Le mondine
Até quase o final da década de 1950, antes da mecanização das lavouras, os arrozais da baixa Lombardia e do Piemonte, especialmente nos municípios de Vercelli e Nogara, mas também na região do Veneto, nas zonas banhadas pelo rio Pó, tais como aquelas das províncias de Rovigo e Verona, todos os anos, no mês de Maio, recebiam milhares de mulheres trabalhadoras sazonais, a maioria delas proveniente de locais distantes, para fazer o chamado "mondariso" que era a limpeza e o plantio do arroz.
Tinham elas idades compreendidas entre 14 e 70 anos, a maioria solteiras, mas, também muitas casadas. Também eram empregados nesse trabalho muitos homens, mas em proporção muito menor. Se tratava de um trabalho quase que exclusivamente feminino por duas razões: a mulher é mais atenta e minuciosa nos trabalhos e, principalmente, pelo fato que o pagamento para o trabalho feminino era sempre muito menor do que para os homens.
As mondine controladas de perto pelo feitor
Nos municípios vizinhos dessas regiões eram criadas listas de pessoas, geralmente mulheres, dispostas a ir trabalhar no plantio e limpeza do arroz.
Os representantes dos estabelecimentos agrícolas escolhiam aquelas com maior experiência, especialmente, as jovens e portanto mais fortes, e somente algumas com mais idade, casadas, que serviam como moderadoras para por um freio nas mais novas.
Essas trabalhadoras saíam todos os anos no mês de Maio e ficavam morando temporariamente nos locais das plantações, por um período em torno de 30 a 40 dias, dependendo do tamanho de cada propriedade.
As mondine no filme Riso Amaro
Para aquelas jovens que partiam pela primeira vez para trabalhar como "mondine", as suas mães ou conhecidas, que já haviam experimentado esse trabalho, as aconselhavam levar um pequeno móvel de madeira, uma espécie de baú, com alças laterais e tampa com um pequeno cadeado. Nele amontoavam todas as roupas consideradas necessárias para o trabalho e para algum momento especial como a missa ou uma saída para divertimento. Também levavam alguns alimentos não perecíveis que eram utilizados durante todo o período de permanência.
Para as garotas mais jovens era a oportunidade de sair de casa e descobrir um mundo novo, pois, muitas delas nunca tinham se afastado de suas casas ou no máximo só conheciam o movimento da feira mercado semanal da sua vila. Aquelas em idade de casar pensavam em poder encontrar o seu príncipe encantado, longe dos mesmos rapazes do lugar ou daqueles das vilas vizinhas.
Mondine dentro do arrozal
O dia da partida era quase sempre em um sábado, bem cedo da manhã, para assim quando chegassem dar tempo de se habituarem um pouco com o novo lugar e poderem estar prontas para o trabalho na segunda feira seguinte. Geralmente se encontravam frente alguma escola ou igreja. Os baús eram carregados sobre um caminhão e partiam todas na carroceria aberta para outras vilas, recolhendo novas companheiras de empreitada.
A viagem podia durar de 4 a 5 horas e, no trajeto, as mais experientes cantavam, contavam casos e anedotas distraindo assim aquelas que com um nó na garganta estavam saindo pela primeira vez da casa paterna.
Ao chegarem ao destino logo se apercebiam que a realidade era muito diferente da expectativa. A primeira coisa que sentiam era um sentimento de isolamento, pois, muitas fazendas de arroz ficavam muito longe de centros habitados.
O que as aguardava era um celeiro vazio que serviria de casa por toda a duração do plantio. Para dormir tinham improvisadas camas de ferro com um colchão que nada mais era que um saco de pano grosso cheio palha, o qual era forrado com os lençóis que haviam levado de casa. Ao lado desse leito cada uma colocava o seu pequeno baú com os seus pertences. Nos primeiros tempos essas trabalhadoras não recebiam camas para dormir e a palha solta era ajeitada sobre a terra nua.
O que viam entorno ao galpão era a casa do patrão, geralmente muito grande e arrumada com um grande pórtico na sua frente. Ele e a família frequentemente moravam na cidade e só vinham algumas vezes ao ano até a fazenda para controlar as atividades nas épocas de plantio ou colheita. Ao lado, um pouco distante da casa, ficavam os estábulos para os diversos animais criados na fazenda. Mais distante estavam as casas dos empregados assalariados da propriedade moravam com as suas famílias que. Nos domingos em que havia missa, podiam ir até lá e confraternizar com os funcionários e moradores da fazenda.
Le mondine no trabalho
A jornada de trabalho das trabalhadoras iniciava com o despertar as 5,30 da manhã quando então era servido um café com leite para todas elas. As 7 horas em ponto já deviam estar no arrozal, com água até a metade das pernas. Durante a jornada de trabalho, já na metade da manhã, por quinze minutos, era servido uma merenda que consistia de pão, queijo e um pouco de marmelada. Para matar a sede era servido água para as trabalhadoras.
Ao meio dia o trabalho era interrompido e se dirigiam ao refeitório improvisado no galpão onde moravam. O almoço quase sempre consistia de arroz e feijão, preparados pela cozinheira do grupo. O descanso durava até as duas horas quando deviam estar novamente no arrozal para iniciar ao período mais difícil do dia devido o cansaço do trabalho da manhã e do sufocante calor úmido que desprendia do arrozal.
No início da noite o trabalho era encerrado, quando elas aproveitavam para se lavar e estender as roupas molhadas para enxugar, pois, deviam ser usadas novamente no dia seguinte. O jantar servido era quase sempre o mesmo arroz e feijão. Depois de um breve recreio que aproveitavam para cantar ou contar casos, sempre perseguidas pelos enxames de mosquitos que eram abundantes nos arrozais. As dez horas se recolhiam em suas camas para o merecido repouso.
Os domingos eram dedicados para o trato pessoal, lavagem das roupas e do local onde dormiam. Depois do banho vestiam a melhores roupas e saiam para a missa. Após o almoço, naqueles locais em que havia alguma cidadezinha próxima, andavam até lá em grupos, buscando por algum divertimento, muitas vezes até podiam encontrar a possibilidade de dançar. No fim da tarde retornavam ao paiol em que estavam alojadas e se dedicavam a passar a ferro as roupas que tinham lavado pela manhã.
Depois de 30/35 dias de trabalho duro chegava o momento de retornar para casa. No último dia preparavam os seus baús, recebiam o pagamento em dinheiro, um pequeno saco de arroz e ficavam esperando pelo caminhão que as levaria para suas casas. Esse retorno era muito festivo e as moças cantavam alegremente durante todo o trajeto.
Dr. Luiz Carlos B. Piazzetta
Erechim RS