quinta-feira, 13 de agosto de 2020

Os Da Camino Senhores de Treviso

Os Da Camino ou Caminesi  constituíam uma família de nobres protagonista da história medieval da Marca Trevigiana. Segundo a tradição, a nobre família dos Caminesi descendem, assim como a dos Colfosco, de um ramo da família Collalto, em particular de um filho do progenitor chamado Rambaldo I, também referido como Byanzeno ou ainda Biaquino. 
Entretanto, não existe documentação conhecida que possa confirmar essa ascendência, mas, foram encontradas evidências de que realmente possa ter havido relações de parentesco muito próximas entre essas duas famílias.
Também não foi comprovada a informação que no ano de 1037, o imperador Conrado da Francônia doou o castelo de Montaner, nas encostas montanhosas de Cansiglio, a Guidone di Biaquino e a seus filhos Alberto e Guecello. É verdade que naquele ano o imperador Corrado estava na Itália para emitir a "Constitutio de feudis", documento em que reformulou o direito feudal em favor dos pequenos vassalos. 

Stemma dei Da Camino

Por um período, portanto, a família ficou conhecida com o sobrenome de "da Montanara". Em 3 de maio de 1089, os irmãos Alberto e Guecello obtiveram o feudo de Camino, do bispo e conde 
Aimone, de Ceneda, onde acabaram se estabelecendo. 
Não se sabe por que os dois irmãos preferiram deixar o castelo Montaner, em Cansiglio, mas, certamente Camino esta localizado em uma posição mais estratégica sob vários pontos de vista: como estar situado em um ponto equidistante dos pré-Alpes, dos rios Piave e Livenza, desfrutando também do trânsito fluvial do Postumia e sobretudo do Monticano, vias navegáveis de importância na época. 
Também o novo feudo de Camino se localizava às portas de Oderzo que, embora em origem uma antiga cidade romana, na época já estava em declínio, mas que ainda mantinha uma certa importância defensiva como centro fortificado sob a jurisdição do bispo de Belluno.
Por mais algumas décadas a família ainda manteve o sobrenome "Da Montanara", para em seguida adotarem e serem conhecidos como "Da Camino". 

Piazza dei Signori e Palazzo dei Trecento em Treviso

Foi durante o curso do século XII que a família da Montanara-da Camino, especialmente devido aos seus vínculos com membros das hierarquias eclesiásticas e a também de uma eficaz estratégia de casamentos, ascendeu rapidamente no panorama político do nordeste italiano, tornando-se uma das famílias mais importantes da região. 
Na segunda metade deste mesmo século, a família já governava vários feudos, os quais se estendiam nas áreas do Cenedese, Bellunese e Cadore.
A primeira aquisição territorial importante foi precisamente aquela de Cadore e Comelico, ocorrida em 1135, do patriarca de Aquileia Pellegrino di Ortenburg. A presença dos Da Camino na região continuará ininterruptamente até 1335.
A fortuna da família, porém, deveu-se mais ao casamento entre Guecellone II e Sofia di Colfosco, ocorrido em 1154, Ela era filha de Valfredo e Adeleita da Porcia, herdeira dos condados de Zumelle e Ceneda. Em 1155 os cônjuges também receberam o castelo de Pieve di Cadore como feudo e em 1160 algumas outras propriedades na mesma área. Em 1162 Sofia recebeu de seu tio Guido Maltraversi o castelo de Serravalle, que mais tarde se tornou uma das residências mais importantes da família.
Figura de personalidade forte (e por isso muito romantizada), Sofia participou ativamente das guerras dos municípios italianos contra os interesses do Imperador Frederico Barbarossa, e essa sua postura foi a base da subsequente adesão dos Caminesi ao partido Guelfo. 
Por outro lado, a atitude política do marido parece que era mais ambígua, talvez para garantir o domínio sobre Conegliano e Ceneda, em contraste com o município de Treviso.
Após um curto período de declínio durante o qual o Município de Treviso conseguiu submeter a família na condição de cidadãos, entre os anos de 1183 e 1199, os Da Camino passaram então a ter um maior poder na capital da Marca, retomando a política Guelfo de Sofia Da Camino (também relatada como Sofia di Colfosco) e logo se tornaram os principais apoiadores das facção Guelfo (ou seja a dos apoiadores e aliados do Papa) contra os Gibelinos (que eram pró dominação do império) liderados pela poderosa família dos Da Romano.
Durante a longa luta com esta família, os Da Camino conseguiram levar vantagem em duas ocasiões, mantendo  assim, o predomínio na cidade (depois de 1235 e em 1239). 
Na segunda oportunidade tiveram como aliado Alberico da Romano, o qual estava temporariamente afastado do partido imperial, o qual logo conseguiu se afirmar como o senhor da cidade, usurpando o poder dos aliados Caminesi e liderar a cidade com uma política Gibelina.
Mas no final foram os Guelfo que venceram, com os Da Romano sendo derrotados em 1260. Os próprios Guelfo mais tarde reuniram-se em torno de Gherardo Da Camino para derrotar o revivido partido Gibelino, então liderado pela família Castelli, nomeando Da Camino o senhor absoluto da cidade, no ano de 1283, quando então teve início o domínio dos Da Camino sobre Treviso.
Gherardo tentou imediatamente, e com sucesso, consolidar o seu poder, cancelando definitivamente o partido Gibelino e todas as outras formas de oposição. Tentou também, com resultados nem sempre favoráveis, expandir o seu domínio no Friuli, colidindo várias vezes com os interesses do Patriarca de Aquileia. Conseguiu melhores resultados com diplomacia, fazendo a paz e mantendo boas relações com os municípios circundantes e com os senhores vizinhos, forjando novas alianças que eram reforçadas com casamentos de seus filhos, tornando-se assim um árbitro da paz na Marca e até mais além.
Ele então apóia o partido Guelfo sem causar uma revolta civil e hospeda em seu palácio, cujos vestígios ainda são visíveis no atual Convento dos Servos da Ordem de Maria e na antiga Igreja de Santa Caterina, muitos cientistas e escritores famosos, inclusive Dante, o qual lhe dirigiu elogios nas suas obras Divina Comédia e no Convivio.
No Município de Treviso era então o senhor absoluto e o administrou ao seu prazer a justiça e as contas públicas da cidade, mas, para reforçar a sua posição ainda mantinha excelentes relações com os nobres cidadãos e com o povo, como demonstra o seu interesse pela prosperidade pública e cultura, em particular para com o projeto da futura Universidade. Mantinha também estreitas relações com a Igreja, financiando as instituições religiosas da cidade.
Assim Gherardo consegue governar até sua morte, garantindo a sucessão pacífica de seu filho Rizzardo II. 

Monumento funerário de Rizzardo III Da Camino
Igreja de Santa Giustina em Vittorio Veneto 1335

Rizzardo II já havia mostrado várias vezes a sua arrogância e ambição as quais, mais tarde, o levaram a agir impulsivamente na guerra e na política: uma revolta popular obrigou-o a abandonar Udine, logo após a sua nomeação para senhor de Friuli em1309. Também não mantinha boas relações com Veneza. Mais tarde conseguiu obter de Henrique VII, o Vicariato Imperial, traindo assim a política secular da família, que sempre tinha sido Guelfo, atitude esta que levará à sua morte em 1312, após uma conspiração.
Seu irmão Guecellone então tomará seu lugar, mas, após cometer os mesmos erros de seu irmão, foi forçado, depois de alguns meses, a fugir da cidade, pondo fim a Senhoria dos Da Camino.
Já comprometida e em declínio a família Da Camino perdeu, após vinte anos, a maior parte de seus bens para a República de Veneza, ansiosa por expandir-se em terra firme. 
Os Da Camino que sobraram foram agregados na nobreza veneziana e continuaram a ter um papel secundário nos acontecimentos políticos da Marca até o ano de 1422, quando também foram extintos com a morte de Hércules II.
Os restantes membros continuarão a viver sem participar dos acontecimentos políticos: depois de um parêntesis na Alemanha, os sobreviventes irão instalar-se em Cordignano (cerca de 1604), no final do século XVIII também em Trieste (onde Francesco Saverio Da Camino será referido como médico, cientista e patriota) e Torino. 


Depois de terem sido roubados pelos austríacos dos últimos bens que ainda sobraram, alguns descendentes dos Da Camino emigraram para o Brasil em busca de melhor sorte. Atualmente, o último membro da família Da Camino que vivia na Itália era Verde, filha de Gherardo IX Maria. Outros descendentes que emigraram para o Brasil moravam em Porto Alegre.