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terça-feira, 4 de novembro de 2025

O Rissorgimento Italiano


O Risorgimento e a Unificação da Itália (1815–1870)


Risorgimento — termo que em italiano significa “ressurgimento” — designa o movimento político, social e cultural que conduziu à unificação da Itália no século XIX. Entre 1815 e 1870, a península, fragmentada em pequenos reinos e ducados submetidos a potências estrangeiras, passou por um processo gradual de integração territorial e nacional, culminando na criação do Reino da Itália sob a Casa de Saboia.

Contexto histórico

Após a queda de Napoleão Bonaparte e o Congresso de Viena (1815), o mapa da península foi redesenhado segundo os interesses das grandes potências europeias. O norte da Itália voltou a ser dominado pela Áustria, que controlava a Lombardia e o Vêneto; os Estados Pontifícios permaneceram sob o poder do Papa; o Reino das Duas Sicílias dominava o sul; e uma série de ducados e principados completava a divisão. O antigo Reino da Sardenha, governado pela dinastia dos Saboia, manteve sua independência e viria a tornar-se o núcleo da futura Itália unificada.

As primeiras revoltas (1820–1848)

As ideias liberais e nacionalistas, inspiradas na Revolução Francesa, começaram a circular por meio das sociedades secretas, como os Carbonari, formadas por oficiais, intelectuais e membros da pequena burguesia. Tentativas de insurreição em 1820, 1831 e 1848 foram duramente reprimidas, mas deixaram um legado de resistência e de identidade comum.

O pensador e patriota Giuseppe Mazzini, fundador do movimento Giovine Italia (Jovem Itália), defendia uma república unificada, baseada em ideais democráticos e de soberania popular. Embora suas revoltas tenham fracassado, Mazzini influenciou gerações de nacionalistas e inspirou a dimensão moral e cultural do Risorg-ministro do Reino da Sardenha-Piemonte, preferiu seguir o caminho da diplomacia. Liberal moderado, Cavour acreditava que a unificação só seria possível sob uma monarquia constitucional e com o apoio das grandes potências europeias. Seu objetivo era construir uma Itália moderna e economicamente integrada, à imagem dos estados liberais da Europa Ocidental.

Cavour modernizou o Piemonte, investiu em ferrovias, indústrias e bancos, e fortaleceu o exército. Em 1855, enviou tropas para lutar ao lado da França e da Inglaterra na Guerra da Crimeia, o que garantiu prestígio internacional e uma posição favorável nas negociações europeias. Pouco depois, firmou uma aliança secreta com Napoleão III, imperador da França, comprometendo-se a lutar juntos contra o domínio austríaco no norte da Itália.

A Segunda Guerra da Independência (1859)

Em 1859, eclodiu a Segunda Guerra da Independência Italiana. As forças franco-piemontesas derrotaram o exército austríaco nas batalhas de Magenta e Solferino, permitindo a anexação da Lombardia ao Reino da Sardenha. O conflito, porém, terminou antes do previsto, após Napoleão III firmar um armistício com a Áustria — decisão que frustrou os nacionalistas italianos, mas não impediu o avanço da unificação.

As insurreições e a marcha de Garibaldi (1860–1861)

Enquanto o norte consolidava sua liberdade, o sul foi palco de um dos episódios mais notáveis do Risorgimento. Em 1860, o general Giuseppe Garibaldi, veterano das guerras de independência e herói popular, liderou a expedição dos Mil (I Mille) — um grupo de cerca de mil voluntários que partiu de Gênova e desembarcou na Sicília. Em poucos meses, Garibaldi derrotou o exército Bourbon e tomou o Reino das Duas Sicílias.

Demonstrando grande senso de unidade nacional, Garibaldi entregou suas conquistas ao rei Vítor Emanuel II, que em 17 de março de 1861 foi proclamado Rei da Itália. Nascia o novo Estado italiano, com capital em Turim. Pouco depois, Cavour morreria, deixando incompleta a obra que idealizara, mas abrindo caminho para a consolidação do país.

Consolidação territorial (1866–1870)

A unificação ainda não estava completa. Em 1866, a Itália aliou-se à Prússia na guerra contra a Áustria. A vitória prussiana permitiu a anexação do Vêneto, incluindo Veneza. Quatro anos mais tarde, com a retirada das tropas francesas que protegiam o Papa Pio IX, as forças italianas entraram em Roma, encerrando o poder temporal do papado. Em 20 de setembro de 1870, a cidade foi incorporada e declarada capital do Reino da Itália, selando a unificação nacional.

Correntes ideológicas do Risorgimento

O Risorgimento foi um movimento plural, atravessado por diferentes visões de nação e de Estado:

  • Monarquistas liberais: liderados por Cavour e Vítor Emanuel II, defendiam uma unificação sob a monarquia constitucional e uma economia liberal voltada ao progresso material.

  • Republicanos e democráticos: como Mazzini e Garibaldi, sonhavam com uma Itália popular, igualitária e republicana.

  • Federalistas católicos: representados por Vincenzo Gioberti e Antonio Rosmini, propunham uma confederação de estados sob a liderança moral do papa.

Essas correntes coexistiram e se enfrentaram, mas, no fim, prevaleceu a linha monárquico-liberal, apoiada pela burguesia e pelas elites do norte industrializante.

As consequências políticas, sociais e econômicas da unificação

A unificação criou um Estado moderno, mas também revelou profundas contradições internas. O novo Reino da Itálianasceu com instituições centralizadas, inspiradas no modelo piemontês, e com um sufrágio restrito, limitado a menos de 3% da população. O país herdou desigualdades regionais, dívidas de guerra e um sistema fiscal pesado.

norte, mais desenvolvido e industrializado, concentrou investimentos e poder político, enquanto o sul agrário — o antigo Reino das Duas Sicílias — mergulhou em estagnação econômica e social. Essa disparidade, conhecida como “questão meridional” (questione meridionale), tornou-se uma das feridas mais profundas da Itália moderna.

A repressão às revoltas camponesas no sul, conhecidas como brigantaggio, agravou o ressentimento popular. Muitos camponeses, desiludidos com as promessas do novo Estado, passaram a ver a Itália unida como um poder distante, mais opressor que libertador.

Além disso, a forte tributação, o serviço militar obrigatório e a falta de oportunidades levaram milhões de italianos — especialmente do sul e do nordeste — a buscar melhores condições de vida no exterior. Entre 1870 e 1915, cerca de 14 milhões de italianos emigraram, sobretudo para as Américas, dando origem ao grande êxodo italiano que marcaria a história de países como Brasil, Argentina e Estados Unidos.

Politicamente, o novo Estado enfrentou tensões entre monarquistas, republicanos e socialistas, além do conflito com a Igreja Católica, que só seria parcialmente resolvido com os Pactos de Latrão (1929). Economicamente, iniciou-se um processo de industrialização no norte e de marginalização do sul — um desequilíbrio que perduraria por gerações.

Risorgimento, portanto, não foi apenas uma epopeia patriótica de libertação. Foi também o início de uma longa e dolorosa transformação social. Uniu o território, mas dividiu a sociedade. Criou a Itália, mas deixou milhões de italianos à margem — muitos deles partindo para reconstruir suas vidas em terras distantes, levando consigo a língua, a fé e as tradições que hoje formam a herança da diáspora italiana.

Como observou o historiador Massimo D’Azeglio, participante do processo:

“Fizemos a Itália; agora precisamos fazer os italianos.”


quinta-feira, 14 de agosto de 2025

Vozes Silenciosas: A Luta das Mulheres no Passado



Vozes Silenciosas 
A Luta das Mulheres no Passado


No passado, o casamento não era uma escolha guiada pelo sentimento, mas uma necessidade prática para garantir a sobrevivência. Por muito tempo, a única forma de uma mulher conseguir um lar seguro, alimento e proteção era através do matrimônio. A ideia de que uma mulher pudesse trabalhar, ter propriedades ou direitos legais era simplesmente inimaginável.

A vida delas girava em torno da tutela masculina: primeiro protegidas pelo pai e, depois, pelo marido. Para aquelas que não se casavam, a situação era difícil. Muitas permaneciam na casa dos pais até quando era possível, e, quando isso não era viável, eram entregues a parentes com melhores condições ou enviadas para conventos — muitas vezes não por uma vocação religiosa, mas por falta de outras alternativas.

O amor não era um fator relevante nesse contexto. O casamento era uma instituição social e econômica, e raramente algo ligado aos sentimentos. Enquanto o amor era tema para poesias e histórias, na realidade, as mulheres eram preparadas para cumprir seu papel de esposas submissas e mães cuidadosas, sem espaço para opiniões ou desejos próprios.

A verdadeira transformação aconteceu apenas com a chegada da Revolução Industrial. Foi nesse período que algumas mulheres começaram a trabalhar fora de casa e a conquistar uma renda própria, alcançando um grau de independência econômica. Isso lhes permitiu, pela primeira vez, viver sem depender totalmente de um homem e até recusar casamentos arranjados.

Cada direito que as mulheres conquistaram foi fruto de batalhas silenciosas, sacrifícios pessoais e muita coragem. Conhecer essa trajetória não serve apenas para valorizar o passado, mas para fortalecer a proteção das conquistas que temos hoje.

A liberdade não é algo que recebemos de presente — é um legado que se constrói com esforço.

Nota do Autor

A história aqui apresentada é mais do que um relato de jornadas e desafios; é uma celebração do papel vital desempenhado pelas mulheres durante o período da emigração italiana. Longe dos holofotes da narrativa tradicional, essas mulheres carregaram nos ombros e no coração o peso das famílias, da terra e da cultura. Enquanto seus maridos e filhos enfrentavam os campos inóspitos e as duras condições de trabalho, as mulheres eram as guardiãs das tradições e da língua materna. Foi na cozinha, no quintal, nas canções de ninar e nas preces noturnas que a língua vêneta encontrou abrigo e continuou a ecoar, geração após geração. Elas preservaram os saberes ancestrais e costuraram com coragem e dedicação a identidade das comunidades. 
A força dessas mulheres não estava apenas em sua capacidade de suportar as dificuldades da vida cotidiana, mas em sua visão de futuro. Ao transmitir valores, histórias e costumes às crianças, moldaram o caráter das famílias e garantiram que a herança cultural vêneta permanecesse viva e vibrante, mesmo em terras tão distantes quanto o Brasil.
Esta narrativa, parte do livro Vozes Silenciosas: A Luta das Mulheres no Passado é um tributo a elas – às mães, filhas e avós – que, com mãos calejadas e corações resilientes, transformaram sacrifício em legado e desafio em história. Que suas vozes sejam sempre lembradas como fundamentais na construção da ponte entre o passado e o futuro, entre a Itália e o Novo Mundo.

Dr. Luiz C. B. Piazzetta