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sexta-feira, 20 de junho de 2025

Uma Jornada Sem Fim

 

Uma Jornada Sem Fim


No amanhecer de uma manhã fria e enevoada, a pequena vila de San Pietro di Livenza parecia tão calma quanto sempre, mas para Giuseppe Zilotto e sua família, aquele dia marcava o início de uma jornada que mudaria suas vidas para sempre. Era o outono de 1876, e Giuseppe, um homem robusto com as mãos calejadas pelo trabalho árduo na terra estéril, sabia que não havia mais como sustentar sua família naquele lugar.

Ao seu lado estava Maria, sua esposa, cujos olhos, embora marcados pelo cansaço, ainda refletiam uma centelha de esperança. Com seus três filhos pequenos – Matteo, de oito anos; Luca, de cinco; e o bebê Vittorio, de apenas dez meses – eles se preparavam para deixar tudo para trás e embarcar rumo ao desconhecido Brasil. A vila inteira se reuniu para se despedir, oferecendo pequenos presentes para a longa viagem, como pães, ervas medicinais e até um medalhão de Santo Antônio, além de lágrimas e orações silenciosas. 

O caminho desde a estação ferroviária até o porto de Gênova foi longo e cansativo, devido às inúmeras paradas em diversas estações pelo caminho, ocasião em que embarcavam dezenas de outros emigrantes como eles. O trem carregado corria lento pelos trilhos e as crianças, especialmente o pequeno Vittorio, pareciam definhar com a exaustão.

Quando finalmente chegaram ao porto, a visão do enorme vapor Savoie foi tanto uma promessa de esperança quanto uma ameaça de perigos desconhecidos. A bordo do navio, as condições eram insalubres. Homens, mulheres e crianças amontoavam-se em espaços apertados, com pouca ventilação e comida escassa. A água potável frequentemente se misturava com impurezas, e as noites eram preenchidas com o som de orações, choros e tosse – especialmente de Luca, que começou a demonstrar sinais de fraqueza. Apesar de todo o cuidado de Maria, as más condições agravaram sua saúde, e a febre logo se tornou uma companheira constante.

Após quase 40 dias no mar, o navio chegou ao porto do Rio de Janeiro no início de 1877. O desembarque trouxe alívio, mas também novos desafios. A família ainda precisaria enfrentar uma segunda jornada em uma caravana até Santa Catarina, e os riscos das doenças e da fadiga estavam sempre presentes. Quando finalmente chegaram ao lote designado para eles, a visão da terra foi um choque. Prometida como fértil e abundante, era na verdade um matagal denso e inóspito. Giuseppe, com determinação feroz, começou a desbravar o terreno com a ajuda de Matteo, enquanto Maria cuidava das crianças e tentava adaptar-se ao ambiente hostil.

A tragédia atingiu a família poucos meses após a chegada. Luca, debilitado pela longa viagem e pelas condições adversas, adoeceu gravemente. Sem médicos ou recursos, Maria e Giuseppe fizeram tudo o que podiam, utilizando ervas e compressas ensinadas por vizinhos mais experientes, mas seus esforços foram em vão. Luca faleceu numa tarde silenciosa, no verão de 1877, e a dor de sua perda foi como uma faca atravessando o coração da família. O pequeno grupo de vizinhos imigrantes, alguns deles já estabelecidos na região, organizou um funeral simples. Sob um velho cedro, próximo ao cemitério improvisado, Giuseppe cavou a sepultura. Maria, com o pequeno rosário nas mãos, murmurava orações entre lágrimas. A perda de Luca marcou a família profundamente, mas também fortaleceu sua determinação de sobreviver e honrar sua memória.

Os meses seguintes foram repletos de desafios. Giuseppe e Matteo trabalharam incansavelmente para limpar a terra e plantar as primeiras sementes. Após muitos esforços, a primeira colheita foi modesta, mas trouxe um senso de realização e esperança renovada. Maria buscou formas de melhorar a vida da família, aprendendo com os vizinhos novas receitas com ingredientes locais, muitos deles desconhecidos e a utilizar ervas medicinais para tratar pequenas enfermidades.

Mesmo diante das dificuldades, ela sempre encontrava tempo para contar histórias da Itália aos filhos, incentivando-os a sonhar com um futuro melhor. No início de 1878, Maria descobriu que estava grávida novamente. A notícia trouxe sentimentos mistos, com o medo de novas perdas, mas também a esperança de um recomeço.

Em julho de 1878, durante uma forte tempestade, nasceu um menino, que recebeu o nome de Carlo Vittorio, em homenagem ao irmão perdido e à força que sustentava a família. Carlo Vittorio trouxe alegria e tornou-se um símbolo de resiliência.

Sob o velho cedro, Maria frequentemente rezava, lembrando-se de Luca e encontrando forças em sua memória. A terra, antes hostil, começou a mostrar sua generosidade, e a casa simples tornou-se um lar acolhedor. Os anos seguintes foram de trabalho árduo e conquistas. A família Zilotto, apesar de todas as adversidades, construiu uma vida digna, transformando sofrimento em força e saudade em esperança. A história deles tornou-se um testemunho da força humana diante das dificuldades, uma jornada que começou com dor e incerteza, mas que se transformou em uma celebração da vida e da superação.

A jornada dos Zilotto foi mais do que uma travessia oceânica; foi um ato de coragem que plantou os alicerces de um novo futuro. Ao cruzarem o Atlântico, deixaram para trás não apenas uma terra empobrecida, mas também uma identidade que logo se fundiria com o vigor do Brasil. Carlo e Maria talvez nunca tenham imaginado que seu esforço criaria raízes tão profundas. O que começou como uma luta pela sobrevivência se transformou em uma história de superação e resiliência, passada de geração em geração.

Hoje, muitos descendentes dos Zilotto retornam à Itália, não como imigrantes em busca de refúgio, mas como viajantes em busca de suas origens. Em Treviso, pequenos vilarejos ainda reconhecem os sobrenomes que desapareceram há mais de um século. Os viajantes são recebidos com curiosidade e hospitalidade, como se a volta completasse um ciclo iniciado por Carlo e Maria.

As marcas dessa jornada também estão nos detalhes cotidianos da vida brasileira. A tradição de plantar vinhedos, passada por Carlo a seus filhos, floresceu em algumas das melhores vinícolas do país. A dedicação de Maria à comunidade se reflete em descendentes que hoje são médicos, professores e líderes locais. Em cada pequeno gesto – uma prece antes da refeição, uma receita de família transmitida com carinho, um abraço caloroso – vive a essência dos Zilotto.

Essa saga, rica em detalhes e profundidade, ensina que, mesmo nas circunstâncias mais adversas, a fé, o trabalho duro e o amor pela família podem superar qualquer obstáculo. A medalha e o terço são mais do que relíquias: são símbolos de uma força que atravessou gerações, lembrando a todos que a coragem dos que vieram antes é a base sólida sobre a qual o presente se ergue.


Nota do Autor

A história que você tem em mãos é mais do que uma narrativa de coragem e superação. É um tributo àqueles que atravessaram mares, deixaram para trás tudo o que conheciam e enfrentaram o desconhecido com esperança no coração. Uma Jornada Sem Fim nasceu do desejo de resgatar e honrar a memória de milhares de imigrantes italianos que ajudaram a moldar a identidade cultural e econômica do Brasil.

Giuseppe Zilotto e sua família são fictícios mas representam tantos outros que, como eles, plantaram raízes em terras estrangeiras. A cada página, procurei dar voz às suas dores, aos seus sacrifícios e, principalmente, aos seus sonhos. Essa obra é, acima de tudo, uma celebração da força humana diante das adversidades e da capacidade de transformar dificuldades em um legado que atravessa gerações.

É importante mencionar que o que está apresentado aqui é apenas um resumo da obra completa. Nas páginas do livro, mergulho mais profundamente nas vivências de Giuseppe, nos detalhes históricos e emocionais que deram forma a essa saga. Espero que este resumo desperte em você a curiosidade e a emoção para explorar a obra em sua totalidade, onde cada capítulo traz nuances ainda mais intensas e cativantes.

Com imensa gratidão,


Dr. Piazzetta




segunda-feira, 24 de março de 2025

A Jornada de Emigrantes Italianos na California


 

A Jornada de Emigrantes Italianos na California

No ano de 1882, em Villetta, uma pequena localidade de Val Chiavenna, uma criança chamada Rosalia Rosini veio ao mundo. Sua vida, repleta de desafios e aventuras, seria profundamente influenciada pelas experiências da emigração italiana. Seu pai, Giovanni Rosini, movido pela busca por uma vida melhor, deixou sua terra natal nos anos 1870, embarcando em uma jornada rumo à Argentina, em direção a uma remota área rural da província de Cordoba.
A história da família Rosini já estava marcada pela tragédia desde o início. O tio de Isabella, Antonio, encontrou seu destino trágico em Milão antes mesmo de embarcar para se reunir com seu irmão na Argentina. Giovanni retornou à Itália em 1873 e, com o passar dos anos, construiu uma família que incluía cinco filhos: Enrico, Antonio, Isabella, Maria e Marco. À medida que esses filhos atingiram a maioridade, quatro deles tomaram a decisão corajosa de buscar oportunidades no exterior, deixando Marco como o único filho a permanecer na terra natal.
Enrico foi o primeiro a partir, em 1907, com destino à Califórnia. Antonio seguiu o mesmo caminho em 1912, e, finalmente, em 1914, Isabella decidiu deixar Val Chiavenna para trás. Ela embarcou em Le Havre no navio  Clementina em 9 de fevereiro de 1914. Na imigração, Isabella declarou ser dona de casa e afirmou que estava indo encontrar seu marido, Giuseppe Ferrareze, mas essa era uma mentira. Isabella já era casada, e seu verdadeiro marido, Marco Lombardi, permanecera em casa com seus dois filhos, Giulia e Lorenzo.
Assim como muitas mulheres que chegavam a Ellis Island sem seus maridos, Isabella foi retida na imigração por alguns dias. Finalmente, quando Giuseppe Ferrareze se apresentou, na verdade seu cunhado, Isabella foi admitida nos Estados Unidos. Ela estabeleceu residência em Elmwood, na Califórnia, onde logo adoeceu de malária. No entanto, com o tempo, sua saúde melhorou, e ela se sentiu mais confortável entre seus compatriotas na área, incluindo seu irmão.
Em 1915, a última irmã, Maria, e a filha de Isabella, Giulia, uniram-se a ela nos Estados Unidos. A família estava finalmente reunida, mas novos desafios surgiriam. Em 1917, Isabella enfrentou problemas de saúde graves e passou vários meses hospitalizada, chegando a entrar em coma por um longo período. Foi nesse momento que ela conheceu um italo-americano chamado Salvatore Rossi, com quem se casou após alguns meses, enfrentando desaprovação da família.
Em 1919, possivelmente devido à epidemia da "gripe espanhola", o segundo filho de Isabella, Lorenzo, faleceu. Ela recebeu ajuda financeira e apoio da cunhada durante esse período difícil.
Os anos seguintes foram uma mistura de trabalho e doença para Isabella. Em 1933, ela já estava bem recuperada e administrando seu próprio negócio, uma loja com uma bomba de gasolina. Com os lucros, ela construiu cinco casas para alugar e continuou a trabalhar como agricultora nos momentos livres.
As últimas décadas de vida de Isabella foram marcadas por uma Califórnia rural, ainda abalada pela Grande Depressão de 1929. Isabella nunca retornou à Itália, e a data de sua morte permanece desconhecida. Sua vida foi uma jornada de coragem, sacrifício e superação em terras estrangeiras, representando a luta e a resiliência dos imigrantes italianos nos Estados Unidos.