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sexta-feira, 31 de outubro de 2025

Anna: Um Coração Entre Duas Terras



Anna: Um Coração Entre Duas Terras

Anna já tinha 19 anos quando embarcou com seus pais, Giuseppe e Maria, e seus dois irmãos mais novos, Carlo e Lucia, rumo ao desconhecido Brasil. A decisão de deixar Grignano Polesine, um pequeno e quase esquecido vilarejo na província de Rovigo, não foi fácil, mas tornou-se inevitável. O Vêneto, assolado por uma sequência de colheitas ruins e crises econômicas, já não oferecia sustento. A terra, dividida em pequenos lotes que mal rendiam o suficiente para alimentar uma família, não era capaz de acompanhar o crescimento populacional. 

Na casa modesta em que viviam, o frio do inverno entrava pelas frestas, e o calor do verão trazia consigo o cheiro agridoce do esforço agrícola que raramente era recompensado. Giuseppe, um homem de mãos calejadas e olhar esperançoso, passava as noites conversando com Maria sobre as cada vez mais frequentes histórias que corriam pelo vilarejo: terras vastas e férteis no Brasil, onde as famílias poderiam começar uma nova vida.

"Uma chance para os nossos filhos", ele dizia, olhando para Anna, Carlo e Lucia, enquanto Maria costurava, tentando esconder as lágrimas que escorriam silenciosamente. Apesar de suas reservas, ela sabia que permanecer significava assistir a família definhar lentamente. 

A viagem foi planejada às pressas, com os poucos recursos que tinham. Venderam os parcos pertences, guardaram as economias em um pequeno baú de madeira, e seguiram de trem até o porto de Gênova. Cada despedida no vilarejo era marcada por um misto de dor e esperança. Anna, embora jovem, já compreendia o peso daquela jornada. O olhar dela, fixo no horizonte, refletia uma mistura de ansiedade e determinação.

A bordo do navio, a realidade da decisão começou a se revelar. As condições eram precárias, com espaço limitado, alimentos racionados e o mar, imenso e intimidador, estendendo-se até onde os olhos podiam alcançar. Ainda assim, havia algo no brilho dos olhos de Giuseppe e na coragem silenciosa de Maria que mantinha a esperança viva. 

Anna sabia que aquela travessia era mais do que uma viagem física: era uma passagem para o desconhecido, uma ruptura com o passado e uma promessa de futuro. Enquanto o navio balançava ao ritmo das ondas, ela segurava firme a mão de Lucia, sussurrando histórias para distrair a irmã mais nova dos temores que também habitavam seu coração.

No silêncio da noite, deitada em um canto do convés, Anna olhava as estrelas e imaginava como seria a nova terra, com suas promessas de campos verdes, novos desafios e talvez... novas alegrias. Era uma partida dolorosa, mas também o primeiro passo em direção a um sonho que, mesmo distante, começava a tomar forma.

A travessia foi dura. Durante semanas confinados no porão do navio, enfrentaram o frio, a fome e as doenças. Anna ajudava a cuidar dos irmãos e dos outros pequenos que adoeciam durante a jornada. Finalmente, chegaram ao Brasil, onde foram levados para uma colônia agrícola em uma região isolada do interior do Paraná.

Os primeiros dias na colônia foram marcados pelo trabalho incessante. A terra, coberta por mata densa, precisava ser desbravada. Anna, ao lado de seus pais, trabalhava sem descanso, mas ainda encontrava tempo para organizar momentos de convivência com as outras famílias. Sabia que, em meio à dureza do novo lar, era importante cultivar a esperança.

Certo dia, durante uma celebração comunitária na pequena capela improvisada da colônia, Anna conheceu Pietro, um jovem com cerca de 25 anos, que havia chegado alguns meses antes com a mãe e três irmãos. Pietro era marceneiro, uma habilidade que aprendera com o pai, falecido a pouco tempo, e sua presença era valiosa na colônia, pois sabia construir móveis e ajudar a erguer as casas de madeira.

Anna e Pietro se aproximaram durante os encontros na capela e nas festas organizadas pela comunidade. Pietro era um jovem gentil e trabalhador, e seu jeito calmo conquistou Anna. Nas poucas horas de descanso, ele ensinava Anna e outras pessoas a usar ferramentas simples, o que ajudava na construção das casas. Pietro também era conhecido por sua habilidade em esculpir imagens religiosas, algo que o tornava querido pelo padre e pelas famílias da colônia.

Com o tempo, Pietro começou a ajudar a família de Anna na construção da sua casa. Durante esses dias, os dois trocavam confidências e risos. Ele contava histórias sobre sua terra natal, um pequeno comune próximo de Padova, enquanto Anna falava com saudade das noites tranquilas em Grignano Polesine.

A amizade logo se transformou em algo mais. Pietro, em suas visitas à casa da família de Anna, mostrava-se cada vez mais interessado na jovem. Giuseppe, o pai de Anna, aprovava o rapaz, vendo nele um homem digno e trabalhador, capaz de construir um futuro ao lado de sua filha.

O namoro entre Anna e Pietro trouxe alegria à vida dura da colônia. Eles sonhavam com um futuro juntos, mas sabiam que o caminho seria cheio de desafios. Anna, sempre determinada, encontrou na companhia de Pietro uma força renovada. Juntos, ajudaram a organizar a colônia, promoveram eventos comunitários e incentivaram a alfabetização entre os mais jovens.

Aos poucos, Anna e Pietro começaram a construir sua própria casa, um pequeno lar rodeado pelas plantações de milho e feijão que cultivavam com as próprias mãos. A casa, com móveis simples feitos por Pietro, tornou-se um símbolo de sua união e do sonho compartilhado de prosperidade em uma terra tão distante de suas origens.

A vida na colônia permanecia repleta de desafios. As saudades da terra natal se manifestavam como um vazio constante, ecoando nos silêncios das noites e nos suspiros que escapavam durante os dias de trabalho árduo. As doenças, implacáveis, ceifavam vidas e testavam os limites da resistência de cada colono. O isolamento, por sua vez, ampliava as dificuldades, tornando cada jornada até os vizinhos um esforço monumental e cada carta recebida da Itália uma preciosidade capaz de reacender tanto a alegria quanto a saudade.

Mas, em meio a esse cenário de provações, Anna e Pietro encontraram força no amor que os unia. Não eram apenas os campos que cultivavam; era também a esperança que se renovava a cada amanhecer, o sentimento de pertença que crescia ao redor de uma mesa compartilhada, e a solidariedade que florescia entre aqueles que enfrentavam as mesmas batalhas. Com cada colheita, por mais modesta que fosse, erguiam não apenas sustento para suas famílias, mas também a certeza de que suas raízes começavam a se fixar em terras antes desconhecidas. Com suas mãos calejadas e corações determinados, ajudaram a moldar uma comunidade onde antes havia apenas mata e incerteza. E assim, juntos, Anna e Pietro provaram que a força do espírito humano não apenas sobrevive às adversidades, mas as transcende, permitindo que a vida floresça mesmo onde parecia impossível. A colônia, com suas dificuldades e conquistas, tornou-se um testemunho vivo do poder da união, do trabalho e da fé em um futuro melhor.


Nota do Autor


O trecho apresentado aqui é um resumo do romance "Anna: Um Coração Entre Duas Terras", uma obra que mergulha nas complexas emoções e escolhas de uma jovem italiana, Anna, que enfrenta os desafios de deixar sua terra natal em busca de um novo começo no Brasil. Entrelaçando os laços da cultura, das tradições e das memórias, a narrativa reflete a luta interna de Anna, dividida entre o amor pela Itália que deixou para trás e a esperança em construir uma nova vida em terras desconhecidas. Este romance é um tributo aos imigrantes, às suas jornadas cheias de sonhos, sacrifícios e saudades, e uma celebração da força de um coração que aprende a pulsar entre duas terras, duas culturas e dois amores. Que cada leitor encontre, em Anna, um reflexo da coragem humana frente ao desconhecido e a beleza das raízes que nos conectam ao que somos.

Com carinho,

Piazzetta