Mostrando postagens com marcador café. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador café. Mostrar todas as postagens

quarta-feira, 3 de abril de 2024

A Jornada de Matteo de Assisi para o Brasil

 


Nas montanhas verdejantes que circundavam a pitoresca vila não longe de Assisi, na região da Umbria, a parte central da Itália, nasceu Matteo, filho de Giovanni e Maria. Era uma manhã ainda fria de primavera quando ele veio ao mundo, envolto nas esperanças e nas expectativas de seus pais, que há muito tempo trabalhavam na terra fértil da região.
Desde os primeiros momentos de sua vida, Matteo foi imerso na beleza rústica e na simplicidade da vida campestre. Cresceu entre os campos ondulantes de oliveiras e vinhas, respirando o ar fresco das montanhas e ouvindo os cânticos dos pássaros que pairavam nos céus azuis.
Seu pai, Giovanni, era um mezzadro respeitado na comunidade, um homem que dedicava suas horas ao trabalho árduo nos campos em troca de uma modesta parcela de terra para cultivar. Sua mãe, Maria, era o coração do lar, uma mulher forte e amorosa que cuidava da casa e dos filhos com dedicação inabalável.
Matteo cresceu rodeado pelo calor da família e pela solidariedade dos vizinhos. Na pequena vila natal, próxima de Assisi, onde todos se conheciam pelo nome e compartilhavam alegrias e tristezas, ele encontrou um senso de pertencimento que moldaria sua visão de mundo nos anos seguintes.
Enquanto o tempo passava, Matteo testemunhava as estações mudarem, cada uma trazendo consigo suas próprias bênçãos e desafios. Ele aprendeu com seu pai os segredos da terra, trabalhando lado a lado nos campos desde tenra idade, enquanto absorvia as histórias e os ensinamentos dos mais velhos na vila.
No entanto, mesmo em meio à tranquilidade da região, Matteo não conseguia ignorar as histórias de parentes e amigos que partiram em busca de oportunidades além-mar. A situação economica da Itália no pós guerra impedia o desenvolvimento e a criação de novos postos de trabalho para uma população que crescia nas cidades pelo abandono do campo. Embora seu coração estivesse profundamente enraizado na terra que o viu nascer, ele sabia que o mundo além das montanhas guardava segredos e possibilidades desconhecidas.
E foi assim que, apesar de sua resistência inicial, Matteo se viu confrontado com uma escolha difícil em 1924, quando a Itália ainda estava se recuperando da guerra, uma série de más colheitas e dificuldades financeiras assolaram sua família e muitos outros na vila. A tentação da emigração tornou-se irresistível, e junto com outras famílias da província, Matteo embarcou em uma jornada incerta em direção ao Brasil, deixando para trás as colinas verdejantes e os laços de sangue que o ligavam à sua terra natal.
Após desembarcar no Porto do Rio de Janeiro, Matteo se encontrou diante de uma paisagem completamente diferente daquela que deixara para trás na Itália. As ruas movimentadas, os sons estridentes e a mistura de culturas o deixaram maravilhado e um pouco atordoado. No entanto, ele sabia que ali estava apenas o início de uma nova jornada.
Ao chegar em Santos e subir a Serra do Mar até São Paulo, Matteo contemplou as vastas plantações de café que se estendiam pela região, compreendendo a magnitude da economia cafeeira que impulsionava o estado. Em São Paulo, ficou tentado a se estabelecer na cidade, seduzido pela promessa de oportunidades infinitas, mas o convite de seu amigo de infância o levou a seguir rumo ao interior até Ribeirão Preto.
Ao chegar em Ribeirão Preto, Matteo imergiu profundamente no universo da construção civil. Seu domínio das técnicas de alvenaria, cultivado desde a infância enquanto auxiliava um tio em suas empreitadas, rapidamente o destacou pela destreza e dedicação. Logo, viu-se envolvido em projetos audaciosos e desafiadores, contribuindo para erigir os fundamentos de uma cidade em pleno crescimento.
Enquanto se entregava ao trabalho árduo durante o dia, Matteo mergulhava de corpo e alma na riqueza da cultura brasileira durante suas horas de folga. Determinado a se integrar completamente, ele dedicou-se a aprender o idioma local, imergindo em festas tradicionais e estabelecendo laços de amizade que transcendiam fronteiras. Foi em uma dessas celebrações que o destino o presenteou com Giulia, uma mulher cativante, cujas raízes italianas ecoavam as suas próprias. O amor entre eles floresceu de forma arrebatadora e rápida, guiando-os a decidir, em pouco tempo, unirem-se em matrimônio.
Com Giulia como sua companheira, Matteo descobriu uma fonte renovada de motivação para alcançar o sucesso. Unidos, eles ergueram sua morada e deram vida a uma família. Matteo persistiu em sua jornada na construção civil, eventualmente fundando sua própria empresa, que ascendeu para se tornar uma das mais conceituadas da região. Enquanto isso, Giulia dedicava-se incansavelmente ao lar e aos filhos, espelhando a mesma devoção e amor que ele testemunhara em sua própria mãe.
Ao longo dos anos, Matteo testemunhou o florescimento de Ribeirão Preto diante de seus olhos, como um jardim que desabrochava com o tempo. Novas ruas foram meticulosamente pavimentadas, imponentes arranha-céus ergueram-se majestosos onde outrora se estendiam campos abertos, e a cidade transformou-se em um polo econômico vital na região. Enquanto isso, seus filhos foram criados imersos na rica herança italiana que Matteo trouxera consigo, mas também absorveram avidamente as oportunidades oferecidas pelo Brasil em constante evolução.
Matteo, agora idoso, contempla o passado com um coração transbordando de gratidão pela jornada que o conduziu até este ponto. Ele se regozija com o trabalho árduo que desempenhou, com as memórias preciosas que acumulou ao longo dos anos e com a família que teve a honra de construir ao lado de Giulia. Embora as montanhas verdejantes da Umbria permaneçam como um cenário nostálgico em sua mente, ele reconhece plenamente que encontrou um novo lar, uma nova pátria, e uma vida repleta de realizações e significado no caloroso coração do Brasil.



sexta-feira, 1 de março de 2024

Imigração Italiana em Minas Gerais: Contribuição e Integração na Sociedade Brasileira



A imigração italiana para Minas Gerais foi marcada por um significativo influxo de cidadãos oriundos da Itália durante o final do século XIX e o início do século XX, tornando este estado brasileiro um dos destinos mais procurados por esses imigrantes em todo o país, ficando apenas atrás de São Paulo e Rio Grande do Sul em termos de recebimento populacional.
A crise econômica que assolava a Itália ao final do século XIX, caracterizada pelo declínio das atividades agrícolas e industriais, impulsionou uma emigração em larga escala para várias nações, incluindo o Brasil. Os registros da Hospedaria Horta Barbosa, em Juiz de Fora, revelam que entre 1888 e 1901, 68.474 imigrantes italianos desembarcaram em Minas Gerais. No período de 1872 a 1930, esse número aumentou para 77.483. Originários principalmente do Norte da Itália, esses migrantes desempenharam um papel significativo nas plantações de café da Zona da Mata, onde cerca de 80% deles se dedicaram a essa atividade, enquanto aproximadamente um terço optou pelo Sul de Minas.
O governo de Minas Gerais desempenhou um papel ativo no estímulo ao fluxo migratório italiano, assumindo os custos das passagens marítimas para suprir a crescente demanda por trabalhadores nas plantações de café. Embora a economia mineira estivesse fortemente ligada à exportação desse produto na época, o estado possuía a maior população do Brasil, o que significava uma reserva considerável de mão de obra local disponível para substituir os escravos recentemente libertados. Portanto, ao contrário de São Paulo, não se viu a necessidade premente de um influxo massivo de imigrantes europeus.
Os imigrantes italianos que se estabeleceram em Minas Gerais inicialmente encontraram ocupações principalmente ligadas à produção de café. Contudo, ao longo do tempo, sua presença na sociedade mineira expandiu-se para diversas esferas, especialmente nas áreas urbanas, onde desempenharam um papel ativo no desenvolvimento do comércio, da indústria e de outras atividades. A integração dos italianos na sociedade mineira ocorreu de forma rápida e harmoniosa, sem a formação de enclaves isolados. Pelo contrário, os imigrantes dispersaram-se por todo o território do estado, constituindo uma minoria em meio à população majoritária, em um processo de assimilação tranquila.


quinta-feira, 26 de outubro de 2023

Da Sicília ao Brasil: Uma Saga de Coragem em Campinas



Era o ano de 1868, em uma pequena vila no interior da Sicília, onde o sol dançava sobre as colinas de Agrigento, banhando tudo em uma luz dourada e perfumada pelo aroma do Mediterrâneo. Foi nesse cenário que Aniello viu pela primeira vez a luz do dia, em uma casa modesta na zona rural.
A família, composta por pequenos agricultores, enfrentava desafios para obter o sustento a partir de uma parcela de terra com menos de um hectare, que eles arrendavam. O ambiente que antes era idílico e próspero agora estava imerso em dificuldades devido a vários anos de conflitos pelo poder. A unificação da Itália resultou em um aumento significativo de impostos e taxas, levando a economia local à ruína. Aniello, o filho mais velho, sentia a responsabilidade de alimentar não apenas a si mesmo, mas também seus pais, esposa Maria Giovanna, três irmãs e quatro irmãos mais jovens.
Os ventos da mudança sopraram na forma de oportunidades além do horizonte. O Brasil, um vasto país sul-americano, oferecia uma promessa de esperança. O governo brasileiro buscava mãos trabalhadoras e, generosamente, concedia passagens gratuitas para aqueles dispostos a emigrar. Aniello, encantado com a perspectiva, assinou um contrato de quatro anos com uma empresa que representava uma imensa fazenda de café em São Paulo.
Em dezembro de 1888, ele e Maria Giovanna, abençoados pelos pais e emocionados com as despedidas dos irmãos, embarcaram no navio Príncipe de Astúrias, partindo de Nápoles rumo ao Brasil. A viagem, no entanto, não foi uma jornada fácil. O navio estava superlotado, com a falta de água potável e alimentos causando tumulto entre os passageiros. Nos porões úmidos e escuros, a falta de higiene tornava o ar insuportável.
Ao cruzarem o equador, enfrentaram tempestades que deixaram todos a bordo aterrorizados. Contudo, a esperança os guiou, e finalmente, em dezembro de 1888, Aniello e Maria Giovanna pisaram em solo brasileiro, prontos para enfrentar os desafios que a nova vida lhes reservava.
Chegando ao Brasil pelo porto de Santos, Aniello e Maria Giovanna foram recebidos pelos empregados das fazendas que os aguardavam. Após serem examinados, seguiram para o interior do estado de São Paulo, onde a maioria dos 1260 passageiros permaneceu; quase 500 deles foram para diferentes destinos, como o Rio Grande do Sul. Subiram a Serra do Mar até a capital, São Paulo, onde ficaram dois dias hospedados na Hospedaria dos Imigrantes, antes de embarcar em um trem rumo às fazendas que os contrataram.
A fazenda de Aniello e Maria Giovanna era uma propriedade vasta, administrada por um capataz; uma terra que já havia testemunhado os dias da escravidão, com mais de 300 escravos. Era coberta por milhares de pés de café, uma visão que se tornaria familiar ao casal nos anos seguintes. No segundo ano na fazenda Arari, receberam a bênção do nascimento de Pasquale, o mesmo nome do pai de Anielle, homenageando assim a tradição familiar.
Após os quatro anos iniciais, Aniello e Maria Giovanna decidiram permanecer por mais algum tempo na fazenda. Dois anos depois, com o nascimento de Salvatore, vislumbraram uma nova oportunidade que chegou através da informação de um amigo. Deixaram a fazenda e mudaram-se para Campinas, uma cidade já significativa, onde Aniello começou a trabalhar em um pastifício local. Inicialmente, alugaram uma casa na periferia, mas à medida que o tempo passava, adquiriram um lote de terra e construíram sua própria casa.
Em Campinas, a família Aniello floresceu, recebendo a chegada de mais cinco filhos: Maria Augusta, Nicola, Alessandro, Luigia e Caterina. O passado na Sicília e a jornada através do Atlântico deram origem a uma nova história, cheia de desafios superados e sucessos conquistados. Assim, na terra prometida do Brasil, a família cultivou não apenas café, mas também raízes profundas que se estenderam por gerações. O legado de Aniello e Maria Giovanna se entrelaçou com o tecido de Campinas, uma tapeçaria rica em histórias de coragem, esperança e resiliência.


sexta-feira, 2 de junho de 2023

Do Outro Lado do Oceano: Descubra por que o Brasil foi um dos Destinos Escolhido por tantos Imigrantes Italianos


 

No estudo da imigração italiana no nosso país, as primeiras perguntas que surgem são: o que levou o governo brasileiro a receber tantos imigrantes italianos e quais contribuições trouxeram esse número tão elevado de imigrantes italianos ao grande e longíquo Brasil? De onde eram provenientes os italianos que para cá vieram?

Desde o início da colonização portuguesa do nosso país, a falta de mão de obra, sempre se constituiu em um grave problema. Para a mentalidade da época o trabalho duro não era destinado aos nobres e pessoas ricas, aquelas bem nascidas e possuidoras de grandes patrimônios. O trabalho braçal estava destinado para as classes menos favorecidas ou para os escravos, que desde sempre foram os responsáveis diretos pelo progresso dos diversos países.

O Brasil colonial era um país muito rico em reservas naturais de madeiras muito cobiçadas naqueles tempos como o pau-brasil e  diversos minerais preciosos, especialmente o ouro e os diamantes, pelos quais os portugueses tanto lutaram.

Para enfrentar a falta de mão-de-obra necessária para a exploração do grande país, os portugueses procuraram resolver o problema trazendo milhares de escravos da África. Foi o trabalho duro desses escravizados que assegurou a exploração das madeiras de lei, o trabalho pesado nas minas de ouro e diamantes e nas grandes plantações de cana de açúcar,  mais tarde a criação de gado no sul, transformando o pequeno Portugal em um grande fornecedor desses produtos no mercado internacional. A partir de 1840 o café passou a ter uma maior procura no mercado mundial, suplantando a indústria açucareira. A sua cotação cada vez mais alta, fez surgir, principalmente nas províncias de São Paulo e Espírito Santo, grandes fazendas comandadas nobres famílias de origem portuguesa,  os ricos barões do café, que supriam e dominavam o mercado mundial do produto. Como já tinha acontecido com o açúcar, quem cultivava as plantações e trabalhava na colheita, eram os escravos negros, que em número cada vez maior, e de forma degradante, chegavam da África. O mundo passava por muitas alterações e a potencia dominante agora era a Inglaterra, que já havia iniciado o processo de industrialização do país e agora não necessitava mais de importar escravos. Com o seu grande poder militar, especialmente representado pela sua grande marinha, começou impor sanções aos países em que ainda os escravos eram necessários. Navios negreiros eram abordados em alto mar e impedidos de chegar até o Brasil, aumentando muito valor de cada escravo. Também no Brasil se iniciou um processo político para criar condições para a abolição do trabalho escravo no país. Depois de várias leis que dificultavam a escravidão, em 13 de Maio de 1888 foi proclamada a Lei Áurea, a qual pôs fim à escravidão no Brasil depois de três séculos de prática.

Foi certamente um grande choque para um país em que a mão-de-obra era somente aquela escrava, e esses, uma vez libertos, não queriam mais trabalhar para o seus antigos donos. Alguns anos antes, quando já se ouviam as primeiras notícias dessa eminente mudança, os grandes fazendeiros, que lutaram politicamente contra dar liberdade total aos escravos, começaram a procurar pelo mundo nações onde havia um grande número de pessoas querendo abandonar o país. Algumas exigências no entanto, foram apresentadas pelo império brasileiro, para escolha de onde poderia vir essa tão necessária mão-de-obra. Entre as exigências estava: esses trabalhadores precisavam ser brancos, terem religião aceita pelo estado e fossem dóceis em receber ordens.  Inicialmente, foram trazidos grupos de colonos alemães, mas a experiência não deu muito certo pelo fato deles serem muito difíceis em aceitar ordens e também porque se mantinham fiéis a sua língua e tradições, criando quistos culturais onde viviam. Assim os fazendeiros paulistas e o Império do Brasil se voltaram para os habitantes da península italiana, o recém unificado reino da Itália, que estavam passando por sérias dificuldades, até mesmo a fome, pela falta de trabalho no novo país. Os italianos, sobretudo os das províncias vênetas,  eram vistos pelas autoridades imperiais como ideais, por serem um povo dócil,  trabalhador e professarem a mesma religião que o Brasil. Outro fator, não menos importante, para a escolha dos europeus era o fato de serem brancos o que também atenderia a exigência de povoar as imensas áreas quase desabitadas do sul do Brasil e contribuir para o branqueamento da população, uma raça considerada muito escura pelas autoridades imperiais.

A partir de 1875 o governo brasileiro anunciou uma serie de vantagens para favorecer a emigração dos italianos, até mesmo viagem grátis e promessa de lotes de terra para cultivar. Isso era tudo que os miseráveis camponeses italianos queriam ouvir, satisfazia o sonho da propriedade acalentados há séculos. Sendo proprietários das suas terras deixariam de dividir as colheitas com um senhor. Assinaram contratos em branco em troca da passagem e da promessa de um pedaço de terra para cultivar. Se obrigavam a ir aonde o governo brasileiro determinasse, geralmente lugares localizados em zonas ainda intocadas, no meio da mata no sul do Brasil ou nas grandes fazendas de café de São Paulo e Espírito Santo, para substituir os escravos liberados. Aqueles imigrantes que foram destinados para as novas colônias do sul do país, inicialmente Rio Grande do Sul e depois Santa Catarina e Paraná, se viram repentinamente no meio de imensas zonas selvagens, despovoadas, no meio da mata virgem, sem estradas ou outro meios de comunicação, distante de cidades ou de  qualquer recurso. No local de sua propriedade a mata era repleta de uma fauna para eles desconhecida. Muitos animais selvagens, abundância de aves, onças e macacos, como os bugios, cujos gritos dos bandos muito amedrontaram os récem-chegados. O clima encontrado, no entanto, era mais parecido com aquele que deixaram na Itália e o isolamento permitiu aos imigrantes pôr em prática os próprios conhecimentos e recriar a própria cultura. O processo de aquisição da terra foi tudo menos fácil. Os imigrantes eram transportados, gratuitamente, do porto de desembarque aos vários núcleos. Estes estavam divididos em lotes de 25 a 60 hectares, que eram concedidos exclusivamente à famílias e deviam ser resgatados em parcelas a partir do segundo ano, isto é, depois de feita a primeira colheita. Os colonos recebiam algum material para construir uma casa provisória, subsídios alimentares para alguns meses, ferramentas agrícolas e sementes que deveriam ser reembolsados mais tarde. A família assumia a obrigação de desmatar uma parte do lote, preparar o terreno para o cultivo, semear, construir a própria habitação, abrir e manter estradas e caminhos para delimitar as fronteiras da propriedade. Os imigrantes logo perceberam as dificuldades que teriam que enfrentar naquelas colônias isoladas, algumas com presença constante de índios, locais em que faltavam escolas, igrejas e onde a assistência médica era inexistente, ou quando havia estava muito distante em alguma cidade maior, e encontrada a preço muito alto para eles. Apesar de tudo uma parte significativa desses imigrantes conseguiu realizar o sonho da propriedade e em poucos anos nesses locais ermos surgiram ricas cidades. Diferente foi a situação para  aqueles imigrantes que foram destinados para trabalhar nas grandes fazendas de café de São Paulo, Espírito Santo e Minas Gerais. Nesses locais as condições de vida eram ainda mais duras e com grande dificuldade dava a eles a oportunidade de economizar para poder comprar um terreno na cidade mais próxima da fazenda. Por contrato para deixar a fazenda primeiro deviam ressarcir o proprietário de todos os gastos que haviam contraído com eles e isso após o prazo obrigatório de permanência  estipulado naquele documento. Ali se vivia em um mundo de segregação, arbítrios, violências de todo tipo, até sexuais. A vontade do proprietário ou do administrador era lei e quase não existia liberdade pessoal. O acesso à assistência à saúde, a instrução escolar e ao conforto religioso eram ausentes ou fornecidos com grande parcimônia.  A forma mais eficaz de protesto foi o abandono da plantação. Aqueles que decidiam migrar novamente ou procuravam outras fazendas que podiam oferecer-lhes melhores condições de vida ou se transferiam para os centros urbanos em busca de novas ocupações. Muitos, desiludidos resolviam retornar para a Itália. Aqueles que deixavam as fazendas se dirigiram a periferia das pequenas cidades vizinhas ou mesmo na capital,  alguns que já tinham uma profissão, ou tinham tino comercial, trabalhando por conta própria ou como empregados nos vários tipos de estabelecimentos que o progresso acelerado do estado proporcionava. À medida que as condições financeiras melhoravam, os imigrantes começavam a construir suas próprias casas, reproduzindo os modelos arquitetônicos do país natal e recriando uma pequena Itália em território brasileiro. Aqueles  que preferiram viver nas grande cidades como  na capital, a maior parte deles vivia em enormes cortiços, subdivididos em pequenos cômodos, nos bairros. 

A emigração italiana no Brasil teve seu pico máximo entre os anos de 1887 e 1902, quando em quinze anos chegaram ao Brasil quase um milhão de pessoas, ou seja 60% dos estrangeiros que aqui desembarcaram. Nessa época o Brasil estava em terceiro lugar no grande fluxo da emigração italiana, atrás dos Estados Unidos e da ArgentinaDepois de 1902, as chegadas reduziram-se consideravelmente, pois o governo italiano decidiu proibir a emigração subsidiada, por causa de denúncias sobre as dramáticas condições dos italianos, comparados a escravos brancos nas fazendas. Essa redução, provavelmente, se justificou também pela crise de superprodução do café, queda do preço no mercado internacional, que determinou uma exacerbação das más condições de vida e de trabalho nas plantações. No período entre as duas grandes guerras, as chegadas diminuíram, enquanto uma leve retomada se registrou depois de 1946. A partir dos anos 1960, as chegadas de italianos se reduziram a poucas centenas ao ano e corresponderam à lógica de transferência de empregados de sociedades italianas com investimentos no Brasil ou a escolhas de vida. Até 1915 prevaleceu a mão-de-obra rural, previdentemente analfabeta e os imigrantes por força de contrato chegavam acompanhados pela família. A partir de 1920 houve uma predominância de solteiros, artesãos, empregados de fábricas e trabalhadores braçais. Tal tendência se acentuou no segundo pós-guerra, com a chegada de técnicos e operários especializados, com um nível crescente de instrução. Entre 1878 e 1886, emigraram apenas indivíduos da regiões do Vêneto e Lombardia, encaminhados especialmente para as novas colônias do Sul do país e os meridionais dirigidos, em grande parte, para as fazendas de café, mas sobretudo, para os centros urbanos. Já entre 1887 e 1895, tem-se uma nítida maioria de setentrionais enquanto o grosso da emigração meridional começará depois de 1893/95 e tornar-se-á majoritária a partir de 1898 com imigrantes provenientes da Campania, a Calábria e  Abruzzo.
Cada uma dessas populações recriou, onde se estabelecia uma pequena comunidade, um pedaço da Itália em que mantinha os usos e os costumes da região de origem. Isso garantiu a preservação de muitas tradições italianas em território brasileiro e permitiu aos emigrantes atenuar, em parte, a saudade de casa. Apesar dos inúmeros problemas e das grandes humilhações que os italianos tiveram de sofrer, é verdade também que eles, nos locais em que se instalaram, contribuíram para a modernização da economia e da sociedade brasileira.


Dr. Luiz Carlos B. Piazzetta
Erechim RS