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sábado, 18 de novembro de 2023

Italianos Emigrados no Brasil: Uma Epopeia de Desafios e Resiliência dos Pioneiros


 


Antes de embarcar, a maioria dos imigrantes italianos enfrentava extensos dias que duravam muitas horas, cruzando as terras do país até alcançar os portos de Gênova ou Nápoles, principais pontos de partida para o Brasil. Deixavam suas aldeias e cidades natais para embarcar em trens, um meio de transporte ainda pouco utilizado pela maioria. Aqueles que se aventuravam nessa jornada partiam sem garantias, impulsionados apenas pela necessidade de buscar uma nova existência. Ao deixarem a Itália, a maioria desses emigrantes estava totalmente alheia ao destino que os aguardava no Brasil, descobrindo o caminho apenas ao chegar aos portos de Santos ou Rio de Janeiro.
Nos primeiros anos da emigração, durante o período de recrutamento agressivo de mão de obra, os bilhetes fornecidos pelo governo brasileiro às famílias dos imigrantes italianos eram limitados à terceira classe e, geralmente, destinados aos porões dos navios. Esses espaços, caracterizados por pouca ventilação, iluminação precária e umidade, frequentemente estavam superlotados, pois as companhias de navegação, ávidas por obter maiores lucros, burlavam as leis transportando um número de passageiros além do permitido. Após alguns dias de viagem, o odor proveniente dos porões tornava-se insuportável; uma mistura de odores de corpos pouco lavados e excrementos humanos tornava o ar irrespirável.
Nas primeiras décadas da emigração, antes da imensa onda de deslocamentos em massa, a travessia ocorria em velhos veleiros, levando cerca de 60 dias para chegar ao Brasil. Com a introdução posterior dos navios a vapor, mais rápidos e independentes dos ventos, o percurso foi reduzido para um intervalo de 20 a 30 dias.
Devido ao grande número de passageiros confinados, as condições higiênicas nesses navios eram deprimentes, favorecendo o surgimento de epidemias de doenças infecciosas como piolhos, tracoma, cólera, tuberculose e sarampo. A falta de meios para tratar os doentes resultava na perda de muitas vidas antes de chegarem ao destino final.
Dadas as condições lotadas nos porões, que se tornavam verdadeiros microcosmos de sobrevivência, e na persistente tentativa de conter a propagação de doenças, a prática de reter os corpos dos falecidos até a chegada ao Brasil para um funeral adequado era impraticável. Além disso, naquela época, ainda não havia câmaras frigoríficas a bordo. Em substituição a esse ritual póstumo, uma breve, mas comovente, cerimônia religiosa precedia a delicada procedimento de envolver os corpos em sacos de pano habilmente confeccionados com lençóis, amarrados com cordas e uma grande pedra atada aos pés do falecido. Esse gesto, por sua vez, representava não apenas uma despedida apressada, mas também uma dura realidade imposta pelas adversas condições da viagem, culminando no solene lançamento ao mar, assistido por familiares e amigos. Essa prática, mais do que um ato fúnebre, tornava-se uma dolorosa metáfora das dificuldades e dos sacrifícios enfrentados pelos imigrantes italianos durante sua travessia para o desconhecido.
Os imigrantes italianos enfrentavam dias de sofrimento devido a doenças, à perda de entes queridos e à saudade de tudo e todos deixados para trás. Para amenizar a dor e passar o tempo, era comum entoar canções tradicionais italianas. A chegada ao Brasil, para aqueles que conseguiram superar tantas adversidades e condições precárias, representava um alívio. A beleza da exuberante natureza tropical ainda preservada naquele período encantava os imigrantes, mesmo que intrigados pela presença de homens e mulheres de pele escura, geralmente empregados no porto, uma raridade na Europa daquela época. Após a extenuante viagem marítima entre a Itália e o Brasil, ao desembarcarem em Santos ou no Rio, os imigrantes italianos eram encaminhados para uma Casa do Imigrante para aguardar o prosseguimento de suas viagens para os locais de trabalho. Após alguns dias, eram designados para as fazendas que os haviam contratado, mas muitas vezes embarcavam em outros navios costeiros para trajetos ainda mais longos em direção ao destino. Alguns imigrantes seguiam para os portos de Paranaguá, no Paraná, enquanto outros se dirigiam a Desterro, em Santa Catarina. Aqueles com destino às plantações de café do Espírito Santo ou de Minas Gerais viajavam até o porto de Vitória e depois de trem para os destinos. No entanto, em determinados períodos, a maioria dos imigrantes optava por se dirigir ao movimentado porto de Rio Grande, localizado no estado do Rio Grande do Sul. Ao chegarem a esse destino, eram acomodados em modestos barracões coletivos, às vezes por períodos superiores a um mês, aguardando ansiosamente a chegada das lanchas fluviais que os levariam pelos intrincados cursos dos rios Caí e Jacuí. O destino final estava próximo das prósperas colônias Caxias, Dona Isabel e Conde D’Eu, através do primeiro rio, e da remota colônia Silveira Martins, situada no coração do estado, através do segundo. Dos portos fluviais onde desembarcavam, a jornada ainda não havia alcançado sua conclusão.
Deixando esses pontos de chegada, os imigrantes enfrentavam a necessidade de percorrer longas distâncias a pé ou em carroças, abrindo caminho através da densa floresta, ainda intocada. Nesse ambiente, a sinfonia dos cantos de milhares de pássaros se misturava aos sons imponentes e por vezes assustadores das tropas de bugios, cujo alvoroço era desencadeado pelo constante movimento da caravana.
Após horas, e às vezes dias, de trilhas sinuosas, os viajantes finalmente superavam as longas elevações, alcançando a sede das colônias. Lá, esperavam em barracões temporários, ansiosos pela atribuição de suas respectivas parcelas de terra, encerrando assim mais uma fase dessa árdua jornada rumo à construção de uma nova vida.
Essa fase adicional da viagem não apenas testava, mas aprofundava ainda mais a resiliência desses corajosos imigrantes, desafiando-os tanto na perigosa travessia fluvial quanto na difícil adaptação a uma vida completamente nova em um território estrangeiro.


Texto: Dr. Luiz Carlos Piazzetta 
Erechim RS