A Emocionante Imigração Italiana
“Os mais fracos, os mais medrosos, não emigram, não navegam nos mares, deixando para trás a pátria e a família, mas, em geral, aqueles para quem a vida é uma batalha e a alma é forte o suficiente para lutar mesmo em condições mais difíceis”.
As notícias sobre uma possibilidade para sair da miséria, que então grassava nos campos italianos, se espalharam como um verdadeiro rastilho de pólvora, por toda zona rural italiana, fazendo com que a emigração passasse a se organizar rapidamente em uma rede do tipo parental.
Na segunda metade do século XIX, os homens deixaram de emigrar sozinhos para destinos distantes, mas sim agora eram acompanhados por todo o núcleo familiar e ao qual, muitas vezes, também aderiam os vizinhos e partiam em grupos.
Em 1878 foram 2.000 emigrantes vênetos que desembarcaram no Brasil, dez anos mais tarde, esta cifra atingiu 72. 000. Esse rápido aumento deveu-se ao maior atrativo que o Brasil passou a exercer sobre a emigração italiana após a abolição da escravidão em 1888, quando o extenso e pouco povoado império brasileiro, país de dimensões continentais, passou a recrutar ativamente migrantes, tanto para compensar a falta de mão de obra, outrora representada por escravos provenientes da África, como para ocupar e proteger as grandes extensões de terras desabitadas nos estados do sul do país. O Império brasileiro precisava proteger o seu território dos países vizinhos que dividiam fronteira.
De família em família, de vila em vila, a Itália testemunhou o êxodo de aldeias inteiras, que abandonaram o campo e se dirigiram em massa para o porto de Gênova, na esperança de encontrar melhor sorte no exterior. Poucas foram as famílias italianas que não se viram direta ou indiretamente envolvidas nesse fenômeno, especialmente aquelas da região do Vêneto.
Para entender por que a emigração atingiu tais dimensões, devemos antes de tudo entender o contexto de vida no qual viviam tantos italianos que queriam escapar e assim poderemos chegar a identificar as forças que dificultaram ou que favoreceram a emigração.
Certamente, um fator relevante de atração foi representado pelo desejo de ascensão social daquele pequeno agricultor, ou artesão, que durante séculos viveu em total submissão ao dono da gleba, com poucos direitos e muitos deveres de quase total servidão, onde o lema era: trabalhar duro, obedecer e calar sempre. Em primeiro lugar, estava a possibilidade de, com a emigração, se tornarem proprietários da sua própria terra, o que para a maioria dos camponeses representava a recompensa por todo o seu trabalho e para os que pertenciam à uma classe um pouco mais privilegiada, uma forma de consolidar sua condição social.
Também tiveram importância as inúmeras histórias contadas pelos agentes de emigração contratados pelas companhias de navegação e também pelos relatos de emigrantes que retornavam para a Itália, que falavam de uma terra próspera onde todos poderiam alcançar rapidamente melhores condições sociais. As cartas de chamada enviadas pelos primeiros emigrantes aos seus familiares e amigos contando da fartura em que agora viviam, foram atrativos muito fortes. A América rapidamente tornou-se assim o grande El Dorado, a "terra do ouro e da felicidade". Esses dois fatores, combinados com a falta de perspectivas de uma melhoria das condições de vida a curto prazo no país, levaram à difícil decisão de emigrar.
Em Genova, a bela capital da Ligúria, de 1876 a 1901, a média anual de passageiros que de lá embarcavam para atravessar o oceano era de 76.960 pessoas, número esse que nos dá a entender a extensão da pressão demográfica que naqueles anos sofria e afogava aquela cidade. Os emigrantes que lá chegavam, maltrapilhos, mal lavados e com hábitos interioranos, eram quase sempre vistos como estrangeiros em seu próprio país e não contavam com nenhum meio de proteção, mesmo após a promulgação da lei de 1901.
Totalmente à mercê das ávidas agências de navegação, os pobres camponeses à espera da partida, eram ludibriados e amontoados em pequenos hotéis, pensões e pousadas vizinhas ao porto, parceiros que eram das companhias de navegação, estabelecimentos nos quais se pagava pela alimentação e hospedagem. Eram locais onde as condições de higiene deixavam muito a desejar. Nos anos seguintes, os emigrantes eram amontoados em dormitórios com lotação bem acima de suas capacidades, porém, com ambientes um pouco mais higiênicos. Além de explorarem o transporte de migrantes, os armadores passaram então a lidar com o lucrativo mercado de remessas de valores dirigidos para a Itália, cujo fluxo controlavam e que passaram a usar como capital para investir na compra de novos navios e modernizar a frota italiana. Portanto, pode-se dizer que o mercado de remessas de dinheiro dos emigrantes para seus familiares que ficaram na Itália, financiou parcialmente o desenvolvimento das companhias marítimas italianas.
Também acontecia, não raro, que as companhias marítimas fossem ao mesmo tempo agências de emigração e que estas tivessem laços econômicos estreitos com as câmaras de comércio italianas, como na Argentina, onde eram muito ativas, sobretudo graças às atividades dos armadores da Ligúria, que já em 1869 lá se estabeleceram com a companhia de navegação Italo Platense. Deste quadro promíscuo de agências de emigração e companhias marítimas, pode-se entender que o êxodo italiano para o continente americano representou uma verdadeira fonte econômica com amplo potencial de ganhos e como tal contribuiu para enriquecer uma grossa fatia de empresários.
Como costuma acontecer quando os ganhos de um setor se tornam tão atrativos, a competição tornou-se mais acirrada, especialmente quando a Itália começou a se interessar pelo destino de seus emigrantes. A classe política conservadora e próxima aos grandes latifundiários acusou os agentes e armadores de serem os instigadores do êxodo e de fazerem seus cidadãos viajarem em condições desumanas, repovoando o campo.
Quando a lei foi finalmente promulgada em 1901, pôs fim à controvérsia entre os dois grupos, dando razão ao mais poderoso; os critérios para o recrutamento de emigrantes foram então deixados nas mãos das companhias de navegação, mas ao mesmo tempo foram impostas mais algumas restrições para proteger os emigrantes durante a viagem.