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sexta-feira, 10 de maio de 2024

Entre Ruínas e Renascimentos: A Jornada de Marietta



No pequeno município de Segusino, situado entre o Monte Grappa e costeando a margem esquerda do Rio Piave, a vida sempre foi tranquila para Marietta e sua numerosa família. Filha de Giacomo e Maria Augusta, Marietta era a terceira de oito irmãos, cercada pelo afeto de sua família e pela presença reconfortante da nona Chiara, que aos 76 anos ainda irradiava sabedoria e amor. No entanto, a paz que conheciam foi abruptamente interrompida com a eclosão da Primeira Guerra Mundial, que trouxe destruição e desolação à sua querida Segusino. O conflito deixou cicatrizes profundas na terra e na alma dos habitantes locais. Após a guerra, Marietta testemunhou a triste cena de sua comunidade despedaçada, forçada a deixar seus lares em busca de abrigo em cidades ao sul da Itália. Enquanto seus irmãos e irmãs optavam por permanecer nas terras devastadas, Marietta, então com 30 anos, decidiu trilhar um caminho diferente. Com coragem e determinação, Marietta reuniu suas poucas economias, e, com a ajuda preciosa de seus pais e irmãos, adquiriu as passagens de navio. Com o coração cheio de esperança, ela embarcou em uma jornada incerta rumo ao Brasil, buscando um novo começo em terras distantes. Acompanhada por antigos vizinhos, Marietta deixou para trás as ruínas de seu lar e partiu para uma terra promissora, onde os raios do sol pareciam sussurrar promessas de oportunidades e renovação.
Ao chegar ao porto de Santos, Marietta contemplou as vastas possibilidades e desafios que aguardavam sua chegada. Orientada por uma amiga de longa data, que emigrou com os pais e já residia em São Paulo desde os tempos anteriores à guerra, ela tomou o trem em direção à grande cidade, pronta para começar uma nova jornada. Sua amiga a ajudou a encontrar uma pensão não muito cara para morar, proporcionando-lhe um ponto de partida seguro para iniciar sua nova vida na metrópole. 
Com suas habilidades de costura, refinadas pela avó em sua cidade natal, Marietta encontrou uma oportunidade valiosa em uma renomada fábrica de roupas em São Paulo. Seu talento excepcional logo se destacou, tornando-a uma parte indispensável da equipe. Suas mãos habilidosas transformavam tecidos em obras de arte, enquanto ela se integrava harmoniosamente ao ritmo frenético da produção. Determinada a prosperar, Marietta não se contentava apenas com o emprego diurno; à noite, dedicava-se incansavelmente ao seu modesto ateliê na pequena peça, onde costurava e remendava roupas com habilidade e paixão. Cada ponto era uma contribuição para o seu sonho, cada peça restaurada uma pequena vitória. Com determinação inflexível, ela economizava cada centavo, consciente de que cada sacrifício era um investimento em seu futuro brilhante. Mesmo sua máquina de costura era alugada, pois ainda não tinha recursos para adquirir uma própria, mas isso não a detinha em sua busca pela independência e sucesso.
Com o passar dos anos, Marietta ganhou reputação como uma costureira habilidosa, conhecida pela qualidade de seu trabalho. Sua clientela cresceu, e ela finalmente pôde comprar sua própria máquina de costura, um símbolo tangível de sua independência e sucesso. 
No entanto, o destino reservava mais surpresas para Marietta. Aos 40 anos, quando menos esperava, ela encontrou o amor nos braços de Giovanni, um viúvo respeitado na comunidade italiana de São Paulo. Com mais de duas décadas de experiência como comerciante de tecidos, Giovanni compartilhava não apenas a herança italiana de Marietta, mas também a determinação de construir uma vida melhor no Brasil. 
Seis meses após seu primeiro encontro, Marietta e Giovanni se casaram em uma cerimônia simples, mas repleta de amor e esperança. Enquanto os raios dourados do sol se derramavam sobre o jardim onde a cerimônia acontecia, Marietta e Giovanni, rodeados pela fragrância das flores em plena floração, uniram seus destinos em frente aos olhos ternos de seus familiares e amigos. Entre os presentes estavam os três filhos de Giovanni, já adultos e casados, que testemunharam com gratidão e felicidade o novo capítulo na vida de seu amado pai. Com sorrisos radiantes e abraços calorosos, eles celebraram a união de Giovanni e Marietta, reconhecendo a beleza do amor que transcende fronteiras e adversidades. Enquanto a música suave embalava a atmosfera, as vozes dos convidados se uniram em alegres felicitações, ecoando o sentimento de esperança e renovação que permeava o ar. 
Marietta e Giovanni, mãos entrelaçadas e corações repletos de promessas, olharam para o horizonte com otimismo, sabendo que estavam prontos para enfrentar juntos tudo o que o futuro reservava. Com solidariedade e determinação, eles se uniram, fortalecendo-se mutuamente para enfrentar os obstáculos que surgiriam em seu caminho. Além disso, para aumentar a sua alegria, Marietta não hesitou em dividir suas esperanças com sua irmã mais nova, enviando-lhe as passagens para que pudesse se juntar a ela no Brasil e compartilhar os desafios e as alegrias de construir uma nova vida em terras estrangeiras. Assim, a história de Marietta se torna um testemunho de coragem, perseverança e amor, uma jornada que começou entre as ruínas de um passado doloroso e floresceu em um futuro cheio de promessas e felicidade.


sexta-feira, 8 de março de 2024

Sob o Sol da Esperança



A história de Rosalia e sua família é um intricado bordado, tecido com os fios da perseverança e da resiliência em meio às vicissitudes da vida. Nascida em uma época tumultuada na Itália, Rosalia enfrentou a perda de seu amado marido, Giacomo, e encontrou refúgio nos braços de sua filha Giuditta e seu genro Donato. A decisão de Donato de emigrar para o Brasil, em busca de oportunidades que se esvaíam nas terras sicilianas, lançou a família em uma jornada transatlântica repleta de desafios e descobertas.
Ao desembarcarem no porto de Santos, a vastidão do Brasil se desdobrou diante deles, uma terra de promessas e incertezas. Seguiram os trilhos de ferro até a região de Ribeirão Preto, onde a imponente plantação de café se estendia como um oceano verde sob o sol tropical. A humilde casa de barro e chão de terra batida onde foram alojados refletia a dura realidade da vida dos imigrantes trabalhadores rurais que foram para São Paulo, mas também carregava consigo a esperança de um futuro melhor.
Enquanto Donato e Giuditta mergulhavam no árduo trabalho da plantação, Rosalia se dedicava à cura e ao cuidado dos que buscavam alívio em suas mãos sábias. Com um conhecimento transmitido por gerações, ela se tornou uma figura venerada entre os colonos, uma luz de esperança em meio à escuridão da adversidade. Seu vínculo com a antiga curandeira escrava, uma octogenária que ainda morava na fazenda, apesar das barreiras linguísticas, enriqueceu ainda mais seu repertório das ervas brasileiras e técnicas curativas.
Enquanto os anos passavam na fazenda, a família mantinha viva a chama da esperança, economizando cada centavo em direção à liberdade tão sonhada. Nas jornadas dominicais até Ribeirão Preto, eles estabeleciam laços com outros imigrantes, compartilhando histórias e informações preciosas sobre o mundo além dos cafezais. Foi através dessas conexões que Rosalia descobriu a oportunidade de adquirir a chácara que se tornaria seu refúgio definitivo.
Com determinação e astúcia, Donato e Giuditta selaram o destino da família, erguendo-se das amarras da fazenda e dando o primeiro passo em direção à independência. Em Ribeirão Preto, cada membro da família encontrou seu lugar: Donato, com sua força e perseverança, ascendendo nas fileiras da ferrovia; Giuditta, com sua habilidade na costura, transformando um simples salão em um império da moda local; e Rosalia, a curandeira sábia e compassiva, que continuou a espalhar sua luz curativa pela comunidade.
Quando Rosalia partiu deste mundo, deixou para trás um legado que ecoaria através das gerações. Sua vida de serviço e dedicação foi imortalizada nas ruas de Ribeirão Preto, onde seu nome é reverenciado até os dias de hoje. Seu túmulo, adornado com flores e memórias, é um testemunho do amor e da gratidão daqueles cujas vidas foram tocadas por sua bondade. Assim, a saga de Rosalia e sua família permanece como um testemunho inspirador da força do espírito humano em face das adversidades.


Dr. Luiz Carlos B. Piazzetta
Erechim RS


sábado, 27 de janeiro de 2024

Destino: Brasil - A Odisseia Inesquecível de uma Família de Imigrantes




No mês de janeiro de 1836, nas acidentadas terras de Cesiomaggiore, cercada por altas montanhas, repletas de neve naquela época do ano, Giacomo veio ao mundo, um homem destinado a traçar uma jornada que moldaria o destino de gerações da sua família. Maddalena, nascida em 1835 em Arsiè, seria sua companheira nessa odisséia, uma mulher alta e forte, com determinação e amor tão profundos quanto as raízes das árvores que testemunhariam sua saga.
O casal de pequenos agricultores trouxe à vida uma família vibrante, começando com Giuseppe, o primogênito, nascido em 1858 em Cesiomaggiore, sendo a escolha do seu nome uma homenagem ao avô paterno, Giuseppe, cujo nome ressoava nas colinas como um tributo à tradição familiar. Logo, Maria Augusta veio ao mundo em 1860, seguida por Beatrice em 1861 e Giovanni Battista em 1863, todos nascidos na mesma cidade de Cesiomaggiore, na província de Belluno. Uma família unida, mas inquieta, cujo destino se entrelaçaria com a imensa vastidão do Brasil.
A história da família ganhou uma nova dimensão em 1875, quando todos, de Giacomo e Maddalena aos filhos e netos, decidiram embarcar em uma jornada épica para terras desconhecidas localizadas do outro lado do grande e temeroso oceano. O irmão mais novo de Giacomo, nascido em 1842, casado com Fiordalise, e seus filhos Angelo e Augusto, completavam a caravana que se aventuraria muito além dos horizontes familiares. O governo imperial brasileiro, necessitando urgentemente de mão de obra estava concedendo a passagem grátis até o novo local de trabalho, para as as famílias que aceitassem o convite para se transferirem para o grande país. Foi a oportunidade que tiveram para abandonar de forma definitiva aquele novo país no qual sempre viveram, mas que agora depois da unificação, não reconheciam mais. Lá, o desemprego grassava em todas as regiões, a má alimentação e a fome assolavam suas vítimas, forçando milhares de pessoas a buscarem um novo lugar para garantir seu sustento diário, bem distante daquelas circunstâncias adversas. 
A viagem, da pacata Belluno até o movimentado porto de Genova, foi uma experiência marcante. O desconhecido trem conduziu-os pela paisagem italiana, antes que embarcassem no navio Adria, enfrentando as intempéries do oceano. Duas tempestades memoráveis desafiaram sua resiliência, mas a determinação de deixar uma Itália desconhecida superou as adversidades. Apesar de tudo estavam felizes porque sabiam que um mundo melhor os aguardava.
O desembarque no porto do Rio de Janeiro, em janeiro de 1869, marcou o início de uma nova fase. Ficaram dois dias hospedados na Hospedaria dos Imigrantes, aguardando ansiosos o navio Rio Negro, que os conduziria à Colônia Dona Isabel no longíquo Rio Grande do Sul.
A bordo do Rio Negro, entre centenas de outros sonhadores, a família enfrentou seis dias de travessia até desembarcarem no porto de Rio Grande. Grandes barracões comunitários de madeira, onde quase não havia privacidade, os abrigaram por quase quinze dias, enquanto esperavam pela chegada dos barcos fluviais que os levariam até a cidade de Montenegro, o local mais próximo à tão aguardada Colônia Dona Isabel.
A travessia pela grande Lagoa dos Patos até Porto Alegre, e a subsequente subida do rio Caí por mais de sete horas, culminaram na chegada ao porto da pequena cidade de Montenegro, o local mais próximo que poderiam chegar de barco ao seu destino final. Um breve descanso de um dia precedeu a preparação para a jornada final até a colônia, que se fazia com carroças e mulas transportando os poucos pertences do grupo. Os homens, as mulheres aptas e as crianças maiores, caminhavam ao lado das carroças, enquanto as pequenas e as mulheres grávidas seguiam nas grandes carroças. O trecho era pedregoso e difícil, a maior parte dele percorrido em subida. Ao chegarem na colônia sempre acompanhados por funcionários do governo brasileiro, que serviam de guias, foram acomodados em outros barracões de madeira esperando a liberação dos seus lotes de terra.
No dia seguinte, os homens, determinados, partiram para conhecer e ajudar demarcar as terras adquiridas do governo. As mulheres e as crianças permaneceram nos barracões enquanto os alicerces do sonho eram estabelecidos. Como eram três famílias, cada uma adquiriu um grande lote 500.000 metros quadrados cada, uma área de terra vasta, coberta por uma vegetação exuberante e rios que seriam testemunhas da prosperidade por vir. Haviam realizado o sonho da propriedade acalentado por todos. Agora deixariam de calar sempre e dividir a safra com o patrão dono da terra. Eles agora eram os patrões. Com orgulho diziam "Desso, qua, in coesto paradiso, naltri ghe semo i paroni"!
Os primeiros anos foram bastante árduos, com derrubada de florestas, construção de casas precárias e o desbravamento do solo para plantio de milho e trigo. A colheita da primeira safra inaugurou uma era de melhoria nas condições de vida, e a família floresceu. Ao longo dos anos, cresceram não apenas em número, mas em riqueza e sucesso, tornando-se um exemplo do espírito pioneiro que impulsionou tantos imigrantes italianos na construção do Rio Grande do Sul.
Assim, a história dessa família italiana se entrelaçou com as paisagens verdejantes do Brasil, uma narrativa de coragem, determinação e sucesso que ecoa através das gerações.


Texto 
Dr. Luiz Carlos B. Piazzetta
Erechim RS