“Os mais fracos, os mais medrosos, não emigram, não navegam nos mares, deixando para trás a pátria e a família, mas, em geral, aqueles para quem a vida é uma batalha e a alma é forte o suficiente para lutar mesmo em condições mais difíceis”.
Espaço destinado aos temas referentes principalmente ao Vêneto e a sua grande emigração. Iniciada no final do século XIX até a metade do século XX, este movimento durou quase cem anos e envolveu milhões de homens, mulheres e crianças que, naquele período difícil para toda a Itália, precisaram abandonar suas casas, seus familiares, seus amigos e a sua terra natal em busca de uma vida melhor em lugares desconhecidos do outro lado oceano. Contato com o autor luizcpiazzetta@gmail.com
“Os mais fracos, os mais medrosos, não emigram, não navegam nos mares, deixando para trás a pátria e a família, mas, em geral, aqueles para quem a vida é uma batalha e a alma é forte o suficiente para lutar mesmo em condições mais difíceis”.
Desde o descobrimento do Brasil, inúmeros italianos vieram ao país, embora inicialmente de forma isolada, sem caracterizar uma tendência migratória significativa. Esses casos isolados, em sua maioria, eram de homens que se transferiam sozinhos. Somente a partir de 1870, a emigração em massa de italianos para o Brasil começou a se consolidar.
Esse verdadeiro êxodo foi motivado por profundas transformações socioeconômicas, especialmente no norte da Itália, que prejudicaram gravemente pequenos proprietários de terras e agricultores sem terras, que trabalhavam como meeiros ou diaristas. Essas mudanças ocorreram após a unificação da Itália, em um período em que o país enfrentava uma economia exaurida e uma agricultura atrasada, ainda baseada em moldes feudais de mais de um século atrás.
Naquele momento, a Itália era um país predominantemente agrário, e a industrialização dava seus primeiros passos, restrita a algumas regiões específicas. A melhoria nas condições sanitárias e o avanço da industrialização na Europa provocaram um crescimento populacional acelerado, intensificando o desemprego no campo e agravando os problemas sociais.
O século XIX foi marcado por grandes movimentos migratórios. Milhões de europeus deixaram seus países, muitos rumando para as Américas ou para nações europeias mais desenvolvidas, como Alemanha, França e Bélgica. Entre 1870 e 1970, estima-se que cerca de 28 milhões de italianos emigraram, forçados pelas dificuldades econômicas e sociais.
A transição de um modelo feudal para um sistema capitalista trouxe novos desafios, como o aumento do desemprego. O Vêneto, de onde partiram muitos dos primeiros emigrantes italianos para o Brasil, enfrentava condições particularmente difíceis. Após a queda da rica República de Veneza em 1787, anos de domínio austríaco e a incorporação à Itália em 1866, a região chegou ao século XIX empobrecida e humilhada.
A fome atingiu fortemente os lares vênetos, sobretudo nas regiões montanhosas, onde a agricultura era apenas de subsistência. A polenta, feita de farinha de milho, tornou-se o único alimento disponível para as classes rurais mais pobres, enquanto carne e pão branco eram inacessíveis devido aos altos preços e impostos. O consumo quase exclusivo de polenta levou a uma epidemia de pelagra, uma doença debilitante que agravou ainda mais a situação dessas populações.
Nesse cenário de desespero, a emigração despontou como a única esperança para milhares de vênetos, que passaram a enxergar o Império do Brasil como uma "terra prometida". Essa realidade se repetiu em outras regiões da Itália e em vários países europeus, igualmente assolados pela fome e pela miséria.
Os países das Américas, em franco crescimento, tornaram-se destinos sonhados por milhões de europeus, atraídos pela possibilidade de possuírem a terra que trabalhavam. O Brasil destacou-se nesse contexto, atraindo grande número de italianos entre 1870 e 1902, período em que a imigração italiana alcançou dimensões massivas, impactando decisivamente o crescimento populacional do país.
Entre 1880 e 1924, mais de 3,6 milhões de imigrantes entraram no Brasil, sendo 38% deles italianos. No período de 1880 a 1904, os italianos representaram 57,4% do total de imigrantes, seguidos por portugueses, espanhóis e alemães. Durante as décadas de 1880 até a Primeira Guerra Mundial, o Brasil foi o terceiro país em número de imigrantes italianos, ficando atrás apenas dos Estados Unidos e da Argentina.
O Banco di Napoli foi oficialmente incumbido de realizar a coleta, salvaguarda, entrega e transferência das economias acumuladas pelos emigrantes italianos no exterior. Essa autorização, conferida pelo Ministério da Fazenda, permitia ao banco firmar acordos específicos com outras instituições financeiras e órgãos governamentais. Essa missão estava formalizada no artigo primeiro da Lei n. 24, publicada em 1º de fevereiro de 1901, um dia após a entrada em vigor da Lei n. 23, que tratava diretamente da emigração.
A ideia de regulamentar as transferências financeiras de emigrantes por meio de uma instituição bancária não era nova. Em 1894, a casa Cesare Conti, sediada em Nova York, propôs um sistema de remessas operado em parceria com os serviços postais italianos. Dois anos depois, surgiu a proposta de criação de um banco colonial por ações, que atuaria tanto no território nacional quanto no exterior, contando com o suporte dos consulados. Ainda em 1896, Francesco Nitti apresentou ao Ministério do Tesouro um projeto para instituir a Banca per gli Emigrati d’Italia, concebida para gerir remessas sob a supervisão dos correios italianos.
O ministro do Tesouro à época, Luigi Luzzatti, também submeteu à Câmara um projeto voltado à proteção das economias dos emigrantes na América. Segundo ele, a iniciativa visava “a proteger o dinheiro de nossos pobres emigrantes contra fraudes e armadilhas de usurários astutos”. Apesar da linguagem que sugeria preocupação humanitária, Luzzatti também enfatizou o interesse de grupos econômicos em participar da gestão e do usufruto desses recursos enviados ao país.
Entre as diversas propostas, uma em particular ganhou apoio de grandes capitalistas e representantes de empresas marítimas, sendo promovida por um destacado economista da época. Esse economista era Nitti, cujo projeto influenciou significativamente as ideias de Luzzatti. A distinção essencial entre ambos residia no tipo de instituição bancária sugerida para gerenciar as remessas. Enquanto Nitti defendia uma entidade privada com capital acionário, Luzzatti priorizava uma instituição pública, como o Banco di Napoli, por considerar que as garantias governamentais trariam maior segurança ao dinheiro dos emigrantes.
Embora Luzzatti tenha deixado o Ministério do Tesouro antes da conclusão dos debates, as discussões continuaram até a aprovação da Lei n. 24 em 1901. Nesse período, surgiram resistências significativas, sobretudo de banqueiros italianos em Nova York, que administravam redes informais de remessas e viam na nova legislação uma ameaça a seus interesses lucrativos. Na Itália, as críticas ao monopólio do Banco di Napoli incluíam dúvidas quanto à capacidade operacional da instituição e propostas alternativas, como a criação de um banco colonial voltado ao desenvolvimento econômico do país.
O debate não era desprovido de razão. O volume das remessas era significativo, mas sua mensuração encontrava obstáculos devido à ampla utilização de meios informais para transferência de valores. Segundo Luigi De Rosa, antes da Lei n. 24, os emigrantes contavam com opções como vales internacionais, vales consulares, bilhetes emitidos por bancos italianos (Banco d’Italia, Banco di Napoli, Banco di Sicilia) e serviços de banqueiros privados. Além disso, há registros de canais informais, como envio de dinheiro por parentes ou amigos em retorno à Itália, remessas por correio comum e transporte pessoal do próprio emigrante.
Estudos estatísticos conduzidos por Gino Massullo indicam que, entre 1902 e 1913, os meios informais responderam por mais da metade das remessas enviadas ao país. Entre os canais formais, o Banco di Napoli gerenciou 19,88% dos valores, enquanto a Caixa de Poupança Postal administrou 9,74%, e os vales internacionais, 30,13%.
Um artigo de 1915 publicado na revista La Vita Italiana, em Roma, analisou as limitações do Banco di Napoli nos Estados Unidos. O texto destacava que, embora tivesse sido designado para proteger as economias dos emigrantes, o banco nomeou correspondentes que já operavam como banqueiros informais e nem sempre representavam os melhores interesses dos emigrados. Além disso, somente em 1908 o Banco di Napoli abriu uma agência em Nova York, enquanto outras cidades com grande concentração de italianos, como Chicago e Boston, continuavam desassistidas. O articulista conclamava o banco a cumprir sua missão ou abdicar de suas responsabilidades legais.
Os fluxos financeiros gerados pela emigração, especialmente durante o período de grande migração entre 1890 e a Primeira Guerra Mundial, tiveram impacto relevante na balança de pagamentos italiana. Segundo Ercole Sori, as remessas representavam mais de 13% dos ativos do país, financiando importações, ampliando reservas de ouro e alimentando setores industriais vinculados a grandes bancos. Por outro lado, em nível microeconômico, essas economias foram utilizadas para quitar dívidas, melhorar condições de vida e adquirir propriedades, enfrentando resistências das elites locais que buscavam manter o controle econômico tradicional.
De modo geral, a política de remessas refletia as condições do desenvolvimento econômico italiano. Como observado por Francesco Nitti, a emigração era um reflexo da incapacidade do reino de gerar oportunidades internas, tornando a exportação de mão de obra uma solução inevitável para mitigar as desigualdades econômicas e sociais.
Nota do Autor
Este artigo busca explorar as remessas financeiras dos emigrantes italianos no período de grande migração (final do século XIX ao início do XX), destacando o papel do Banco di Napoli e as políticas governamentais implementadas para as gerenciar. Ele analisa tanto as medidas legais quanto os interesses econômicos que influenciaram essas iniciativas, enfatizando como as remessas contribuíram para a economia italiana, apesar das resistências e críticas. As remessas financeiras enviadas pelos emigrantes desempenharam um papel crucial no crescimento econômico da Itália, fornecendo recursos que ajudaram a financiar importações e fortalecer o sistema de crédito, contribuindo também para o desenvolvimento industrial do país. Além disso, essas remessas foram uma fonte essencial de liquidez para famílias e comunidades locais, possibilitando melhorias nas condições de vida e na economia rural. Os emigrantes italianos, ao enviarem suas economias para a pátria, não apenas sustentaram suas famílias, mas também participaram ativamente da transformação econômica do reino, conectando-o a fluxos globais de capital. A intenção deste artigo é fomentar a compreensão das interseções entre políticas públicas, interesses privados e experiências dos emigrantes neste período histórico, destacando sua importância para o desenvolvimento da Itália.
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