O quarto núcleo de imigrantes italianos assentados no estado do Rio Grande do Sul, foi no centro do estado, próximo a cidade de Santa Maria. Esta nova colônia italiana, que levou o nome de Silveira Martins, ficou mais conhecida como a 4ª Colônia Imperial, devido a ordem cronológica de sua fundação, pois ela se seguiu as outras três primeiras: Caxias, Conde D'Eu e Dona Isabel na Serra Gaúcha.
Iniciada a colonização de Silveira Martins no início de
A Colônia estava dividida em 716 lotes de terra com 22 hectares cada. Inicialmente a colônia foi nomeada de “Colônia de Santa Maria da Boca do Monte” e em 21 de setembro de 1878 teve seu nome alterado para “Colônia Silveira Martins”, em homenagem a Gaspar Silveira Martins, Ministro da Fazenda naquele ano.
Dela faziam parte, segundo o antigo vice-cônsul
A maioria deles era formada por pequenos agricultores, arrendatários e trabalhadores braçais diaristas que trabalhavam para vários patrões na Itália, os quais vieram ao Brasil para comprar e trabalhar no seu próprio lote de terra.
Os imigrantes italianos, que se dirigiram ao Rio Grande do Sul, em sua maioria, almejavam abandonar seus patrões na Itália para se tornarem autônomos no Brasil, passando da condição de servos de patrões e da família para a condição de senhores de seu destino. Os imigrantes italianos eram mais apegados à família e a seu lote de terra do que a Itália ou ao Brasil, não se envolvendo diretamente com questões políticas da Colônia e da Província de São Pedro do Rio Grande do Sul.
Quem se ocupasse de questões políticas ou públicas não era bem-visto pelos imigrantes, assim como quem estudasse, pois consideravam que as atividades políticas e educacionais afastavam as pessoas do trabalho. Quem trabalhasse com a terra era considerado honesto e digno de respeito, ao contrário, quem estudasse, fosse político ou trabalhasse no comércio era considerado preguiçoso ou desonesto. As únicas atividades públicas aceitas e valorizadas, desde que realizadas apenas nos finais de semana, eram as orações e o trabalho comunitário dedicado à manutenção da capela, do salão de festas e do cemitério.
A fundação e o loteamento da Colônia foram idealizados e organizados pelo Estado do Rio Grande do Sul, o qual administrou a logística dos imigrantes fornecendo ferramentas aos mesmos para abrirem estradas, derrubarem a mata e construírem os primeiros barracões de madeira, porém, no início, a política local, a organização social e a educação dos imigrantes e seus filhos foram levadas a cabo pela Igreja Católica através dos institutos religiosos das Irmãs do Imaculado Coração de Maria que fundaram a Escola Nossa Senhora de Lourdes em 25 de julho de 1882 na localidade de Vale Vêneto e pelos Padres e Irmãos Palotinos que chegaram em 29 de julho de 1886 na mesma localidade.
A falta de interesse dos imigrantes pela política local e de representantes dos próprios imigrantes, impediu que a Colônia obtivesse autonomia econômica e política logo no início da colonização. Os imigrantes italianos se identificavam mais com a Igreja Católica do que com a Itália ou o Brasil, porque na Itália, quando saíram, ainda não havia o sentimento de italianidade e no Brasil ainda não haviam se integrado aos nacionais. Eles eram católicos antes de serem italianos – dado que a Itália ainda era um Estado-Nação criado há pouco tempo e se identificava com o liberalismo e o anticlericalismo. Para esses camponeses, a Igreja era a instituição que normatizava as suas vidas, tanto no plano social quanto individual.
A emigração italiana para o Rio Grande do Sul teve como característica principal ser familiar e composta por até 3 gerações, pois emigravam com toda a família formada por avós, pais, filhos, netos, tios, sobrinhos e primos e com outras famílias da mesmo comune de origem. Como os imigrantes não estavam mais na Itália, e ainda não se identificavam como brasileiros, desenvolveram uma comunidade baseada na família, na Sociedade da Capela, no trabalho rural e na religiosidade católica. Assim, os imigrantes italianos vieram com toda a família para os estados do Sul do Brasil e se instalaram em pequenas propriedades rurais, onde desenvolveram uma agricultura familiar de subsistência.
A grande maioria dos imigrantes italianos, que vieram do Norte da Itália para o Rio Grande do Sul, a partir de 1875, era formada por agricultores, dos quais, noventa e cinco por cento deles foram trabalhar nos lotes de terra coloniais. A característica essencial da imigração italiana no sul do Brasil foi seu destino profissional praticamente unívoco, embora não faltassem indivíduos que, não tendo direito à terra, exerciam atividades artesanais, 95% deles se dedicavam à agricultura.
A política local da Colônia de Silveira Martins era dirigida pela Igreja Católica e pela Maçonaria, os quais disputavam o controle político e econômico sobre os imigrantes italianos, a produção agrícola e o comércio local. No entanto, os imigrantes faziam política de modo indireto: quando o Estado e a Igreja queriam impor suas condições aos colonos, os mesmos reagiam com lutas e resistências às decisões impostas pelas autoridades locais que atingiam diretamente o destino de suas vidas em seus lotes rurais e Sociedades da Capela.
Na Colônia de Silveira Martins a maioria dos imigrantes era de pequenos agricultores católicos, e as lideranças locais eram constituídas por comerciantes e industriais, sendo que muitos deles também eram maçons. Por isso também haviam rivalidades entre os católicos e os carbonários adeptos de Garibaldi: os católicos ultramontanos eram favoráveis à soberania do Papa sobre os poderes políticos e religiosos e os carbonários eram partidários da unificação da Itália. Os imigrantes italianos não formavam um grupo coeso, pois haviam três grupos politicamente antagônicos: os “austríacos” que defendiam o domínio da Áustria sobre a Itália; os “carbonários” que defendiam a unificação do país e os “católicos” que desejavam a manutenção do domínio papal sobre os Estados Romanos. A Carbonaria surgiu em Nápoles, fundada por Joaquim Murat (1767-1815), que, mesmo sendo cunhado de Napoleão Bonaparte, lutava contra a espoliação francesa sobre o território italiano. As reuniões entre seus membros se davam em cabanas de carvoeiros daí a origem do nome, e os carbonari utilizavam uma escrita codificada para se corresponder entre si. Seus quadros saíam das camadas burguesas da sociedade, sendo universitários e intelectuais (a chamada inteligência), cuja direção de combate se aproximava daquela da maçonaria, ou seja, opor-se à intolerância religiosa, ao absolutismo, defendendo os ideais liberais. O objetivo do movimento era claro, o de conquistar a unidade política da península italiana.O Movimento Ultramontano surgiu na primeira metade do século XIX como uma resposta da Igreja Católica ao avanço das forças liberais e estavam dispostos à restaurar a ordem socio política tradicional. Frente ao liberalismo e ao iluminismo, a Cúria Romana tornou-se defensora da ordem, da hierarquia, do conservadorismo e do autoritarismo.
A religião católica e as práticas de trabalho trazidas da Itália para o Brasil foram os principais valores que formaram a identidade e a cultura dos imigrantes italianos na Colônia de Silveira Martins, contudo, essas práticas não foram simples transposições de costumes da Itália para o Brasil, mas o surgimento de uma nova identidade local, influenciada pelo novo espaço geográfico e pelo decorrer do tempo.
Os imigrantes italianos da Colônia de Silveira Martins desenvolveram uma italianidade própria baseada na família, na propriedade da terra, no trabalho braçal e na religião católica que se diferenciou das práticas dos conterrâneos que permaneceram na Itália, pois seus costumes foram transformados pelos deslocamentos, pelo tempo e pela assimilação das práticas dos nacionais. Desse modo, os imigrantes italianos constituíram uma identidade ítalo-brasileira que, mesclada com a cultura de outros imigrantes e dos nacionais, consolidou novos usos e costumes no campo da cultura, do trabalho e da educação. A cultura de origem orienta o modo de vida das pessoas inseridas em uma nova sociedade, mas sua influência não é imune a transformações.
Para o imigrante italiano a posse da terra, mais do que uma emancipação econômica, significou o direito à liberdade individual e familiar, transformando o imigrante de empregado explorado na Itália em patrão livre no Brasil. O desejo de autonomia dos imigrantes pode ser percebido na compra de seus lotes, na construção de suas capelas e na reivindicação de sacerdotes, pois acreditavam que a religião também era necessária para o bom andamento do trabalho. O acesso à propriedade e ao trabalho permitiram que os imigrantes resistissem às determinações do Estado e da Igreja para defender seus interesses.
Portanto, da análise dos deslocamentos, da ocupação dos espaços e dos conflitos neles surgidos é possível concluir que na Colônia não existiu um único centro de poder, mas vários, pois todos os sujeitos históricos exerceram algum tipo de influência sobre as autoridades e os integrantes do grupo a que pertenciam.
Com a chegada de novas levas de imigrantes a colônia cresceu rapidamente, formando novos núcleos coloniais no seu entorno, entre os quais Vale Vêneto, Vale Veronese, Nova Palma, Norte, Nova Treviso e Dona Francisca, situados nos municípios de Santa Maria, Júlio de Castilhos e Cachoeira, além de Arroio Grande, na baixada, à margem da Estrada de Ferro.
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