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domingo, 3 de outubro de 2021

Padres Missionários e os Imigrantes Italianos




Existia um indisfarçável confronto entre a visão do Estado italiano, que defendia o ideal de italianidade pautada em elementos nacionais e aquela da Igreja que defendia a manutenção das práticas religiosas como fundamental para a preservação da identidade étnica. Tal conflito extremamente polvoroso na Itália pós unificação também fazia eco nas áreas de imigração. 

Em carta ao Mons. Spolverini, Internúncio apostólico da Santa Sede no Rio de Janeiro, datada de 24 de Maio 1888, o padre Colbachini escreve sobre os conflitos enfrentados em Curitiba. Sobre as críticas e as ameaças dos liberais italianos residentes na cidade bem como dos anticlericais e maçons. Fala das perseguições que sofria de todos os lados, especialmente do ex-agente consular Ernesto Guita que em discurso público o qualificava como ave noctívaga perigosa a Curitiba. Fala dos vários artigos nos jornais e que ao fim foi imposto à Guaita de suportar a perda do posto oficial que ocupava. Escreveu o padre Colbacchini:

"Aqui e acolá são muitos os me querem morto, ou porque afastou a concubina ou porque avisou a polícia das turbulências que inquietavam certas Colônias. Eu temo só a Deus e prossigo no meu caminho" 

As dificuldades para implementar a missão no Paraná eram muitas vezes associada a presença dos liberais ao qual ele associava a maçonaria. De fato, o final do século XIX assinala um período de crise do catolicismo luso-brasileiro tendo em vista a afirmação da mentalidade liberal, sobretudo, nos centros urbanos, bem como a decadência da sociedade patriarcal escravocrata. 

Também é um período de crescimento do movimento anticlerical. Tal premissa pode ser encontrada em diversos das cartas de Colbachini como esta escrita ao seu companheiro de missão Francisco Bonato em 10 de maio de 1888:

“Vós dizeis que Curitiba não é uma Zurique protestante, pois eu digo que é bem pior, é uma Nínive ateia e pagã. Em Zurique, a educação do povo, faz que sejam respeitadas as opiniões, aqui a ignorância e a maçonaria acreditam de ter o direito de ridicularizar de tudo e de todos. A Vossa presença não se dirá nada e nem se mostrará sinal de desprezo, mas depois nos círculos e nos negócios se usa como pretexto para ridicularizar o nosso ministério”. 

Os conflitos entre Colbachini e os liberais novamente vem à tona no contexto da Revolução Federalista que entre 1893 e 1894 também atingiu o Paraná. A presença de seus rivais também foi engrossada por conta da vinda de imigrantes portadores das ideias anarquistas oriundos da fracassada experiência da Colônia Cecília. O clima se tornou bastante tenso quando o referido sacerdote passou a discursar nas colônias contra o envolvimento dos imigrantes no conflito, inclusive chegou a facilitar a fuga de 60 imigrantes que já estavam arregimentados. 

No início de 1894 sofreu perseguições lideradas por alguns italianos hostis a sua presença e ao seu poder de liderança entre os italianos, e que participavam do conflito. Tendo feito oposição rígida à incorporação dos colonos nas tropas do exército, onde já haviam se instalado diversos liberais, Colbachini foi hostilizado fortemente, sendo jurado de morte. 

Em carta ao bispo de Piacenza, Mons. Scalabrini, datada de 28.04.1894, o padre Colbacchini descreveu a situação de perigo pelo qual passou:

"Na noite de 17 de fevereiro por obra de um indigno italiano, banido da Itália, coronel das forças revolucionárias, homem perverso, foram assaltar a minha residência de Água Verde e de Santa Felicidade, no intento de matar-me, porque eu desencorajava os italianos de alistar-se sob as bandeiras de qualquer patife que se era dado a revolução por ter modo de formar uma orda de assassinos. Os primeiros a atirar-se foram 50 italianos anárquicos de Curitiba, gente fugida da justiça italiana e que estava esperando momento para me depreciar e fazer-me as piores coisas. Dois meses tive que viver escondido em bosques pantanosos defendido de gente armada. As buscas dos mercenários para alcançar-me foram contínuas, mas não alcançaram seu fim. Agradeço a Deus de ter-me salvado de tantos riscos e comigo de ter salvado todos estes colonos que não tiveram de sofre quase nenhum dano em oposição das colônias polonesas e mesmo de seus autóctones que sofreram enormes danos".

Das perseguições sofridas no Paraná no período da Revolução Federalista, o sacerdote retorna a sua cidade natal (Bassano del Grappa) na Itália em 1894, onde mesmo a distância continua a influenciar os rumos da atuação scalabriniana na região. 

De fato, a missão scalabriniana é interrompida temporariamente porque o único sacerdote que permanece atendendo as colônias (Francisco Bonato) não chega a ingressar na Ordem criada pelo bispo de Piacenza. 

O próprio Colbachini, não era favorável a entrada deste, devido aos desentendimentos que com ele teve. Em 1895, chegaram os dois novos missionários escalabrianos enviados pelo bispo de Piacenza, Francesco Brescianini e Faustino Consoni, sendo que o primeiro passaria a chefiar a organização religiosa, que nesse mesmo ano teve sua sede transferida para o núcleo de Santa Felicidade. A capelania passou a contar com dois centros, um em Água Verde outro em Santa Felicidade e ainda com Francisco Bonato que continuou a trabalhar no atendimento dos colonos de Campo Largo e posteriormente de Colombo. 

Pietro Colbachini permaneceu na Itália até 1896 onde adere definitivamente à ordem dos padres missionários. Durante sua permanência na Itália escreve o livro Guida Spirituale per L’Emigrato Italiano Nella America, que foi resultado de um concurso promovido pelo bispo de Piacenza. A obra tinha como objetivo se constituir em um manual de comportamento e conduta moral para os imigrantes no caso de ausência de sacerdotes. 

No mesmo ano de 1896 retorna ao Brasil, desta vez vai para o Rio Grande do Sul, onde funda a colônia de Nova Bassano, que posteriormente se transformaria em cidade. Continua com seu posicionamento rígido e intransigente, o que por sua vez gera novos atritos. Em 1901 já com sua saúde debilitada vem a falecer em 30 de janeiro de 1901 em Nova Bassano.