Com base nas estatísticas sanitárias do Comissariado Geral da Emigração e nos relatórios anuais dos oficiais de marinha encarregados do serviço de emigração, relativos à morbidade e mortalidade dos emigrantes nas viagens de ida e volta para as Américas, é possível delinear um quadro da situação sanitária da emigração transoceânica italiana entre 1903 e 1925.
No início da grande emigração italiana, a partir de 1875, atingindo seu ápice entre o final do século XIX e o início do século XX, as condições oferecidas aos passageiros e a saúde a bordo dos vapores eram muito piores do que no período estudado. Os primeiros navios a vapor que transportavam emigrantes italianos eram antigos cargueiros, utilizados até então apenas para o transporte de mercadorias. Rapidamente, esses navios foram readaptados para o transporte de passageiros a fim de aproveitar o boom da emigração.
Nos grandes porões desses navios, foram apressadamente instaladas camas distribuídas em diversos salões, onde se acomodavam os passageiros, separados os homens e meninos maiores de 8 anos das mulheres e meninas. Esses vapores eram quase sempre muito lentos, alguns deles verdadeiras sucatas que já estavam prestes a serem aposentadas. No entanto, os armadores não queriam perder a oportunidade de lucrar com o grande fluxo de emigrantes.
As condições de higiene e saúde eram precárias. Em um ambiente fechado e com ventilação inadequada, a propagação de doenças era facilitada. Porões abaixo da linha da água, de pouca altura, mal ventilados e úmidos, que exalavam uma mistura de cheiros do mar, da fumaça do navio, dos animais a bordo com fortes odores corporais de centenas e centenas de passageiros sem banho adequado, confinados naqueles espaços por até mais que um mês. Epidemias de cólera, diarréia, pneumonias, sarampo e até varíola eram comuns e frequentemente resultavam em mortes de passageiros a bordo. A alimentação era escassa e de baixa qualidade, consistindo principalmente de biscoitos duros, carne salgada e água muitas vezes imprópria para o consumo. A maioria dos passageiros sofria com o contínuo balanço do navio que provocava tonturas, enjoos, vômitos e falta de apetite. As mães que estavam amamentando perdiam o leite. Além disso, o saneamento era praticamente inexistente, com instalações sanitárias rudimentares e insuficientes para o grande número de passageiros.
Como ainda não existia a possibilidade de conservação adequada dos alimentos a bordo durante os longos períodos de viagem, animais de corte eram levados vivos nos navios, mantidos em recintos específicos. Conforme a necessidade, durante a viagem esses animais iam sendo sacrificados para fornecer carne fresca aos passageiros. A promiscuidade e a falta de higiene eram comuns para a época, criando um ambiente propício para a eclosão de doenças durante o trajeto.
Os animais, mantidos em condições precárias e muitas vezes próximos aos alojamentos dos passageiros, contribuíam para a deterioração das condições sanitárias a bordo. A presença de fezes, urina e restos de alimentos nos compartimentos dos animais aumentava o risco de contaminação e propagação de patógenos. Além disso, a ausência de métodos adequados de descarte de resíduos e de limpeza frequente exacerbava os problemas de saúde.
A alimentação dos passageiros também era um desafio. A carne fresca obtida dos animais sacrificados era muitas vezes cozida em condições insalubres, com utensílios e água de qualidade duvidosa, o que contribuía para a ocorrência de intoxicações alimentares. Outros alimentos básicos, como pão, legumes e grãos, muitas vezes se deterioravam rapidamente devido ao armazenamento inadequado e à falta de ventilação nos porões.
Além das doenças decorrentes da alimentação e das condições de higiene, os passageiros enfrentavam o risco de doenças transmitidas por insetos e roedores que infestavam os navios. A falta de cuidados médicos a bordo e a superlotação dos alojamentos dificultavam a contenção de surtos, resultando em uma alta incidência de enfermidades como cólera, disenteria, febre tifoide e escorbuto.
A conjunção desses fatores fazia das viagens transoceânicas uma experiência extremamente penosa e arriscada para os emigrantes, que muitas vezes desembarcavam debilitados e em condições de saúde precárias. A necessidade de melhorar as condições sanitárias a bordo levou, ao longo dos anos, a uma série de reformas e regulamentações, buscando minimizar os riscos e proteger a saúde dos viajantes.
O sofrimento dos emigrantes não se limitava à viagem em si. Ao chegarem aos portos de destino, especialmente nos Estados Unidos, muitos enfrentavam longos períodos de quarentena em condições igualmente adversas, antes de serem liberados para seguir viagem. A desconfiança e o medo de serem rejeitados por doenças tornavam a situação ainda mais angustiante.
A precariedade das condições de viagem e a falta de assistência médica adequada durante as travessias contribuíram para um alto índice de mortalidade entre os emigrantes. Muitos que sobreviviam às duras jornadas chegavam debilitados e doentes, necessitando de cuidados imediatos para se recuperarem das adversidades enfrentadas no mar.
A desorganização dos serviços de saúde para a emigração, tanto em terra quanto no mar, conferia às tabelas estatísticas um caráter indicativo das dimensões do problema sanitário na experiência migratória em massa, mas dificultava o estudo de patologias específicas. Os dados estatísticos referem-se às doenças detectadas durante a viagem pelo médico de bordo ou pelo comissário viajante, excluindo um certo número de emigrantes que, por diversas razões, como desconfiança generalizada em relação ao poder médico ou medo de serem rejeitados por doença no país de destino ou internados em hospital ao regressar, não solicitavam assistência médica. Uma parte significativa do fluxo migratório escapava completamente de qualquer forma de controle sanitário, seja porque embarcavam e desembarcavam em portos estrangeiros, seja porque viajavam em navios sem serviço de saúde, ou porque se embarcavam de forma semiclandestina tolerada por muitas companhias de navegação.
Qualquer tentativa de estimar sistematicamente a "questão sanitária" da emigração transoceânica com base nas fontes oficiais do serviço de saúde para a emigração apresenta dados amplamente subestimados em relação às reais dimensões do problema de saúde e doença na viagem transoceânica. Apesar dos limites e da parcialidade da amostragem, as estatísticas sanitárias das viagens transoceânicas permanecem uma das poucas ferramentas disponíveis para iniciar uma série de reflexões que liguem o fenômeno da emigração transoceânica às condições socio sanitárias das classes subalternas entre os séculos XIX e XX.
A análise dos números fornecidos pelas estatísticas para o período de 1903 a 1925 revela a persistência de certas doenças ao longo do tempo, tanto nas viagens de ida quanto nas de volta das Américas. Embora não seja o objetivo desta pesquisa avaliar a relação entre o fluxo transoceânico e a disseminação de patologias de massa na Itália (pelagra, malária, tuberculose), devido à complexidade dos fatores que influenciam a escolha migratória em áreas do país com estruturas econômicas e sociais profundamente diversificadas, não se pode deixar de notar que, nas estatísticas de morbidade nas viagens transoceânicas, algumas dessas patologias estão significativamente presentes. É o caso da malária, que apresenta os índices mais altos nas viagens de ida para a América do Norte e do Sul, superada apenas pelo sarampo. Nas viagens para os países do hemisfério sul, também é relevante o número de casos de tracoma e sarna, enquanto no retorno a Itália predominam claramente o tracoma e a tuberculose, e, embora com índices mais baixos, a ancilostomíase, totalmente ausente nas estatísticas de ida. Nos retornos da América do norte, os números mais altos são de tuberculose pulmonar, alienações mentais e tracoma. Esta última patologia, embora não apresente números particularmente altos, é mais difundida do que nas viagens de ida.
As taxas de mortalidade e morbidade nas viagens transoceânicas, embora não alcancem níveis altíssimos, são, contudo, superiores nas viagens de ida e volta para a América do Sul, onde se dirigiam correntes migratórias com forte predominância de grupos familiares. O dado constante e elevado da morbidade nas viagens de retorno é particularmente significativo para os repatriados da América do Norte. O fluxo migratório para os Estados Unidos era composto predominantemente por pessoas em boas condições físicas e na faixa etária de maior eficiência física, seja por um processo de auto seleção da força de trabalho que escolhia emigrar, seja pelos rígidos controles sanitários impostos pelos Estados Unidos sobre a emigração europeia.