto de Genova

Caberá a emigração romper este esquema tradicional. Indo para o exterior o emigrante vêneto descobrirá pela primeira vez uma sociedade diferente. Conhecerá cidadãos livres e  novas responsabilidades. Encontrará as massas organizadas. A decisão de emigrar em definitivo terá para eles o mesmo valor de um gesto de liberação: romper a antiga tradição da servil, comprando finalmente a liberdade, refutando de obedecer sempre, de calar sempre. Esta é para muitos a emigração: mudar, andando para longe. Partir para sempre em direção a uma vida própria, para a independência. 

Texto de autor desconhecido


Dr. Luiz Carlos B. Piazzetta
Erechim RS

domingo, 3 de janeiro de 2021

Início da Emigração Vêneta



Até o ano de 1875 a população do Vêneto não pensava muito em atravessar o grande oceano em emigração para o Novo Mundo. Poucos tinham se aventurado até então nessa longa e perigosa viagem e  não eram os mais pobres e sim os pequenos proprietários de terra que já não conseguiam mais cumprir com os seus compromissos. Estavam mais atentos no que ocorria na Itália e nos demais países e saíram na frente. Vender as suas pequenas propriedades  e emigrar para a América, o Novo Mundo, com suas intermináveis riquezas, que se abria. 

A situação econômica da Itália se deteriorava rapidamente e muitas coisas estavam mudando, principalmente, para aqueles mais pobres, que agora já podiam pensar em viajar sem ter o dinheiro para os bilhetes de navio. Essa despesa agora seria paga pelos países que estavam recrutando mão de obra no Vêneto. Assim partiram em massa, para a Argentina emigrantes da Liguria, Lombardia e Piemonte. Os vênetos no entanto foram atraídos pelo Brasil, com os seus amplos espaços vazios, suas grandes florestas e as grandes plantações de café. Os primeiros vênetos a deixarem o país foram os pequenos agricultores provenientes do vale do Brenta, da Valsugana, de Belluno e de Feltre que, em 1876 em número de 275 pessoas, com eles Don Domenico Munari, até então o pároco de Fastro. Em 1877 partiu um outro grupo formado pelo padre Angelo Cavalli com 200 famílias, recrutados no vale do Brenta, Enego e Maróstica, que se dirigiram para o Paraná. Partiram, naqueles primeiros anos da emigração, cerca de 2.000 agricultores de toda essa parte do Vêneto, quase todos vicentinos e trevisanos, em direção ao mítico Brasil, em busca da cucagna

Povo religioso e respeitador, os vênetos foram ensinados durante séculos, pela igreja católica e forçados pelos senhores, a calar sempre, a obedecer sempre. Assim não tiveram o ímpeto de se rebelar e lutar, como aconteceu em outras regiões da Itália, contra as autoridades e os patrões. Tinham consciência que estavam sendo rápido e impiedosamente expulsos das suas terras, mas, os culpados eram sempre os seus patrões e não a difícil situação político econômica que o Vêneto precisou suportar, principalmente, nos primeiros anos da sua anexação pelo reino da Itália. 

A resposta dos vênetos, para essa situação crônica de pobreza e subserviência em que estavam vivendo, foi a emigração definitiva para o Novo Mundo, um verdadeiro movimento de libertação, que pode ser considerado como um ato revolucionário, uma forma de protesto ao estado italiano, aos odiados senhores,  os proprietários das terras, sem recorrerem ao uso da violência. Se moveram vilas inteiras, partindo muitas vezes no escuro, em silêncio, como se estivessem fugindo. Saíam dando vivas à América e morte aos insaciáveis patrões! Nós vamos para o Brasil e agora caberá aos senhores proprietários, aos patrões, trabalharem as suas terras, diziam os emigrantes em forma de desafio. 

A partida foi vivida, sem dúvida, como um acontecimento doloroso, mas, por outro lado, necessário. Rompeu uma secular situação de miséria sem fim e de vergonhosa subserviência, abriu as portas para esperança. 



Dr. Luiz Carlos B. Piazzetta
Erechim RS